Vai um copo de vinho?

O vinho está a tornar-se uma forma de estar na vida entre jovens locais e turistas que vêm à procura de marcas célebres. É também opção para uma carreira de prestígio na indústria do turismo

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Texto Cláudia Aranda | Fotos Gonçalo Lobo Pinheiro

 

Entre um vinho francês de Bordeaux, origem do prestigiado Château Lafite Rothschild, ou um tinto português proveniente da mais antiga região demarcada do mundo – o Douro, berço do Vinho do Porto, da Barca Velha e de alguns dos melhores vinhos de 2014, segundo a revista Wine Spectator – a escolha é imensa e está disponível em Macau.

Com o aumento de turistas em Macau – em 2014 foram mais de 30 milhões – cresce também o mercado consumidor de vinhos de qualidade em Macau e aumentam as necessidades da hotelaria e da restauração. Há uma grande procura de escanções e de gente que saiba combinar um vinho e comida com assinatura.

Para dar resposta às exigências da indústria do turismo, há também mais instituições de ensino a oferecerem formação na área dos vinhos. Há mais sessões de provas destinadas ao público e mais jovens de Macau a procurarem formação na área e a serem requisitados pela indústria hoteleira local.

Para Maggie Mak, 26 anos, nascida em Macau, vencedora em 2013 do concurso promovido pela Associação de Escanções de Macau, foi o gosto pela gastronomia que a levou a escolher a profissão. “Adoro comida e vinho, qual é o trabalho que permite estar perto de uma cozinha e de bons vinhos? É o de escanção”. Maggie Mak, que exerceu a profissão em um dos grandes hotéis da cidade, acredita que, para o seu ofício “Macau é uma cidade muito interessante”, porque há poder de compra e “muita riqueza”.

 

Maggie Mak

 

Prestígio numa taça

Na opinião da escanção, o consumo está a crescer, não só entre os turistas do Interior da China, mas também entre a população de Macau de diversas faixas etárias. Para os locais que têm mais conhecimento, a preferência vai para os vinhos portugueses, que são os que oferecem um “bom rácio custo e qualidade”, diz.

Oscar Cheong e Victoria Man, ambos de 28 anos e naturais de Macau, representam um pouco essa nova geração de jovens com profissões liberais e curiosa por conhecer coisas novas. Oscar Cheong trabalha numa galeria de arte e diz que bebe vinho, sobretudo em bares, quando sai com os amigos. Compra ocasionalmente no supermercado mas, como não tem muita ideia sobre vinhos, acaba por fazer as escolhas em função do preço.

Victoria Man, tradutora e directora comercial, nota que em Macau beber vinho “está na moda e é elegante”, mas sobretudo entre “os meninos ricos e da classe média alta”. Victoria aprendeu a gostar de vinho português em Lisboa, onde fez um mestrado em Direito. “Geralmente só bebo vinho português, são bons e mais baratos, acho os vinhos franceses muito caros.”

A tendência é para o consumo aumentar, tanto na China como em Macau, dizem os especialistas. O Grão-Mestre da Confraria dos Enófilos de Macau, Filipe Cunha Santos, acredita que há vários factores que levam a que a China seja um mercado consumidor de vinhos em grande crescimento. O aumento de poder de compra e o prestígio associado ao consumo de produtos de reputação internacional são aspectos a ter conta. “O vinho tem sido uma moda que se tem desenvolvido nas classes média e alta, e julgo que há uma tendência para que esse consumo venha a aumentar.”

 

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Educar o gosto

Consumo e educação estão intimamente ligados, diz Maggie Mak. “Quanto mais você sabe sobre vinho, maior é o seu consumo e mais disponível está para pagar por um vinho de melhor qualidade ou com uma melhor relação qualidade e preço.” Maggie acredita que “há uma grande procura de formação em vinho, o que mostra que as pessoas estão muito interessadas neste tipo de hobbies”.

A par com o aumento da clientela da China, Hong Kong, Coreia, Japão e Taiwan, têm surgido novos restaurantes, há cozinheiros reconhecidos internacionalmente a trabalhar em Macau e mais estabelecimentos galardoados com estrelas Michelin. “A vinda destes chefs está a desempenhar um papel importante neste crescimento no consumo de vinhos, porque um prato gourmet exige um vinho de grande qualidade”, explica a escanção.

A Confraria dos Enófilos de Macau é uma das organizações que tem contribuído para a divulgação do vinho no território. A organização junta cerca de 200 membros e for criada para “educar e ajudar os importadores e distribuidores através de provas de vinhos e eventos no território”, indica Filipe Cunha Santos. “Quando começámos as provas em 1988 havia muito pouca educação sobre o vinho.”

Na altura, os vinhos portugueses prevaleciam no mercado local. “Com a liberalização do jogo em 2002, entraram no território empresas especializadas a concorrer com as empresas locais e a promover mais agressivamente os seus vinhos. Estas empresas têm vindo a ganhar mercado e estão a dominar o mercado na China, Hong Kong, Macau e Taiwan”, explica Filipe Cunha Santos. “São empresas com um portefólio de vinhos portugueses muito pequeno e isso levou ao consumo de vinhos de outras origens em restaurantes e casinos.”

Apesar da entrada de novos produtos, França seguida por Portugal continuam a ser os principais países de origem do vinho importado para Macau. O vinho tinto representa cerca de 90 por cento das importações; o branco, champanhe, espumantes e outros equivalem ao restante valor das importações.

 

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Indústria carente de talentos

Para alimentar a indústria do turismo, consumidora de vinho e carente de talentos, as instituições de ensino de Macau têm vindo a expandir a oferta disponível em termos de formação. O Instituto de Formação Turística (IFT) tem tido um papel relevante na formação, diz Filipe Cunha Santos. “Porque forma grande parte dos bartenders [empregado de bar] e sommeliers [escanções] de Macau”. Por outro lado, diz o enófilo, tem contribuído para a manutenção “do bom nome dos vinhos portugueses”, na medida em que inclui esta vertente nos seus cursos. “Os bartenders quando vão exercer a sua profissão conhecem e podem recomendar os vinhos portugueses.”

Maggie Mak confirma que o seu interesse pelos vinhos em geral nasceu e cresceu no IFT onde se formou, uma vez que em casa a família não tinha o costume de beber vinho e não encarava a ideia com bons olhos. “Em Macau há uma cultura rica relacionada com Portugal, tive muitas oportunidades de aprender sobre viticultura portuguesa.”

Hugo Bandeira, professor e gestor da área de alimentação do IFT, acredita que apesar dos esforços da parte de quem dá formação, “ainda há pouco conhecimento sobre vinhos na sociedade”. “O tipo de clientela que vai aos restaurantes não é aquela que consume muito vinho ou que esteja educada ao nível do consumo. Há restaurantes de topo com boas cartas de vinho, mas a maior parte dos estabelecimentos têm cartas poucos cuidadas. Nos restaurantes chineses, a carta de vinhos normalmente é limitada, porque o grosso da clientela não consome vinhos.”

O professor adianta que o número de alunos interessados em formar-se em vinhos ainda é reduzido, mas que está a crescer. Os jovens começam a perceber que é uma opção de carreira onde há pouca concorrência. “Um aluno com vocação que é formado em vinhos tem pouca concorrência. Quando os hotéis percebem que o aluno tem esse talento requisitam-no logo”, acrescenta.

A Faculdade de Turismo e Gestão Hoteleira da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau (MUST, na sigla inglesa), também oferece cursos na área do turismo e da gestão hoteleira.

 

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Um estilo de vida

“O vinho francês é a escolha número um dos consumidores, seguido do português. O público mais conhecedor vem a Macau e quer experimentar vinho português.” Esta é a experiência de Adolphus Foo, presidente da Associação de Escanções de Macau. Originalmente da Malásia, mas a trabalhar há sete anos num dos grandes casinos de Macau, Adolphus Foo explica que, onde trabalha, tem muitos clientes da China. “Normalmente, eles preferem vinhos franceses, em geral estão disponíveis a gastar muito dinheiro numa garrafa de vinho caro”, diz.

Mas, também, há os clientes que estão dispostos a conhecer produtos diferentes. “Podem vir de Singapura, Malásia, Filipinas, ou mesmo da China, onde há muito pouca escolha de vinhos portugueses ou de outros lugares. É uma experiência para eles encontrarem um vinho como o Barca Velha que não têm nos seus países.”

Adolphus Foo observa que há uma geração jovem em Macau que começa a mostrar interesse e a querer experimentar. O consumo local está a desenvolver-se, “os jovens começam por beber por curiosidade, depois começam a comprar e a aprender a combinar com a comida”. Entre os consumidores mais jovens, há estudantes universitários, funcionários de escritórios, executivos de casino. “Beber vinho tornou-se um estilo de vida”, explica Adolphus Foo.

Apesar do consumo estar longe do de Hong Kong, o escanção acredita que a tendência será para que as pessoas comecem a beber vinhos de maior qualidade e mais caros à medida que vão adquirindo conhecimento. “No início as pessoas pediam apenas vinho ao copo, agora são mais aventureiras e pedem a garrafa.”

 

 

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Onde aprender sobre vinhos

O Instituto de Formação Turística (IFT) oferece cursos profissionais de curta duração que permitem obter certificados internacionais e cursos pós-laborais de introdução ao vinho. Um almoço ou jantar no restaurante-escola do IFT, que recebeu uma recomendação no Guia Michelin de 2014 e de 2015, pode também ser um bom ponto de partida para uma experiência no mundo dos vinhos.

 

 

Provas de vinho

Hotel Four Seasons

Bar Azul, Cotai

Todas as sextas-feiras

18h00 às 20h00

MOP 150

Te. (+853) 2881 8881

 

Museu do Vinho

O Museu do Vinho dispõe de uma selecção de vinhos para prova. Os visitantes mediante pagamento de um bilhete poderão fazer uma degustação de vinhos.

MOP 15 (três copos) e MOP 10 (um copo).

Todos os dias, excepto terças-feiras.

10h00 – 20h00

Tel. (+853) 8798 4108

 

Confraria dos Enófilos de Macau

A Confraria dos Enófilos de Macau organiza provas e cursos em cooperação com o IFT. Promove também um jantar anual da confraria com a Hong Kong Wine Society e organiza o festival anual Wine&Dine, no resort Venetian.

Informações: http://winesociety.org.mo/