A utilização de drones como tecnologia aplicável nas mais variadas áreas continua em expansão e o mercado de Macau não é excepção. A start-up Logic Lift faz uso de drones e da inteligência artificial para inspeccionar edifícios, uma solução que, segundo o empreendedor Hugo Tou, aumenta a eficiência e garante a segurança das edificações
Texto Tony Lai
Os veículos aéreos não tripulados – denominados, geralmente, como drones – já há vários anos que deixaram de ter uma utilização exclusivamente militar, para serem actualmente usados nas mais diversas indústrias, tendo-se até tornado, rapidamente, num produto para o consumidor.
Em Macau, é comum ver o uso destas aeronaves para fins recreativos e de entretenimento, desde espectáculos de drones a fotografia e filmagem, bem como para usos industriais. É neste contexto que a start-up Logic Lift, empresa sediada em Xangai e Macau, encontrou um nicho para a sua aplicação para drones: a inspecção em altura de edifícios. Esta utilização inovadora não se limita apenas aos grandes complexos turísticos no Cotai, mas abrange também as infra-estruturas costeiras e os edifícios localizados nos bairros antigos de Macau.
A empresa, fundada em 2021, aplicou recentemente a sua tecnologia “INSKY Aerial Inspection System” – que incorpora drones e inteligência artificial para análise de dados e imagens – para realizar inspecções externas a dois empreendimentos turísticos de uma operadora de turismo e lazer integrado na cidade. O uso desta solução, segundo a empresa, permite substituir os métodos tradicionais de inspecção em altura dos edifícios.
O trabalho marcou a entrada da Logic Lift no mercado de Macau, depois de ter aplicado a sua solução tecnológica em vários empreendimentos em Xangai e noutras regiões do Interior da China.
Hugo Tou, director-geral da Logic Lift, não tem dúvidas de que esta solução reduz significativamente o tempo necessário para inspecções a edifícios, enquanto aumenta a eficiência do processo em comparação com as abordagens tradicionais.
“A nossa solução garante que os drones capturam fotos de forma consistente a uma distância precisa do edifício, enquanto seguem uma trajectória de voo predeterminada”, explica em entrevista à Revista Macau. Todas as fotos tiradas pelos drones são transmitidas em tempo real para o servidor do sistema, onde são analisadas por meio de inteligência artificial para identificar possíveis problemas relacionados com a construção.
“Como estas inspecções têm de ser realizadas regularmente, este sistema garante que os drones irão seguir a mesma rota, voando para os mesmos pontos de referência de forma a capturar fotos das mesmas áreas todas as vezes. Este nível de precisão e exactidão de dados não pode ser alcançado com métodos manuais tradicionais”, explica o empreendedor.
Reduzir custos e riscos
Após a implementação do “Regulamento de Navegação Aérea de Macau”, revisto em 2021, quaisquer actividades que recorram ao uso de drones que envolvam aeronaves com peso superior a sete quilos requerem uma autorização da Autoridade de Aviação Civil (AACM). Além disso, os operadores de drones devem obter uma licença e devem possuir um seguro contra terceiros com um montante mínimo de 10 milhões de patacas.
Hugo Tou refere que o processo de obtenção de uma autorização em Macau é simples e eficiente. “Na verdade, é mais fácil do que o esperado. As autoridades de Macau são flexíveis e receptivas a esta nova aplicação para drones”, acrescenta.
No caso dos empreendimentos turísticos, a equipa da Logic Lift concluiu as inspecções a cada edifício em cerca de dois dias. “As inspecções puderam ser concluídas de forma célere, ajudando o cliente a economizar recursos e tempo”, diz o responsável da empresa tecnológica.
“O nosso sistema pode ser aplicado para inspecção em locais de difícil acesso ou onde as inspecções tradicionais levariam bastante tempo”
HUGO TOU
DIRECTOR-GERAL DA LOGIC LIFT
A operadora MGM China Holdings Ltd. elogiou o trabalho da Logic Lift, salientando que “através do recurso à inteligência artificial e aos drones, a empresa pôde realizar inspecções abrangentes no MGM Cotai em apenas um a dois dias, em vez de meses, contribuindo para reduzir o custo para apenas 25 por cento do que seria normal nas inspecções tradicionais”.
“Com uma gestão digitalizada, esta solução gera automaticamente relatórios detalhados e sistemáticos em tempo útil, permitindo identificar qualquer dano ou anormalidade na superfície dos edifícios e reagir imediatamente”, frisou a operadora num comunicado. “Esta solução inovadora não só melhora a eficiência e reduz os custos, mas, essencialmente, reduz os riscos relacionados com segurança ocupacional.”
O modelo utilizado pela Logic Lift é semelhante aos planos de voo utilizados na indústria da aviação, explica Hugo Tou, nos quais as aeronaves seguem pontos de referência designados ao longo de uma trajectória de voo dentro de um período específico. Esta semelhança não é uma coincidência, mas sim o resultado da vasta experiência que o empresário acumulou na área da aviação e no sector aeroespacial da China.
Nascido e criado em Macau, Hugo Tou sempre teve uma paixão pela imensidão do espaço e por temas aeroespaciais. Em 2005, foi admitido na Escola de Astronáutica da Universidade Beihang, em Pequim, instituição conhecida como berço de engenheiros, académicos e profissionais das áreas aeroespacial e de aviação. Depois de concluir o curso, prosseguiu os estudos na Universidade de Pequim.
Após concluir os estudos, Hugo Tou começou a carreira na Honeywell Aerospace Technologies, em Xangai, uma das mais conhecidas fabricantes de motores para aviões e outros produtos e serviços para a indústria aeroespacial. Na altura, a empresa estava envolvida na produção do Comac 919 – uma aeronave de fuselagem estreita desenvolvida pela Commercial Aircraft Corporation of China – e o recém-licenciado trabalhador teve a oportunidade de estar envolvido na integração e no desenvolvimento do sistema de controlo de voo para o novo modelo de aeronave.
De Xangai a Macau
O envolvimento no projecto do Comac 919 espoletou o interesse de Hugo Tou por drones e levou-o a explorar, desde 2015, as potenciais aplicações que a tecnologia podia ter. Após o lançamento do Comac 919, em 2017, Hugo Tou e um grupo de amigos e colegas formaram uma equipa em Xangai para explorar potenciais oportunidades de negócios no crescente sector comercial de drones.
De acordo com a análise de mercado da “Drone Industry Insights e Fortune Business Insights”, o valor do mercado global de drones comerciais deverá, em 2030, ser superior a 50 mil milhões de dólares, comparativamente a 30 mil milhões de dólares em 2022.
O estudo revela também que as empresas estão maioritariamente focadas no uso de drones em áreas como filmagem e fotografia, horticultura e agricultura, inspecção e manutenção, mapeamento topográfico, vigilância, entregas e logística. A China surge como uma força dominante no sector, com empresas como a Shenzhen DJI Sciences and Technologies Ltd. identificadas entre as principais fabricantes de drones civis a nível global.
Descrevendo o mercado do Interior da China como “altamente competitivo”, o jovem empresário diz que a sua equipa se destaca “no segmento de inspecção de edifícios”, pelas vantagens que os seus sistemas e tecnologias oferecem relativamente a outras soluções existentes no mercado.
Desde o início de 2019, a equipa providenciou serviços a vários clientes em Xangai e noutras províncias no Interior da China, incluindo empresas estatais como a Shanghai Zhenhua Heavy Industries Co. Ltd. e a China State Construction Engineering Corp. Os projectos variaram entre a inspecção de sistemas de iluminação e de gruas para contentores até ao mapeamento aéreo para inventários florestais.
“Resumindo, o nosso sistema pode ser aplicado para inspecção em locais de difícil acesso ou onde as inspecções tradicionais levariam bastante tempo”, refere Hugo Tou.
Após os resultados alcançados em Xangai, o empreendedor contemplou a possibilidade de introduzir a tecnologia em Macau. “Existem semelhanças entre Xangai e Macau. Ambas as cidades são centros empresariais internacionais e também são susceptíveis aos riscos associados aos tufões e ao clima. Portanto, inspecções a edifícios em tempo oportuno e de forma eficiente são de extrema importância nestas cidades”, realça o empresário. “Como residente de Macau, também senti a responsabilidade de trazer esta tecnologia para o território.”
Segundo Hugo Tou, fez sentido em termos operacionais lançar os serviços em Macau, após alguns anos de experiência prática além-fronteiras. “O mercado do Interior da China apresenta, em geral, maior tolerância a imperfeições no que toca a soluções inovadoras e tecnológicas, enquanto o mercado de Macau dá maior ênfase ao bom funcionamento e execução impecável destas soluções”, explica. “Por exemplo, no mercado de Macau, precisamos de garantir maior precisão na qualidade dos dados e nos relatórios.”
Virada para a região
Tirando partido das oportunidades no mercado de Macau, a equipa participou, em 2021, na edição inaugural do Concurso de Inovação e Empreendedorismo de Macau, onde garantiu o segundo lugar. A participação no concurso proporcionou várias vantagens, incluindo a adesão ao Centro de Incubação de Negócios para os Jovens de Macau, financiado pelo Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM).
“O Centro de Incubação proporcionou-nos inúmeras oportunidades e maior exposição no mercado, apoiando o nosso crescimento”, afirmou Hugo Tou. “Tivemos a oportunidade de participar em diversas feiras e roadshows para promover os nossos produtos e tecnologia em Macau e na Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau. Estes eventos permitiram-nos estabelecer ligações com empresas estatais chinesas e empresas na lista Fortune Global 500.”
Para fomentar o crescimento de start-ups como a Logic Lift, Hugo Tou enfatiza a importância de um espaço adequado para que as empresas possam explorar e desenvolver as suas ideias. Nesse âmbito, salienta, o ambiente para o empreendedorismo e start-ups em Macau tem vindo a melhorar, muito graças ao desenvolvimento da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin. “Embora os recursos em termos de terrenos em Macau sejam limitados, a localização de Hengqin ajuda a aliviar este desafio, proporcionando espaço para fomentar o crescimento das start-ups.”
No final de 2023, a Zona de Cooperação Aprofundada, administrada conjuntamente pelas autoridades da RAEM e da província de Guangdong, anunciou medidas para incentivar a inovação e o empreendedorismo entre os residentes de Macau com idades entre os 18 e os 45 anos.
As medidas, que entraram em vigor em Fevereiro deste ano, incluem a disponibilização de espaços comerciais. Estes escritórios devem reservar cerca de 30 por cento do seu espaço para start-ups de Macau, podendo registar-se como incubadoras para jovens empreendedores e empresas da RAEM, tornando-se elegíveis a candidatarem-se a um subsídio de um milhão de renminbis. Os jovens ou start-ups de Macau que estejam sediados nestes centros em Hengqin por um período de pelo menos seis meses podem candidatar-se a um apoio financeiro no valor de 30 mil renminbis, além de subsídios ao arrendamento.
Segundo Hugo Tou, as empresas de Macau podem também tirar partido do vigor da indústria transformadora na província de Guangdong, que providencia condições mais favoráveis aos empreendedores da RAEM. “Ao integrar recursos disponíveis no Interior da China, como a dimensão dos espaços e a capacidade produtiva, Macau pode tornar-se num local ideal para o desenvolvimento de start-ups tecnológicas.”
Investigação e inovação
Com operações baseadas principalmente em Xangai e em Macau, a Logic Lift conta com cerca de 20 colaboradores, com 70 por cento da equipa dedicada à investigação e desenvolvimento tecnológico, enquanto os restantes membros desempenham funções em várias áreas, como marketing ou relações comerciais.
A pequena dimensão da empresa, garante Hugo Tou, não é impeditivo para a concretização dos objectivos. “Um dos meus colegas de universidade também lidera uma empresa agora com apenas alguns funcionários e sem qualquer financiamento externo. Mas já alcançaram sucesso e estiveram envolvidos em vários projectos relacionados com a indústria aeroespacial no Interior da China”, exemplifica.
A Logic Lift também colabora com instituições de ensino superior no que toca a investigações relacionadas com voos automáticos e inteligência artificial, incluindo com a Universidade de Xangai e a Universidade Jiao Tong de Xangai. “Embora as sugestões destes estudantes universitários nem sempre sejam totalmente amadurecidas e práticas, as suas ideias são por vezes intrigantes e inovadoras”, observa o empresário.
Após começar operações em Macau, a Logic Lift está desejosa de explorar ainda mais o mercado local. Além de hotéis e empreendimentos turísticos, a tecnologia da empresa também pode ser utilizada para inspecção de infra-estruturas costeiras e marítimas. Outra potencial aplicação, segundo Hugo Tou, é a inspecção a edifícios antigos no território. “Existem muitos edifícios antigos em Macau que podem representar riscos à segurança devido à queda de betão e tijolos. Mas não existem métodos eficazes e adequados para inspecionar, em tempo oportuno, estes edifícios e identificar potenciais riscos”, ilustra.
Um relatório de 2022 da empresa Macau Renovação Urbana, S.A. identificou quase 4800 edifícios em Macau com mais de 30 anos, representando cerca de dois terços de todos os edifícios da cidade. De acordo com o relatório, entre estes edifícios antigos, aproximadamente 1700 apresentavam riscos de segurança estrutural, e a falta de manutenção destes edifícios representava um “risco oculto” para a cidade.
Olhando para o futuro, Hugo Tou acredita que o uso de drones para actividades de inspecção está já “bastante maduro” e o próximo passo será uma maior integração de inteligência artificial e o desenvolvimento de modelos de captação de dados em grande escala. “Nos próximos cinco anos, esperamos definitivamente ver o uso desta solução mais difundido em Macau a um custo mais reduzido”, afirma. “Não se trata apenas de ganhar dinheiro… pois o valor desta tecnologia só poderá ser mais bem entendido quando estiver acessível a mais pessoas.”