Depois de muita expectativa em relação às competições regionais, a 19.ª edição dos Jogos Asiáticos arranca este mês, um ano mais tarde do que o originalmente previsto. À conversa com a Revista Macau, dois atletas locais contam que o adiamento não esmoreceu o sonho de conquistar medalhas para o território
Texto Sandra Lobo Pimentel
Chegou finalmente a hora e nem o adiamento dos Jogos Asiáticos abalou as convicções dos atletas de Macau, que olham para o tempo extra como uma oportunidade para aperfeiçoar as suas aptidões.
A 19.ª edição dos Jogos Asiáticos, entre 23 de Setembro e 8 de Outubro, vai decorrer em Hangzhou, capital da província chinesa de Zhejiang. O evento, originalmente agendado para Setembro de 2022, foi adiado devido à pandemia da COVID-19.
A delegação da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) que vai participar na próxima edição dos Jogos Asiáticos integra 180 atletas de 21 modalidades.
Para os atletas de Macau, o trabalho árduo e a esperança são sempre factores importantes para encarar qualquer competição. Embora o adiar de uma prova possa abalar a preparação, especialmente após dois anos sem competições, dois atletas locais falam à Revista Macau sobre a necessidade de ultrapassar as adversidades mesmo antes de a competição ter início.
O karateca Kuok Kin Hang resignou-se com o facto de a competição ter mudado de data, preferindo focar-se na realidade do quotidiano dos atletas. “Em competição, podemos a qualquer momento enfrentar certas situações e problemas; nessas alturas, é preciso ter uma mente forte e preparada para cumprir os objectivos”, refere o atleta.
Em Setembro de 2021, Kuok Kin Hang tornou-se no primeiro atleta local a conquistar uma medalha para a RAEM nos Jogos Nacionais da China, após garantir o terceiro lugar na prova individual masculina de karaté na competição de kata.
O tempo extra, salienta, foi “aproveitado” na preparação. “É ver o lado positivo: temos mais tempo para nos prepararmos para esta edição dos Jogos Asiáticos”, sublinha.
Para Kuok Kin Hang, o momento será de despedida dos tatamis, pelo menos enquanto atleta de alta competição.
“Acredito que alguns atletas que pensavam em retirar-se, como eu, tenham pensado se iriam ou não esperar por esta edição dos jogos, mas no meu caso, já tinha decidido que sim, que ia esperar pelos Jogos Asiáticos para fazer a minha última participação”, conta o karateca. “Estarei mais bem preparado, com mais tempo de treino. O meu objectivo não mudou, continua a ser o de conseguir a primeira medalha nesta competição. Este é o meu sonho. E, por isso, aproveitei este adiamento para treinar mais e melhor, mantendo uma atitude positiva.”
Um ano a mais de preparação acabou por fortalecer as expectativas de Kuok Kin Hang. “Quero mesmo ganhar uma medalha para Macau”, confessa. Com a integração da modalidade de kata pela primeira vez nos Jogos Asiáticos, nasce mais um desafio. “É uma categoria nova na competição de karaté e estarei a competir em equipa, com dois membros júnior da selecção da RAEM. Vamos formar uma equipa e, quem sabe, conseguir não só uma medalha individual, mas também uma medalha colectiva.”
Esperança revigorada
No voleibol de praia, Leong On Ieng tem uma perspectiva parecida. A atleta planeava decidir após os Jogos Asiáticos se continuaria a competir ao mais elevado nível, portanto, a notícia do adiamento foi recebida com algum choque, admite. “Quando soubemos do adiamento foi uma desilusão e isso atrapalhou o nosso plano de treinos e objectivos. Ainda quero perceber, com esta participação, se mantemos a paixão pelo desporto e se vamos continuar a jogar após estes Jogos Asiáticos”, acrescenta Leong On Ieng, que faz dupla com Law Weng Sam.
Um ano passado, o desejo de participar na prova fala mais alto, ainda que “o maior problema do adiamento”, explica, foi não saberem “por quanto tempo seria ou até se, no final das contas, [a competição] seria cancelada”. Ainda assim, a dupla continuou a preparação, treinando, pelo menos, duas vezes por semana e complementando essa rotina com trabalho específico de ginásio.
“Acreditamos que podemos estar a bom nível em termos físicos. Mas mentalmente ainda vamos precisar de tempo para recuperar. Não somos atletas profissionais que têm várias oportunidades para competir” em provas internacionais, lamenta. Mas depois de ter treinado afincadamente com o objectivo de conseguir um bom resultado, a dupla mantém o optimismo. Com o aproximar da competição, os treinos passaram a três vezes por semana, aproveitando as férias do Verão para a preparação. O primeiro objectivo, refere Leong On Ieng, é passar à segunda ronda da competição.
A dupla participou em eventos em Fuzhou, no Interior da China, e Taiwan, no âmbito da Confederação Asiática de Voleibol. As duas competições foram uma oportunidade para “melhorar o ranking e tentar evitar os cabeças de série mais fortes nos Jogos Asiáticos”. “É algo muito importante para nós”, realça Leong On Ieng.
Olhos nas medalhas
Mesmo com o adiamento desta edição dos Jogos Asiáticos – e depois do sucesso alcançado nos Jogos Nacionais de 2021 –, a RAEM pode olhar para os horizontes das medalhas com mais um sério competidor: Kuok Kin Hang, que está empenhado em terminar a carreira com mais uma conquista.
O karateca, que, em 2014, se juntou ao programa de atletas de elite lançado pelo Governo da RAEM, tem ambições elevadas para a sua última prova internacional. “Para mim, os Jogos Asiáticos são o evento mais importante, já que não consegui sair nestes últimos anos devido à pandemia, e o meu grande objectivo é ganhar uma medalha.”
O ouro, admite, será um objectivo difícil, mas um lugar no pódio está no horizonte. “Os favoritos ao ouro são atletas ao nível dos Jogos Olímpicos”, explica.
Com 31 anos celebrados em Junho, Kuok Kin Hang prevê que esta edição dos Jogos Asiáticos seja a sua última competição como atleta profissional, depois de ter alcançado um quinto lugar na edição de 2018, que decorreu na Indonésia. “Há muito talento na nossa selecção, muitos dos juniores já foram promovidos a seniores e têm muita capacidade, são fortes e podem ganhar medalhas. Creio que chegou a hora de me retirar.”
Com 15 anos dedicados à modalidade, o karateca faz parte do programa de atletas de elite da RAEM e treina seis vezes por semana, quatro a cinco horas por dia. Depois da participação na próxima edição dos Jogos Asiáticos, está na hora de se dedicar novamente aos estudos. “Antes de integrar este primeiro grupo de atletas de elite da RAEM tinha-me formado em comunicação e agora quero aproveitar os benefícios desse programa e focar-me na vida académica, talvez em línguas estrangeiras, mas certamente voltarei à universidade.”
Voleibol, mas de praia
Leong On Ieng, de 27 anos, e Law Weng Sam, de 25, são a dupla feminina a representar Macau no voleibol de praia. As atletas fazem parte da selecção feminina da RAEM de voleibol em campo coberto e foi ideia de um treinador tentarem a sua sorte como dupla no voleibol de praia. Nesta modalidade seria mais fácil almejar a uma participação nos Jogos Asiáticos, algo que se torna mais difícil noutras vertentes do voleibol devido à valia das restantes selecções asiáticas, explica Leong On Ieng.
O treino mais regular só começou em 2019, mas a primeira vez que competiram juntas foi em 2014. Sobre os próximos Jogos Asiáticos, a atleta da RAEM sublinha que querem sempre ganhar, mas é preciso ser realista. “Não temos tanta experiência e, nos dias de hoje, nem sabemos bem em que nível estão as outras duplas”, visto que não participam em provas internacionais há alguns anos. “Não posso dizer que não quero um bom resultado, mas eu e a minha parceira vamos fazer o melhor que conseguirmos. Com a pandemia, não conseguimos sair de Macau para participar em outros eventos e competições e não competimos em voleibol de praia durante muito tempo. A experiência nesta vertente é bem menor comparada com a que temos em voleibol em campo coberto”, conta.
“O nosso treinador já nos alertou que há países e regiões que têm duplas com capacidade semelhante à nossa, como Hong Kong ou Singapura, por isso, se tivermos sorte com o sorteio, talvez consigamos ir mais longe na competição”, prevê. Sobre as grandes favoritas, aponta como as duplas mais fortes as equipas do Japão e da Tailândia.
Leong On Ieng está no mundo do voleibol há mais de dez anos, mas a vertente de voleibol de praia chegou mais tarde. “Os Jogos Asiáticos são o meu sonho e talvez a minha única oportunidade de estar nessa competição. Consigo imaginar que depois disso, posso continuar a jogar voleibol, mas de praia ainda não consigo dar resposta”, confessa.
Sobre o futuro do voleibol de praia em Macau, a atleta prevê uma evolução, desde logo pelo nível das competições internas, que têm vindo a subir de qualidade.
“Temos muitas adolescentes a jogar e talvez no espaço de dez anos possamos começar a ver frutos e ter bons resultados a nível regional”, adianta. Sobre a possibilidade de a RAEM poder ser candidata a medalhas no contexto dos Jogos Asiáticos, a atleta crê que, à parte do trabalho técnico, mais apoio terá de ser canalizado ao nível dos subsídios para que os atletas locais tenham as condições necessárias para terem sucesso.