Vinte anos após o arranque da construção da Ponte de Sai Van, estão em curso as obras da quarta travessia rodoviária entre a península de Macau e a Taipa. A nova ponte, que deve estar operacional em 2026, vai permitir um descongestionamento do tráfego e ligações mais rápidas entre a Taipa e o resto da Grande Baía
Texto Marta Melo
A primeira estaca da nova travessia rodoviária entre a península de Macau e a Taipa foi colocada a 26 de Agosto de 2020, cinco anos após o projecto ter sido aprovado pelo Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). A obra deverá estar concluída no “prazo de três a quatro anos”, segundo as previsões mais recentes do director da Direcção dos Serviços para os Assuntos de Tráfego, Lam Hin San, avançadas em Maio.
A quarta travessia ligará a Zona A dos Novos Aterros Urbanos, na península de Macau, assim como a ilha artificial que aloja o posto fronteiriço da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau, à Zona E dos Novos Aterros, perto do terminal marítimo de passageiros do Pac On e do Aeroporto Internacional de Macau, na Taipa. Com 3,6 quilómetros de comprimento, terá uma largura superior à das pontes existentes no território devido ao total de oito vias de trânsito, quatro em cada sentido.
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“A primeira ponte de Macau, a Ponte Governador Nobre de Carvalho, tem apenas duas vias; a Ponte da Amizade tem quatro; enquanto a Ponte de Sai Van tem seis vias”, assinala o engenheiro civil Chan Mun Fong, docente da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Macau. Especializado em engenharia estrutural, Chan Mun Fong acompanhou de perto, enquanto profissional, a construção de duas das três travessias que ligam Macau à Taipa – a Ponte da Amizade e a Ponte de Sai Van.
Das oito vias de trânsito da nova travessia, seis serão destinadas à circulação de veículos automóveis. As duas vias centrais estarão reservadas para ciclomotores e motociclos. “A existência de mais vias permite uma maior fluidez do trânsito e facilita o socorro em caso de acidentes”, argumenta o arquitecto Francisco Vizeu Pinheiro. A velocidade máxima para a ponte e rampas de acesso será de 80 quilómetros por hora (km/h) e 40 km/h, respectivamente.
Mais segurança durante tufões
A quarta travessia rodoviária será mais segura para circulação durante ventos fortes quando comparada com as pontes existentes. Segundo a informação disponibilizada pela Direcção dos Serviços de Obras Públicas (DSOP), serão instaladas barreiras na nova ligação que vão reduzir a velocidade do vento no respectivo tabuleiro, inclusive em caso de tufão, possibilitando uma condução em uniformidade de condições com as verificadas em área terrestre.
Quanto à possibilidade de a travessia se manter aberta ao trânsito em situações de sinal n.º 8 de tempestade tropical, tal será decidido pelo regulamento da ponte, que o Governo da RAEM elaborará antes de a ligação entrar em funcionamento. Actualmente, as três pontes do território são encerradas quando está içado o sinal n.º 8 ou superior, sendo o tabuleiro inferior da Ponte de Sai Van aberto ao trânsito durante esse período.
Tendo em consideração que a quarta ligação está a nascer numa área particularmente exposta aos tufões que regularmente afectam Macau, o Centro de Investigação em Engenharia de Vento da Universidade de Hunan foi incumbido de realizar um ensaio em túnel de vento, utilizando um modelo físico da ponte, a fim de avaliar a resistência e as características de vibração da futura infra-estrutura. O estudo realizou-se em finais de 2020 e, segundo uma nota da DSOP, o ensaio permitiu concluir que a “resistência ao vento da ponte cumpre os requisitos” e que as barreiras de protecção alcançam os “objectivos previstos” ao nível do efeito de redução do vento no tabuleiro.
– Quinta ligação a caminho? –
Chan Mun Fong, também director executivo da Sociedade de Consultadoria em Engenharia Civil, Limitada, grupo envolvido em diversas obras públicas na RAEM, identifica como grandes desafios do design e construção da nova travessia a conjugação com a navegação marítima e o tráfego aéreo. Segundo o especialista, existiu “a necessidade de fornecer aberturas adequadas de navegação sob a ponte de e para o Porto Exterior e o Porto Interior”, bem como houve que responder a requisitos do sector da aviação na “limitação da altura da estrutura da ponte”. A necessidade de assegurar a navegação marítima resulta num vão com uma distância de afastamento de 280 metros, que, segundo Chan Mun Fong, é “100 metros mais largo do que o vão máximo da Ponte de Sai Van”.
Na estrutura da nova travessia, o engenheiro e deputado José Chui Sai Peng destaca “a alta estabilidade geral” e “a curva do contorno da estrutura de treliça da ponte principal, que é de forma ondulada”. Nos detalhes técnicos, o engenheiro sublinha ainda o facto de todos os elementos de aço serem de alta resistência, “o que reduz efectivamente o peso da ponte e alinha o perfil”.
“Durante a construção, é a primeira vez que se usam revestimentos de grande diâmetro em larga escala”, acrescenta.
Mais fluidez, deslocações mais rápidas
A construção da quarta ligação entre a península de Macau e a Taipa é um dos trabalhos prioritários no âmbito do Planeamento Geral do Trânsito e Transportes Terrestres de Macau até 2030. A estratégia, que esteve em consulta pública até ao mês passado, quer dar resposta à integração de Macau no desenvolvimento nacional no âmbito das oportunidades criadas pelos projectos da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau e da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin. Segundo o texto colocado a consulta, para a optimização das ligações rodoviárias, um dos objectivos passa pela “construção da quarta travessia rodoviária marítima Macau-Taipa”.
De acordo com a presidente da Associação dos Arquitectos de Macau, Christine Choi, a quarta ponte “é necessária como infra-estrutura de apoio”, tendo em conta o desenvolvimento futuro da Zona A dos Novos Aterros Urbanos. A arquitecta entende que a construção da nova ligação é uma resposta natural, baseada na realidade local. “Podemos ver que Macau aumentou as pontes de ligação com a Taipa ao longo do tempo, como resultado do crescimento da população e da necessidade de viajar de Macau para a Taipa.”
Vizeu Pinheiro considera que a quarta travessia é um “projecto necessário para o desenvolvimento sustentável de Macau, uma vez que se localiza numa zona de aterros na periferia da península de Macau, a Zona A, possibilitando uma ligação directa com a Taipa, perto do aeroporto e resorts [do Cotai], sem ter que interferir no já congestionado tecido urbano da península ou do centro da Taipa”.
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No entanto, o impacto da nova travessia irá para além da Zona A dos Novos Aterros Urbanos. Christine Choi lembra que o nível de tráfego actual na Ponte da Amizade já é elevado na maior parte do tempo, o que seria agravado pela Zona A, que, “no futuro, estima-se que acomode cerca de 90 mil habitantes”. “A quarta ponte é necessária para fornecer um sistema de transporte eficiente para aquela zona, para não pressionar a área [da freguesia de Nossa Senhora] de Fátima e a Ponte da Amizade, bem como o ponto de ligação na Taipa”, conclui a arquitecta.
Para Vizeu Pinheiro, a conexão da nova ponte ao eixo viário que liga com o Posto Fronteiriço das Portas do Cerco “vai permitir ter uma alternativa para o tráfego proveniente da fronteira” com Zhuhai. A nova ponte, acredita o também docente da Universidade de São José, vai garantir uma “maior fluidez” no trânsito, assim como irá diminuir o tempo na ligação entre aquela que é a fronteira mais utilizada do território e os complexos turísticos do Cotai. O que será conveniente, não apenas para os residentes como também para os visitantes, observa José Chui Sai Peng. “A quarta ponte reduzirá efectivamente o tráfego nas travessias existentes e aliviará o congestionamento”, tornando a utilização de sistemas de tráfego inteligente “mais viável”.
Nas melhorias do tráfego, Vizeu Pinheiro antevê ainda como positivo o túnel que está previsto para a Colina da Taipa Grande, com acesso à quarta travessia, por ser uma forma de permitir “reduzir os engarrafamentos na Taipa”.
José Chui Sai Peng acredita igualmente que a nova ponte deverá ser, “no futuro, uma parte importante da rede de transporte regional”, pelo facto de servir para ligar a ilha artificial da Ponte Hong Kong-Zhuhai-Macau à Taipa. Neste contexto, acrescenta, o sector da logística será um dos que irá beneficiar com a nova ligação rodoviária no território, bem como o dos transportes públicos regionais.