O Vale de Criação de Negócios para os Jovens de Macau em Hengqin – também denominado de Inno Valley HQ – é um dos principais projectos de cooperação na área do empreendedorismo entre Macau e Guangdong. O parque de incubação de negócios pretende contribuir para a diversificação económica de Macau e para a integração do território no desenvolvimento nacional
Texto Viviana Chan
Ao longo dos últimos sete anos, o Vale de Criação de Negócios para os Jovens de Macau em Hengqin – também conhecido como Inno Valley HQ e localizado na vizinha ilha de Hengqin, no município de Zhuhai – já apoiou mais de 300 projectos apresentados por empreendedores de Macau. A iniciativa, ao estilo de um centro de incubação de negócios em larga escala, ganhou peso reforçado a partir de 2019, com a sua inclusão nas “Linhas Gerais do Planeamento para o Desenvolvimento da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau”. O documento, a cargo do Comité Central do Partido Comunista Chinês e do Conselho de Estado, identifica o Inno Valley HQ como um dos projectos “importantes” de cooperação no seio da Grande Baía, cujo desenvolvimento deve ser acelerado.
Estabelecido em Junho de 2015, o Inno Valley HQ apoiou, até final de deste ano, um total de 787 projectos, ligados a empreendedores de Macau, Hong Kong e do Interior da China, de acordo com dados fornecidos pela Zhuhai Da Heng Qin Development Co. Ltd., empresa pública da cidade vizinha responsável pela gestão do parque. A maioria dos projectos apoiados eram referentes a start-ups.
O parque forneceu serviços de suporte a um total de 113 empresas classificadas como de “alta tecnologia”, tendo sido apoiadas 13 empresas “unicórnio” – isto é, start-ups com um valor potencial de mercado estimado em mais de mil milhões de dólares americanos. Ao longo dos últimos sete anos, foi disponibilizado financiamento a 47 empresas, num total de 1,56 mil milhões de renminbis.
Prioridade para Macau
O peso de Macau na actividade do Inno Valley HQ é óbvio. Dos projectos apoiados até Fevereiro, quase metade – um total de 344 – estava ligada ao território. Além disso, o parque, que é composto por diversos edifícios com diferentes valências, acolhe também o Instituto de Investigação em Ciência e Tecnologia da Universidade de Macau em Zhuhai e uma unidade com características similares da Universidade de Ciência e Tecnologia de Macau.
Liang Ying, directora-geral da Zhuhai Da Heng Qin Development, diz que a promulgação do “Projecto Geral de Construção da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin” pelo Governo Central, em Setembro do ano passado, abriu possibilidades adicionais para o parque de incubação de negócios.
“O Inno Valley HQ está a agarrar as grandes oportunidades geradas pelo desenvolvimento da Grande Baía e pela construção da Zona de Cooperação Aprofundada”
LIANG YING
DIRECTORA-GERAL DA ZHUHAI DA HENG QIN DEVELOPMENT, RESPONSÁVEL PELA GESTÃO DO INNO VALLEY HQ
“O Inno Valley HQ está a agarrar as grandes oportunidades geradas pelo desenvolvimento da Grande Baía e pela construção da Zona de Cooperação Aprofundada”, refere a responsável. Segundo acrescenta em entrevista à Revista Macau, o parque de incubação de negócios conseguiu, desde o seu estabelecimento, “obter sucesso em vários aspectos, incluindo na concentração de talentos, promoção de projectos associando tecnologia e finanças, incubação de novas indústrias, inovação tecnológica e contribuição fiscal”. Neste último campo, só em 2021, as empresas com operações no Inno Valley HQ geraram uma receita fiscal avaliada em 1,7 mil milhões de renminbis a favor das autoridades de Hengqin.
Existem actualmente 316 empresas com operações no Inno Valley HQ. No portefólio do parque de incubação empresarial, incluem-se nove projectos de Macau ligados à medicina tradicional chinesa.
Liang Ying diz que o Inno Valley HQ conta já com várias “estrelas” entre as empresas apoiadas. Tal inclui o grupo de tecnologias da informação e inteligência artificial Pachira Information Technology, com sede em Pequim e fundado por empresários de Macau. O grupo abriu uma subsidiária em Hengqin e tem em curso vários projectos em parceria com entidades de Macau, incluindo com a Universidade de Macau.
Entre outros casos de sucesso empresarial a partir do Inno Valley HQ, destacam-se o grupo Bringbuys, também a operar no campo das tecnologias da informação, bem como uma subsidiária da norte-americana ImStem Biotechnology, ligada ao desenvolvimento de terapias com células estaminais. A empresa de biotecnologia Digifluidic Biotech, start-up fundada por um aluno de doutoramento da Universidade de Macau, também se inclui no lote de experiências bem-sucedidas.
O Inno Valley HQ foi igualmente a base escolhida para a sociedade de advogados ZLF Law Office, estabelecida em 2016. A iniciativa foi apresentada na altura como a primeira “joint venture” ao nível dos serviços de apoio legal no seio da região da Grande Baía, fruto de uma união de esforços entre escritórios de advogados do Interior da China, Hong Kong e Macau.
Vários benefícios disponíveis
“O Inno Valley HQ é uma das plataformas industriais mais importantes em Hengqin, tendo conquistado várias distinções a nível nacional, o que torna o parque na primeira escolha no campo do empreendedorismo para jovens de Macau”, diz Liang Ying, notando que tal contribui para a estratégia nacional de crescente integração entre Macau e o Interior da China.
O parque de incubação de negócios disponibiliza “vários benefícios” aos empresários que escolhem o Inno Valley HQ para desenvolver os seus projectos, refere a responsável. Entre esses apoios, estão subsídios para fazer face aos custos de arrendamento de um espaço de escritório. As empresas start-up podem, de um modo geral, gozar de um subsídio equivalente a 80 por cento do valor total da renda no primeiro ano em que estão sediadas no parque. O valor do subsídio é reduzido para 60 por cento e 40 por cento nos segundo e terceiro anos de operações, respectivamente.
Estão também disponíveis apoios para custos com habitação, de forma a facilitar a atracção de talentos. De acordo com Liang Ying, o valor máximo para apoiar despesas de alojamento pode chegar a 500 mil renminbis no caso de quadros altamente qualificados.
A responsável acrescenta, porém, que alguns dos principais benefícios disponibilizados pelo Inno Valley HQ não são financeiros. O parque de incubação de negócios funciona como uma plataforma de promoção do empreendedorismo, oferecendo às empresas aí instaladas acesso a vários tipos de informação, bem como a serviços de apoio nas áreas legal, comercial, de recursos humanos e fiscalidade.
“A maioria dos empreendedores de Macau tem dificuldade em interpretar as políticas das autoridades do Interior da China”, explica Liang Ying. “As pessoas de Macau não estão habituadas a ter que compreender documentos oficiais do Interior da China”, acrescenta. “Em segundo lugar, os empreendedores podem considerar que o mercado do Interior da China é demasiado grande e não saberem por onde começar o lançamento dos seus negócios.”
Liang Ying recorda que a criação do Inno Valley HQ foi impulsionada por um discurso do Presidente Xi Jinping durante os festejos do 15.º aniversário da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). Na altura, o Presidente referiu que “os jovens de Macau são a esperança de Macau, mas também são a esperança do país, estando ligados ao futuro de Macau e do país”. Segundo acrescentou então Xi Jinping, “é necessário reforçar a educação dos jovens, dar muita importância, atenção e carinho à nova geração, e devem ser criadas condições para ajudar os jovens a atingir o seu desenvolvimento e sucesso plenos”.
Assim nasceu a ideia do Inno Valley HQ, para dar corpo a essa ambição de apoiar os jovens de Macau. Embora as novas políticas ligadas ao desenvolvimento da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin signifiquem algumas mudanças face ao projecto inicial, “o objectivo de ajudar empreendedores de Macau mantém-se o mesmo”, diz Liang Ying. “Vamos trabalhar mais para apoiar os jovens de Macau e do Interior da China”, garante a responsável.
Bom ponto de partida
Vários empreendedores de Macau com projectos empresariais em desenvolvimento a partir do Inno Valley HQ sublinham a importância do apoio disponibilizado pelo parque de incubação de negócios. É o caso de Gloria Chang, que explica que uma das dificuldades dos empresários de Macau no Interior da China é interpretar as políticas das autoridades locais. “Como empreendedores, precisamos de estar conscientes, de perceber as circunstâncias em termos gerais, conhecer o Interior da China”, afirma.
A empresária considera que Hengqin é um bom ponto de partida para jovens de Macau interessados em lançar um projecto no mercado do Interior da China. “Uma vez que estamos a começar do zero, ir para muito longe pode ter custos elevados. Nesse aspecto, Hengqin oferece condições para lançar experiências empresariais em formato ‘low-cost’”, diz.
Natural de Macau, Gloria Chang concluiu os seus estudos universitários na Austrália, onde foi dentista durante alguns anos. Em paralelo, lançou-se no mundo do empreendedorismo, através do Nidus Enterprise Group, com projectos ligados à venda de equipamentos clínicos, restauração e turismo cultural.
No início de 2019, a empresária criou uma subsidiária do grupo Nidus ligada ao sector da logística, tendo escolhido o Inno Valley HQ como sede da nova empresa. Antes, Gloria Chang lançou empresas nas áreas do investimento e equipamentos clínicos, respectivamente na Província de Guangxi e na Área de Nansha da Zona Piloto de Comércio Livre de Guangdong. Além disso, o grupo Nidus está também presente em Macau.
“Hengqin oferece condições para lançar experiências empresariais em formato ‘low-cost’”
GLORIA CHANG
EMPRESÁRIA DE MACAU CUJO GRUPO NIDUS TEM UMA SUBSIDIÁRIA NO INNO VALLEY HQ
Na sua opinião, o Inno Valley HQ pode facilitar de diversas formas as operações de uma start-up, sobretudo através do acesso a uma ampla rede de contactos. Ademais, a plataforma junta empreendedores de diferentes locais, o que beneficia a partilha de informação, diz.
A Nanometals Technology é outro projecto com raízes em Macau instalado no Inno Valley HQ. A empresa possui diversas patentes registadas no Interior da China na área da electrónica.
O director-executivo, Lei Zhen, explica que a empresa foi criada em 2015 na Zona de Desenvolvimento Industrial de Alta Tecnologia de Zhuhai, tendo-se mudado para Hengqin em meados de 2021. A Nanometals Technology possui cerca de uma centena de funcionários – desses, mais de 80 trabalham no Inno Valley HQ.
As instalações no parque de incubação de negócios incluem a parte administrativa da empresa, um laboratório de investigação e um centro de exposição. Há também um escritório em Macau, sobretudo dedicado à promoção comercial.
Actualmente, a Nanometals Technology arrenda um edifício de três andares no Inno Valley HQ, com uma área de 2000 metros quadrados. Ao mesmo tempo, mantém uma unidade industrial de 7000 metros quadrados na Zona de Desenvolvimento Industrial de Alta Tecnologia de Zhuhai.
A Nanometals Technology tem também apostado na diversificação. A empresa desenvolveu vários produtos desinfectantes e materiais anti-bacterianos em resposta à COVID-19. Estes foram criados no contexto de um programa de apoio financeiro do Fundo para o Desenvolvimento das Ciências e da Tecnologia da RAEM.
O director-executivo da empresa diz que, no passado, havia escassez de condições para o desenvolvimento de projectos tecnológicos em Macau. “Agora, podemos ver melhorias”, diz. “Antigamente, era raro encontrar empreendedores de Macau. Hoje em dia, é mais comum falar-se de empreendedorismo.”
“É muito importante incubar empresas ligadas à sociedade de Macau”
LEI ZHEN
DIRECTOR-EXECUTIVO DA NANOMETALS TECHNOLOGY, INSTALADA NO INNO VALLEY HQ
O empresário enfatiza que o plano da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin “é uma grande oportunidade”. E acrescenta: “Creio que essa estratégia vai atrair os melhores recursos de Macau e do Interior da China. Vai permitir uma concentração de vantagens, boas experiências e boas políticas”.
Sobre o Inno Valley HQ, Lei Zhen elogia a existência de um parque de incubação de negócios em Hengqin que dá prioridade a projectos da RAEM. Segundo diz, “é muito importante incubar empresas ligadas à sociedade de Macau”. E explica porquê: a captação de empresas de outros locais, atraídas por eventuais subsídios, poderia beneficiar os resultados económicos do parque a curto prazo, mas haveria o risco de essas empresas abandonarem Hengqin quando se esgotassem os apoios financeiros. “Isso não é positivo nem para a diversificação económica de Macau, nem para Hengqin”, sublinha.