A Associação dos Guineenses, Naturais e Amigos da Guiné-Bissau quer tornar-se a primeira associação lusófona de Macau a contar com uma representação permanente nas novas instalações do Fórum de Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa. O objectivo, explica a presidente do organismo, Graziela Lopes, passa por abrir novas vias de cooperação entre Pequim e Bissau
Texto Marco Carvalho
UM INFORTÚNIO que o tempo transformou numa bênção. É assim que Graziela Lopes, advogada de profissão e presidente da Associação dos Guineenses, Naturais e Amigos da Guiné-Bissau, encara a prolongada crise de saúde pública decorrente da pandemia da COVID-19. A doença colocou um travão ao intercâmbio crescente entre o seu país e Macau e obrigou à suspensão dos acordos que todos os anos traziam novos estudantes ao território, mas forçou, em contrapartida, a pequena comunidade guineense radicada na Região Administrativa Especial de Macau a puxar dos galões e a mostrar serviço.
“A pandemia obrigou-nos a aproximarmo-nos mais e isso deu outra força à comunidade. A comunidade apercebeu-se de que juntos podíamos fazer mais, até porque as solicitações por parte do Governo, ou mesmo do Fórum de Macau, aumentaram. Como a mão-de-obra de fora está impossibilitada de vir, vimo-nos obrigados a intervir um bocadinho mais”, reconhece Graziela Lopes.
“Organizámos um workshop em que não ficámos só por mostrar o que é a nossa música, o que é a dança e o que é a parte cultural. Procurámos fazer com que os nossos estudantes mostrassem também aquilo de que são capazes em termos do fabrico de objectos e de partilha, da sua essência”, conta à Revista Macau.
“Acho que isso também é importante. Cada um de nós tem a obrigação de mostrar, em termos culturais e em termos educacionais, aquilo de que somos feitos”, remata.
Alargar horizontes
Numa comunidade que excede por uma magra margem a meia centena, os estudantes sempre se afirmaram como uma lufada de ar fresco, o fermento essencial para o rejuvenescimento do círculo guineense que tem Macau como casa. São também, no entender de Graziela Lopes, o produto mais valioso dos mecanismos de cooperação desenvolvidos sob a égide do Fórum de Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Fórum de Macau).
“Os estudantes que beneficiam dessa cooperação são uma mais-valia e esta é, do meu ponto de vista, a melhor forma de se fazer a cooperação. Dar a oportunidade a um jovem que termina o liceu na Guiné de poder estudar no Interior da China ou em Macau ou em qualquer outro país dá-lhe perspectivas completamente diferentes daquela que iria existir se ele tivesse estudado no próprio país”, ilustra.
E acrescenta: “O problema é como o país absorve todos esses estudantes, se lhes dá ou não oportunidade para mostrarem o que aprenderam”, sustenta a dirigente, ela própria formada na Universidade de Macau.
“A pandemia obrigou-nos a aproximarmo-nos mais e isso deu outra força à comunidade”
GRAZIELA LOPES
PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS GUINEENSES, NATURAIS E AMIGOS DA GUINÉ-BISSAU
Mas a pandemia da COVID-19 também deixou bem patente a fragilidade dos vínculos que unem a Guiné-Bissau a Macau e ao Interior da China. A instabilidade política que afecta o país africano e os custos elevados associados à organização de visitas empresariais levaram a Associação dos Guineenses, Naturais e Amigos da Guiné-Bissau a abordar as autoridades de Macau com uma proposta com tanto de inédito, como de inovador.
“A Associação tem como objectivo principal a divulgação da cultura e também, de certa forma, o apoio aos estudantes que estão em Macau”, sublinha Graziela Lopes. “Para além das questões culturais, estamos a preparar uma colaboração com o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM), no sentido de ter um stand permanente no novo edifício [do Fórum de Macau], com o objectivo de servir de ligação com os empresários na Guiné e também abrir novas vias de cooperação”, refere a responsável.
“Estamos ansiosos para saber os termos dessa cooperação entre a Associação e o IPIM. Eu acho que dali vão surgir coisas boas para os empresários que estão na Guiné e não têm forma de cá chegar”, assume a dirigente.
Educação: alicerce essencial
A Associação dos Guineenses, Naturais e Amigos da Guiné-Bissau estendeu, num passado não muito longínquo, a mão a empresários do país que mostraram interesse em fazer chegar a Macau, para fins promocionais, produtos perecíveis, como a castanha de caju e a moringa. Mas a Guiné-Bissau tem muito mais para oferecer: “Em termos turísticos, a Guiné-Bissau é mesmo um diamante em bruto. É um sector que não tem expressão no Produto Interno Bruto, o que é um erro”, diz Graziela Lopes.
“Em relação a produtos, a castanha de caju é um produto já muito divulgado, mas é um tanto ou quanto redutor julgar a Guiné pela castanha. A Guiné não tem só isto. A Guiné tem petróleo, mas esta é uma questão que ainda não está muito bem definida. É uma das áreas em que acho que o Governo se devia concentrar e pedir a ajuda de outros países, mais concretamente da China”, defende a dirigente.
A China tem sido, de resto, ao longo dos últimos anos um dos principais parceiros de desenvolvimento das autoridades de Bissau. Pequim ajudou a construir bairros residenciais, hospitais ou estabelecimentos de ensino superior. A cooperação chinesa, salienta a presidente da Associação dos Guineenses, Naturais e Amigos da Guiné-Bissau, será sempre bem-vinda, sobretudo em áreas como a formação de recursos humanos e de quadros técnicos qualificados.
“A China tem-se mostrado disponível para ajudar em vários projectos, e tem ajudado, de facto, no desenvolvimento de alguns projectos. Há bairros que surgiram de raiz por causa dessa ajuda da China”, afirma Graziela Lopes. “O principal meio de ajuda deve ser a educação, o investimento na educação: construir escolas, construir mais universidades e dar a possibilidade de os estudantes poderem vir à China beber um bocadinho do que a China está a fazer em termos tecnológicos, em termos de medicina, em termos de desenvolvimento”, conclui a dirigente associativa.