Texto Sandra Lobo Pimentel
Tal como muitas outras instituições e associações, também o Instituto Internacional de Macau (IIM) foi criado nas vésperas da transferência de administração, que deu origem ao estabelecimento da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). Jorge Rangel, que na altura exercia funções no Governo liderado pelo General Vasco Rocha Vieira, assumiria mais tarde, e até à data, a presidência do Instituto, mas esteve ligado à sua génese. “Aparecemos em 1999, precisamente com essa preocupação: queríamos manter essa continuidade, no sentido da valorização da identidade de Macau”, revelou em entrevista à MACAU.
A fundação da RAEM foi assim a fundação de outras entidades com origem na sociedade civil, que ainda hoje permanecem. “Ao chegarmos ao fim da presença formal portuguesa, em termos administrativos e políticos, achámos que uma entidade como o Instituto Internacional podia ser útil. Felizmente, Macau tem uma sociedade civil forte e interventora.”
A defesa e a valorização da identidade da região assumiram grande relevância na missão a que se propunham, explica Jorge Rangel. “Macau sendo um território tão pequeno, se não houvesse um sentimento de pertença enraizado, e se não houvesse um sentimento de Macau enquanto região especial, pela sua diferença, achámos que essa diferença devia continuar a ser afirmada.”
Para tal, foram definidas uma série de vertentes que consideraram importantes. “Queríamos privilegiar a ligação académica e cultural ao mundo lusófono, mas não só. Também na Europa e outras partes do mundo. Mas o mundo lusófono era a prioridade e tivemos uma grande implantação no Brasil, onde fazemos, ainda hoje, muitas actividades todos os anos.”
O país sul-americano surgiu também pelo interesse mútuo com a República Popular da China, nomeadamente, em termos comerciais. “Firmámos inúmeros protocolos com universidades, centros culturais e outras entidades de natureza associativa”, o que leva a que o IIM possa dispor dessa cooperação para as suas actividades, inclusivamente, em termos de utilização de espaços.
Se a actividade editorial tem sido bastante visível no percurso do Instituto nestes 20 anos de existência, Jorge Rangel sublinha outro tipo de actividade que também tem visibilidade: as exposições. “Temos sempre várias a correr mundo. Uma delas, sobre o património de Macau, chegou a estar em 50 cidades brasileiras.”
Essa exposição está ligada a outra vertente, o concurso anual de fotografia de património de Macau, que tem possibilitado ao Instituto aumentar a sua colecção significativamente. “Há pouco tempo abrimos uma exposição no pavilhão do Jardim Lou Lim Ioc, e todos os anos o nosso espólio cresce de uma maneira impressionante. Temos hoje uma colecção notável, talvez a melhor que Macau tem, e todos os anos acrescentamos centenas de fotografias dos concorrentes.”
Jorge Rangel lembrou que na celebração dos dez anos da RAEM, o IIM foi responsável por uma exposição fotográfica, à semelhança do que sucedeu cinco anos depois, a convite do Executivo da RAEM. Agora, no aniversário de 20 anos, o presidente do Instituto revelou à MACAU que o material já está a ser reunido e que será exposto já em 2020, “uma vez que queríamos já ter imagens da tomada de posse do novo Executivo”.
Se as exposições e seminários são outras vertentes da actividade do Instituto nestas duas décadas de existência, as publicações com a sua chancela ocupam lugar de destaque. “Lembro que quando se começou a discutir sobre os grandes temas, como a iniciativa ‘Uma Faixa, Uma Rota’, os primeiros livros que saem são os nossos”, sublinhou.
Já são cinco os livros do IIM sobre o tema, ou seis, como ressalva Jorge Rangel, se for tida em conta a obra do académico Francisco Leandro, editada pela Universidade de Macau em cooperação com o IIM.
O último livro sobre a temática foi lançado em Lisboa no final deste ano, também pela mão da Associação dos Amigos da Nova Rota da Seda, iniciativa de Fernanda Ilhéu, académica e presidente daquela entidade.
Jorge Rangel não tem ideia de quantos livros foram editados pelo Instituto, mas afirma que, “desde opúsculos, até livros feitos, são com certeza muitas centenas”.
O IIM também entrou no domínio das novas tecnologias e tem, desde há cerca de um ano, uma livraria online. “Neste mundo dos livros, nunca se recupera o investimento feito. Há uma percentagem muito elevada que vai para a livraria, depois há os intermediários, as distribuidoras, portanto, a editora acaba por não recuperar o dinheiro. E precisamos para podermos fazer outras actividades. Em regra, temos o apoio da Fundação Macau, mas alguns projectos ficam de fora. Esse resto, ou não fazemos, ou temos de procurar outros financiamentos.”
Nesse aspecto, em termos de funcionamento, o IIM mantém muitos dos quadros desde a sua fundação, mas quase todos em regime de voluntariado. “Um dos pilares desta casa é o voluntariado. Temos um pequeno núcleo de pessoal na secretaria, mas o resto é tudo voluntário.” São seis os funcionários remunerados, e Jorge Rangel não esquece os colaboradores espalhados pelo mundo. “É uma rede de cerca de 400 colaboradores. Se fossem pagos, não tínhamos capacidade para mais de cinco ou seis. A história de sucesso do Instituto está também aí, nesse espírito de voluntariado, incluindo imensas personalidades que têm colaborado connosco”.
Futuro de continuidade
Mais do que tudo, para o futuro, Jorge Rangel deseja que o Instituto possa continuar a sua missão. “Duas décadas permitem e exigem um balanço, que acreditamos ser imensamente positivo, pelo muito que se fez neste período. O que mais desejo para o IIM nos próximos 20 anos, é a sua continuidade.”
O actual presidente fala ainda de uma renovação que pode acontecer num futuro próximo. “Espero que os actuais responsáveis possam realizar uma passagem do testemunho a novos protagonistas nos próximos anos, cabendo-nos apoiá-los na liderança e no desenvolvimento de uma instituição em que acreditámos muito no momento do seu estabelecimento.”
Sobre a missão do Instituto, Jorge Rangel crê que essa não deve mudar, continuando a assentar na preservação da memória de Macau, sendo tal desígnio “da maior utilidade para a RAEM”, através de “acções eficazes de cooperação com instituições académicas, culturais e outras de natureza associativa no exterior”, algo pelo qual o IIM se tem pautado nestas últimas duas décadas.
Para a próxima geração, o presidente do IIM entende que é preciso entender o legado da administração portuguesa, “que conferiu a Macau uma identidade e singularidade que importa estender no tempo”, reforçando que “é importante continuar a acreditar no futuro de Macau”.