Texto Sin Iok I (冼玉誼)
É na zona do NAPE, junto ao rio, que está agora a funcionar o Centro de Incubação de Negócios para Jovens de Macau, com enfoque nas startups. As novas instalações foram inauguradas em Outubro e há cada vez mais empresas locais a candidataram-se para ter um espaço físico e contar com o apoio estratégico do centro de incubadoras da RAEM.
Apesar de ter sido inaugurado em 2015, o Centro de Incubação passou a ter, apenas em Outubro, um espaço próprio depois de ter passado cerca de dois anos na sede do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM). Continua a estar sob a alçada dos Serviços de Economia, mas a gestão do espaço e do projecto foi entregue à empresa pública Parafuturo de Macau Investimento e Desenvolvimento, com a qual o Executivo assinou um acordo a 18 de Outubro para dirigir o centro, e que tem como presidente Francis Tam, antigo secretário para a Economia e Finanças.
“Queremos criar mais oportunidades de negócio para empresários locais e empresários que, não sendo de Macau, querem investir e começar um negócio em Macau”, explica Wilson Lam, director-geral da Parafuturo. Já os Serviços de Economia enfatizam a localização do novo centro, que consideram ser “muito vantajosa” para um centro de startup de empresas, “com boas redes de transporte e comunicação, facilitando o intercâmbio entre tecnologia, indústria e indústrias criativas”.
Para fazerem parte do Centro de Incubação, as empresas têm de apresentar uma proposta, com um plano de negócios detalhado. Lam diz que, por enquanto, não há qualquer limitação desde que o negócio tenha sentido, segundo os critérios da Parafuturo. “O que privilegiamos é o potencial de sucesso, independentemente de ser um produto ou um serviço.”
Caso a ideia seja aprovada, os empresários passam a poder usar de forma gratuita as instalações durante seis meses, 24 horas por dia e sete dias por semana. O período é prorrogável por mais seis meses até um máximo de dois anos, desde que o negócio esteja a crescer e a Parafuturo entenda que continua a haver motivos para apoiar os empresários. Além do espaço, o centro oferece serviços de aconselhamento e promoção para ajudar a montar, consolidar e promover o negócio. “Vai haver pessoas como eu, que sou designer de marca e que comecei a vida empresarial há muitos anos, com diferentes experiências a quem podem pedir conselhos e que os vão acompanhar”, acrescenta Wilson Lam, também proprietário da loja de indústrias criativas Macau Creations.
É aqui também que está a funcionar, desde Outubro, o Centro de Intercâmbio e Inovação e do Empreendedorismo para Jovens da China e dos Países de Língua Portuguesa, que pretende fortalecer o papel de plataforma de Macau na área das startups.
Incentivo ao intercâmbio
O espaço conta com um auditório, salas de reuniões, um terraço com jardim e uma sala comum. É um open space sem escritórios privados para cada empresa. O design não foi ao acaso. “É uma forma de incentivar os empresários a sentarem-se em sítios diferentes e de encorajar que falem e troquem impressões uns com os outros”, explica o director-executivo, Carlos Lam.
Já Wilson Lam acredita que, tendo em conta o espaço e o perfil dos empresários ligados a startups, o contacto surgirá naturalmente. Ainda assim, ressalva, o centro vai fomentar a aproximação. “Vou conhecer bem todos os negócios, saberei as vantagens e necessidades de cada empresário, e posso pô-los em contacto em função do que uns precisam e do que outros podem oferecer”, exemplifica.
Na incubadora, também serão organizadas actividades como workshops, apresentações de negócios consolidados e encontros com potenciais investidores de Macau, do Interior do País e de outros territórios.
Uma porta para a China
Ajudar os empresários que querem entrar noutros mercados, como o do Interior do País, é mais um dos objectivos do centro, segundo Carlos Lam. A ideia é explorar a relação que a Parafuturo já tem com as incubadoras da China – a Oficina de Inovação para os Jovens de Guangdong, Hong Kong e Macau, em Nansha; o Parque de Criatividade, Inovação e Empreendedorismo, também em Nansha; o Vale de Criação de Negócios para os Jovens de Macau, na Ilha da Montanha, e o Centro de Jovens Empresários e Inovação de Qianhai Shenzhen-Hong Kong, em Shenzhen. “Queremos investir mais na comunicação com as incubadoras. Dar-lhes a conhecer os projectos das nossas empresas e vice-versa”, refere o director-executivo.
A colaboração com incubadoras estende-se a outros países, como Portugal. Em Fevereiro passado, Macau estabeleceu novas cooperações com centros de startups portuguesas, depois da visita ao país de uma comitiva de jovens empresários locais, que integrava também o director dos Serviços de Economia, Tai Kin Ip, e Chui Sai Peng, vice-presidente da Parafuturo. “Queremos enviar empresários daqui para Portugal para que tenham contacto com o que se está a fazer lá e como se estrutura um negócio no país”, antecipa Carlos Lam.
Wilson Lam não tem dúvidas de que a incubadora é um trampolim para quem está a começar. “Na fase das entrevistas, tentamos logo ajudá-los a perceber se o negócio faz sentido e isso é muito importante. Se acharmos que não tem futuro, vamos explicar-lhes porque não funciona. Quando aceitamos, vamos apresentar o negócio a outras pessoas. Comecei a vida empresarial muito novo e na altura não tínhamos apoio. É fantástico que agora haja estas ajudas do Governo, que se tenha um negócio e haja alguém que ajude a divulgá-lo e a encontrar pessoas que podem investir”, realça.
Carlos Lam acrescenta aos benefícios o que os empresários poupam em rendas por estarem num espaço gratuito e o apoio na solução de obstáculos quando querem exportar o negócio. “As incubadoras do Interior do País com as quais trabalhamos não são privadas, pertencem a uma província e algumas são nacionais. Podemos ajudá-los em questões como legislação e taxas que são aplicadas aos produtos”, afirma.
Aspectos importantes para os empresários que, segundo o responsável, estão sobretudo preocupados com as oportunidades de negócio e em angariar investimento. “É nisso que estamos a trabalhar nesta fase. Vamos convidar para apresentações dos negócios que temos aqui fundos e investidores, tanto de Macau como do Interior do País, que têm interesse em investir em startups”, revela.
Expectativas elevadas
Duzh, à frente das produtoras de audiovisual Bigui e Macau Metropolis Picture, é um dos empresários que está na incubadora. Deixou Pequim há 10 anos para apostar em Macau e não está arrependido. “Pequim é uma cidade enorme, e a China um país gigante. É difícil ter todos os apoios necessários”, aponta.
Depois de ter recebido subsídios do Governo destinados a pequenas e médias empresas, acabou por montar o primeiro escritório na incubadora por sugestão dos Serviços de Economia. “Venho de Pequim e sinto que a empresa e eu precisamos de conhecer mais gente. Esta é uma das formas de o fazer. A incubadora funciona como uma espécie de intermediário. Podemos falar uns com os outros, conhecer outros negócios, e quem sabe ter colaborações. Posso conseguir mais recursos, porque organizam eventos e aparecem pessoas novas. E claro, a questão mais importante é a possibilidade de conseguir mais investimento a partir da incubadora”, sublinha o jovem empresário.
Foram os apoios que o Governo dá às pequenas e médias empresas e a “maior aposta” no sector da cultura face a Pequim que o levaram a ficar e, agora, a querer que Macau seja a sede principal da empresa que também opera no Interior do País. “Sinto que há muitas vantagens em estabelecer um negócio aqui. O Governo apoia bastante”, enfatiza Duzh.
O produtor diz não ter encontrado grandes obstáculos para entrar no mercado da RAEM, mas sublinha que a facilidade não é a mesma se o caminho for ao contrário. A concorrência, a competição e a cultura fazem com que, na opinião de Duzh, seja difícil um negócio local passar a fronteira. “É fundamental encontrar um intermediário ou conseguir uma parceria.”
Apesar das lacunas que encontra em Macau – como a “falta de recursos humanos” ou ser um mercado “pequeno” –, o produtor defende que há “um enorme potencial” para desenvolver a área da cultura e “fazer algo grande” na região. “Macau pode ser grande enquanto marca. E precisa de empresas como nós. Pequim não precisa de nós como Macau. Já lá há intelectuais que cheguem”, considera.
O director do Departamento de Apoio ao Investidor do IPIM, Agostinho Vong, concorda que Macau é um mercado “limitado”, mas ressalva que os benefícios podem acabar por compensar as limitações. “Se nos comparamos com o Interior do País, temos algumas vantagens como impostos reduzidos, um mercado livre, e a ausência de limitações ao nível de entrada e saída de pessoas”, enumera.
A juntar, acrescenta o responsável do Governo, está ainda a relação próxima com o País, países de língua portuguesa e, agora, com os territórios abrangidos pela política ‘Uma Faixa, Uma Rota’. “Todos os mercados em crescimento, como o da Malásia, Indonésia, Myanmar e Laos, já oferecem vantagens que as empresas locais podem aproveitar. Macau pode não ser um grande mercado, mas pode ser um intermediário para quem está a começar”, defende.
Startups ganham primeira semana
A primeira edição da Start-up Week decorreu em Novembro passado e contou com a participação de 60 oradores de Macau, do Interior do País e de Hong Kong. Investidores, empresários, académicos e membros do Executivo estiveram nas palestras e exposição, que teve lugar no Venetian, para debater sobre o modelo de negócio que começa agora a dar os primeiros passos na RAEM.
Alexandre Lobo, a representar a Escola de Gestão da Universidade de São José, salienta o papel “fundamental” das universidades para que se crie uma clima de empreendedorismo sustentado. O professor de Gestão alerta que a taxa de mortalidade de uma startup é ainda mais elevada do que a de uma pequena e média empresa, e que, por isso, a formação, garantida pelas entidades de ensino, é determinante para que se superem as dificuldades.
Para o académico, os jovens empresários locais têm de saber aproveitar as áreas em que a região se destaca. “Macau tem de saber posicionar-se. A economia local está focada nos serviços. Só a área do turismo está sedenta de novas ideias e precisa disso para sobreviver. E aqui já há uma gama de possibilidades enorme”, realça.
Ao potencial do sector que é um dos motores da economia local, Lobo acrescenta o potencial da cidade como pólo de ligação com zonas estratégicas. O professor recorda que Macau está cada vez mais focada em ser uma ponte entre os países de língua portuguesa e a China. “O que também abre possibilidades enormes”, reforça.
Mas há mais, na opinião de Alexandre Lobo. “As empresas locais têm de começar a pensar na integração na região da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, que também é uma área estratégica do Governo. Tem mercados enormes que precisam de novas ideias que as empresas locais podem explorar, como Zhuhai e Cantão.”
Agostinho Vong diz que o Executivo tem claro o percurso que Macau deve seguir. O responsável do IPIM explica que mais do que atrair “muitos investidores estrangeiros” para criarem negócios em Macau, o objectivo é captar esse investimento para que os locais tenham mais oportunidades. “Não é realista que uma cidade tão pequena tenha a ambição de criar um ambiente enorme de empreendedorismo”, defende.
Aprender sem copiar
O facto de estar agora a começar pode funcionar a favor de Macau que, concordam empresários e académicos, deve aprender com o que foi feito no resto do mundo e fintar os erros cometidos por mercados mais maduros. “Macau já tem de partir na dianteira e implementar as melhores práticas internacionais”, defende o professor Alexandre Lobo.
Chong Tak Lo, director da Associação Comercial de Macau, concorda e dá como exemplo o modelo local de incubadoras. Actualmente, há duas: a Incubadora Tecnológica de Macau – criada em 2001, e que conta com o apoio do Governo e de empresas privadas –, e o Centro de Incubação de Negócios para Jovens de Macau. “Não se podem limitar a ser um espaço físico gratuito. Têm de ajudar a desenvolver o negócio. Muitos empresários têm boas ideias, mas não têm contactos. As incubadoras em Macau têm de fazer essa ligação a outras incubadoras e partes do mundo”, aconselha o também membro do Conselho para as Indústrias Culturais.
Já Manuel Correia da Silva diz que Macau “pode aprender, mas não pode copiar” os modelos estrangeiros, sob pena de falhar. O criativo da marca LinesLab realça que a região tem de analisar os mercados vizinhos, como o de Hong Kong e de Shenzhen “onde já há muita coisa a acontecer”, e evitar oferecer o mesmo. A diferença, continua, pode estar mais uma vez na proximidade aos países de língua portuguesa. “Temos uma relação com países como Portugal, a dar algumas cartas com a Web Summit, e o Brasil, que tem um ecossistema interessante. Também se fala do potencial de novas economias como Timor, onde faltam muitas coisas. Temos de ser inteligentes na forma como nos podemos posicionar. Cabe à comunidade de empreendedores ser capaz de encontrar oportunidades, soluções e ter as competências para vingar”, afirma.
Alexandre Lobo defende que “não é num mês que se cria um ambiente de empreendedorismo”, mas realça que Macau tem características que podem ajudar, como a “legislação favorável” em matéria de impostos e de contratação de recursos humanos. “Isso tudo facilita o processo de criação de um ambiente empreendedor”, explica.
Para o presidente da Associação Portuguesa de Business Angels, João Trigo da Rosa, a Start-up Week é um bom prenúncio e compara-a à Semana Global do Empreendedorismo, lançada há 10 anos em Portugal. Trigo da Rosa sublinha que a iniciativa foi “muito importante” para agregar empreendedores, empresários, universidades e o Governo em Portugal. “A Start-up Week compara-se a essa nossa iniciativa, em que se procurou juntar os vários protagonistas do ecossistema e experiências internacionais”, refere o convidado do evento.
Hoje, Portugal é palco da Web Summit, uma das cimeiras mais importantes na área do empreendedorismo e tecnologia, e uma referência internacional no panorama das startups. Tudo começou com a crise económica que atingiu o país e que “obrigou as pessoas a procurarem alternativas” de vida.
As políticas ajudaram. Os estímulos fiscais, os vistos para estrangeiros que queiram radicar-se em Portugal, o fundo de investimento de 200 milhões de euros que pode ser aproveitado por investidores nacionais e estrangeiros que queiram investir em Portugal – “trazendo capital estrangeiro, mas sobretudo know-how” – foram medidas que criaram condições para a explosão de startups em Portugal. Apesar do papel do Executivo, João Trigo da Rosa insiste: “O grande dinamizador foi a sociedade civil. Houve um conjunto de jovens que mudou a mentalidade e que começou a ser muito mais empreendedor do que era a geração anterior”, recorda.
Apesar do mercado português ter outra escala e já se encontrar num ponto mais avançado, o também professor entende que o país e Macau se podem ajudar mutuamente. “A relação entre os players é muito importante. A maior ajuda que podem dar é estabelecendo uma rede entre as startups dos dois territórios”, afirma Trigo da Rosa.