A diversificação adequada da economia de Macau passa também pela criação de novos projectos empresariais por parte de empreendedores locais. Na cidade, existem várias plataformas com o objectivo de fomentar a incubação de start-ups e a aceleração de negócios
Texto Vitória Man Sok Wa
Visam apoiar a transformação de ideias inovadoras em empresas de sucesso, estimular o empreendedorismo e ajudar à criação de emprego. Numa penada, as várias plataformas de incubação de start-ups existentes em Macau pretendem incentivar o desenvolvimento de um tecido empresarial mais diferenciado e dinâmico, contribuindo para a diversificação adequada da economia local.
A ambição das incubadoras de negócios locais, porém, não se fica pelo mercado da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM). Parte dos esforços em curso pretende apoiar negócios que possam competir no contexto mais alargado da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau e até mesmo entrar no mercado dos países de língua portuguesa.
Criada em 2017, a Companhia de MBOX, Limitada beneficiou, desde a sua fundação, do apoio de uma incubadora de empresas. O negócio oferece soluções de automação inteligente para retalho, desde o desenvolvimento de sistemas até à operação de máquinas inteligentes de venda de produtos. O conceito está actualmente em fase de expansão para Hong Kong.
Em entrevista à Revista Macau, Lap Chan, co-fundador da MBOX, sintetiza o porquê da start-up se ter associado ao Centro de Incubação de Negócios para os Jovens de Macau (MYEIC, na sigla inglesa): procurar aumentar a exposição do seu projecto e assim ampliar a rede de potenciais parceiros e clientes. A isso, diz, surgiu associado um “benefício adicional”: a possibilidade de utilizar as instalações de escritório de “alta qualidade” disponibilizadas pelo centro aos seus membros, acessíveis 24 horas por dia, sete dias por semana. “Isso tornou a gestão da nossa empresa mais simples”, afirma o jovem empresário.
Para a MBOX, a rede de contactos disponibilizada pelo MYEIC foi a grande mais-valia oferecida pelo centro. “Para além de facilitar as ligações com entidades governamentais, resorts integrados e outros grupos empresariais importantes na cidade, o MYEIC também fornece acesso a contactos em Portugal, Hong Kong e no Interior da China”, afirma Lap Chan. “Estes recursos têm sido fundamentais para facilitar o nosso crescimento.”
Apoiar e acelerar negócios emergentes
A incubação de empresas está longe de ser um conceito recente. O modelo surgiu originalmente em 1959, nos Estados Unidos da América, estendendo-se à Europa e ao resto do mundo nas décadas seguintes.
Desde a viragem do século, o tema da incubação de empresas ganhou fôlego renovado, muito por conta de um “boom” ligado a projectos de base tecnológica, em particular relacionados com o sector da Internet. Programas inovadores de aceleração de negócios emergentes apoiando pequenas start-ups com propostas disruptivas tiveram, nos últimos 20 anos, um impacto transformador no panorama empresarial global.
Exemplos de gigantes digitais actuais que, nos seus primórdios, recorreram aos serviços de incubadoras de empresas são muitos e variados. Entre estes, estão o serviço de armazenamento de ficheiros digitais em nuvem Dropbox, a plataforma social Reddit ou o “marketplace” de arrendamento de curta duração Airbnb. Curiosamente, os três contaram com o apoio da mesma incubadora de empresas: a norte-americana Y Combinator, com sede no Silicon Valley, na Califórnia.
O fomento ao desenvolvimento empresarial proporcionado durante a fase de incubação de um novo projecto pode tomar diversas formas – tal depende não só do perfil da incubadora em causa, mas também das necessidades específicas de cada start-up. O objectivo primordial passa sempre por ajudar esses negócios emergentes a crescer e a tornarem-se sustentáveis.
O tipo de suporte oferecido pode passar pela disponibilização de espaço físico – como áreas de escritório – a infra-estruturas e equipamentos especializados. A isso, soma-se o acesso a consultoria em áreas como estratégia empresarial, marketing, finanças e gestão.
Diversas plataformas de incubação de negócios proporcionam cursos de formação e workshops, bem como acesso a “networking” com outros empreendedores e potenciais investidores. Há ainda incubadoras que disponibilizam apoio administrativo e acesso a canais especiais de financiamento. Por fim, surgir associado a uma incubadora de empresas com um histórico de sucesso no lançamento de projectos pode elevar a visibilidade de uma start-up e facilitar a promoção das suas iniciativas.
“Para além de facilitar as ligações com entidades governamentais, resorts integrados e outros grupos empresariais importantes na cidade, o Centro de Incubação de Negócios para os Jovens de Macau também fornece acesso a contactos em Portugal, Hong Kong e no Interior da China”
LAP CHAN
CO-FUNDADOR DA START-UP MBOX
No caso de Macau, como noutras jurisdições, a incubação de negócios é assegurada em diversas frentes. Uma delas é a universitária: várias instituições de ensino superior da RAEM – da Universidade de São José à Universidade de Turismo de Macau – possuem unidades de incubação de empresas especialmente vocacionadas para apoiar a transformação em negócio de projectos desenvolvidos pelos seus alunos (e docentes). Para incentivar essa conversão, o Governo lançou em 2021 o Programa de Apoio Financeiro para Combinar Indústria-Universidade-Investigação com Empresas.
Por exemplo, o Centro de Inovação e Empreendedorismo da Universidade de Macau, criado em 2017, apoiou já a incubação de mais de meia centena de start-ups, de acordo com dados divulgados em Abril passado. Entre as empresas apoiadas, encontram-se projectos ligados a sectores tão variados como a cultura e indústrias criativas, protecção ambiental, tecnologias de informação, medicina ou biotecnologia, muitos deles visando como mercados potenciais não só a RAEM, mas também o Interior da China.
Incubar para diversificar
O estímulo à incubação de empresas ligadas à inovação tecnológica é referido no texto do “Plano de Desenvolvimento da Diversificação Adequada da Economia da Região Administrativa Especial de Macau (2024-2028)”. Aí, é enfatizada a importância de “facultar espaços temporários e gratuitos” a este tipo de projectos empresariais, com “vista a prestar apoio ao seu desenvolvimento”.
Para promover a inovação e o empreendedorismo jovem, o Governo da RAEM tem vindo a lançar uma série de medidas de apoio específicas, recordava o Secretário para a Economia e Finanças, Lei Wai Nong, durante uma intervenção na Assembleia Legislativa, no início do ano. Além da concessão, através do Plano de Apoio a Jovens Empreendedores, de um fundo sem juros para a criação de negócios, o responsável enfatizou a constituição do MYEIC como meio de proporcionar aos empreendedores locais suporte e serviços diversificados no que toca à criação de negócios.
No ecossistema de incubação de empresas de Macau, o MYEIC é uma das estruturas de maior relevo. O centro foi lançado em 2015 pelo Governo e a sua gestão está actualmente a cargo da Da Heng Qin (Macau) Co., Ltd.. As suas instalações – com uma área de 1.300 metros quadrados – situam-se no NAPE, local da cidade onde se concentram diversas empresas. O espaço oferece, entre outras valências, áreas de trabalho de utilização partilhada (“coworking”), uma sala de conferências e uma sala para “roadshows”. Adicionalmente, o MYEIC disponibiliza serviços de consultoria jurídica e fiscal, além de acesso a eventos promocionais e de intercâmbio, nomeadamente com entidades congéneres do Interior da China e dos países de língua portuguesa.
A fatia de leão das mais de 500 empresas actualmente associadas ao centro dedica-se a actividades científicas e tecnológicas. O número de entidades apoiadas continua a aumentar a um ritmo considerável, com cerca de 90 novas empresas a juntarem-se ao MYEIC durante os primeiros seis meses de 2024.
A importância do primeiro passo
A Yorkshire Online Academy Ltd., fundada em 2018, entrou para o centro logo nesse ano. Desde então, tem vindo a procurar expandir o seu negócio à escala global, com o apoio do MYEIC.
A empresa oferece uma plataforma digital de ensino de línguas. O negócio proporciona cursos de inglês, português, mandarim e espanhol, para além de organizar programas de Verão no Reino Unido.
“O MYEIC facilitou a identificação de potenciais oportunidades de investimento. Além disso, a nossa empresa participa activamente em workshops e eventos do centro, procurando melhorar o nosso modelo de negócio e expandir a nossa rede de contactos”, afirma Nicky Wong Man Teng, fundadora da Yorkshire Online Academy.
A empreendedora elogia o papel da incubadora na promoção de ligações empresariais. “A MYEIC facilitou a nossa parceria com o grupo de telecomunicações 3 Macau e 3 Hong Kong, bem como a obtenção de financiamento por parte do programa de incubação de empresas” do parque empresarial Cyberport, em Hong Kong, nota Nicky Wong.
Para lá do apoio formal proporcionado pelas incubadoras de empresas, um grupo de jovens locais com uma paixão comum pelo empreendedorismo estabeleceu em 2017 uma plataforma visando prestar auxílio a outros jovens interessados em lançar o seu próprio negócio. O Macao Startup Club pretende servir como um fórum para partilha de ideias inovadoras. O principal objectivo é criar um ambiente propício ao fomento de start-ups e do empreendedorismo.
A abordagem do clube distingue-se da dos grandes centros de incubação, uma vez que procura promover um ambiente mutuamente benéfico, onde cada membro pode prosperar com a ajuda dos restantes membros como um todo. Isto é conseguido através da partilha de conhecimento, informação e contactos.
As actividades da plataforma abrangem desde programas de mentoria a concursos e workshops, passando ainda por aconselhamento financeiro. O clube já organizou mais de 60 eventos de “networking”, incluindo o “Startup Monthly”, que reúne regularmente jovens empresários de diversos sectores para discussão e partilha de ideias. Nos últimos sete anos, de acordo com os seus representantes, o grupo facilitou parcerias entre mais de mil empresas na área da Grande Baía.
James Si Tou, presidente do clube, reconhece que “o empreendedorismo local é condicionado por uma série de factores”, incluindo o mercado “relativamente limitado”. O empresário defende que, ainda assim, existem oportunidades significativas em Macau, dada a força do sector do turismo. Além disso, diz, “uma nova empresa não se deve focar apenas nas exigências de um único mercado geográfico”, sublinhando a importância de um empreendedorismo com uma visão sem fronteiras.