O percurso de Macau enquanto Região Administrativa Especial da República Popular da China tem sido impressionante, com a cidade a afirmar-se como uma das economias à escala mundial com o maior PIB per capita. Após uma primeira fase de crescimento fulgurante, seguiu-se uma outra – a actual – onde o foco está na qualidade e diversificação do tecido económico
Texto Stephanie Lai*
Seja qual for o ângulo escolhido, é inquestionável que a economia de Macau está hoje substancialmente mais robusta e madura do que em 1999, ano do retorno à Pátria. O desemprego caiu substancialmente, o produto interno bruto (PIB) registou um enorme aumento e os depósitos bancários subiram em flecha. Após um primeiro período de forte crescimento assente na indústria do entretenimento e lazer, a aposta assenta agora na estratégia governamental de diversificação económica “1+4”, bem como na integração no desenvolvimento nacional através do projecto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau.
De acordo com Ricardo Siu Chi Sen, docente da Faculdade de Gestão de Empresas da Universidade de Macau, “um importante indicador” para demonstrar os benefícios para a população local do desenvolvimento verificado ao longo dos últimos 25 anos prende-se com as “crescentes oportunidades de emprego” geradas pela economia. Segundo acrescenta o académico, a taxa geral de desemprego da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) desceu de 7,1 por cento em meados de 2000 – o valor mais alto do último quarto de século – para menos de 2 por cento actualmente.
Como consequência do desenvolvimento económico, Macau “está claramente a alcançar o pleno emprego”, nota o especialista, acrescentando que isso também contribuiu para que o rendimento médio da força de trabalho local tenha aumentado substancialmente desde o retorno à Pátria. Por exemplo, a remuneração média dos trabalhadores a tempo completo dos sectores da hotelaria, restauração e similares, do comércio por grosso e a retalho ou do sector financeiro triplicou (ou perto disso) desde 2000.
“Ao longo dos últimos 25 anos, as receitas fiscais dispararam”, refere ainda Ricardo Siu. Isto permitiu ao Governo da RAEM introduzir vários programas de bem-estar social, que “elevaram claramente o bem-estar económico” da população. Um desses casos foi o investimento governamental em habitação pública, que “melhorou efectivamente o ambiente de vida de muitas famílias com baixos rendimentos”, refere o especialista.
O impacto da liberalização do jogo
Ricardo Siu nota que é inevitável apontar como um dos momentos marcantes do desenvolvimento económico da RAEM a liberalização da indústria do jogo, que ocorreu em 2002. O académico sublinha que foi, “indiscutivelmente”, o sucesso deste processo de liberalização levado a cabo pelo Governo da RAEM que ajudou – e muito – Macau a tornar-se num destino turístico atraente e competitivo. De resto, os recursos económicos e financeiros gerados pela indústria do jogo permitiram, posteriormente, que Macau avançasse com a estratégia de se posicionar como um “centro mundial de turismo e lazer” e, mais recentemente, com políticas de apoio a sectores industriais emergentes.
“Embora o progresso da economia nos primeiros 15 anos tenha sido largamente estimulado pelo desenvolvimento do turismo de entretenimento e lazer, esta estratégia foi de facto eficaz face à realidade de Macau”, considera Ricardo Siu. “A partir da construção bem-sucedida desta base, o desenvolvimento global da economia de Macau foi acelerado e tornou-se gradualmente mais diversificado, a partir de meados da década de 2010”, acrescenta o académico.
Frederico Ma Chi Ngai, presidente da direcção da centenária Associação Comercial de Macau, concorda que a política de liberalização da indústria do jogo teve um papel importante no desenvolvimento da cidade na “era RAEM”. “O sector do turismo impulsionou o desenvolvimento de sectores relacionados, como o comércio a retalho, a restauração e a construção”, diz.
Segundo refere, “desde o retorno de Macau à Pátria, a economia de Macau registou um enorme crescimento, com a abertura moderada do sector do jogo impulsionando um rápido progresso económico, tornando o PIB per capita da RAEM num dos mais elevados do mundo”. Dados do Fundo Monetário Internacional divulgados em Abril colocavam a região entre as dez economias com maior PIB per capita em termos nominais.
Tal como Ricardo Siu, o dirigente da Associação Comercial de Macau sublinha a ligação entre o crescimento da economia da RAEM e a melhoria da qualidade de vida da população. “O desenvolvimento económico conduziu a um aumento das receitas públicas e o Governo da RAEM continuou a investir na melhoria dos serviços públicos, como transportes públicos, higiene ambiental, cuidados de saúde, educação e segurança pública”, afirma. “Isto é a prova do pleno aproveitamento das vantagens institucionais e das oportunidades de desenvolvimento trazidas pelo princípio ‘um país, dois sistemas’, bem como da governação eficaz do Governo Central e do Governo da RAEM.”
Diversificar para expandir
O grande desafio da RAEM, passados 25 anos após o seu estabelecimento, coloca-se em assegurar uma maior diversificação da sua economia para os anos vindouros. O objectivo é claro: que a indústria do jogo não desempenhe um papel tão preponderante.
Nesse âmbito, a estratégia de desenvolvimento de diversificação adequada da economia “1+4”, apresentada pelo Governo de Ho Iat Seng, é vista como um modelo de futuro para a RAEM. Foi escolhido um conjunto de quatro indústrias consideradas de desenvolvimento prioritário – nomeadamente as áreas da tecnologia de ponta, da “big health”, da indústria financeira moderna e das convenções, exposições, comércio, cultura e desporto –, cujo crescimento deve ser apoiado através do sector basilar da economia local, o turismo e lazer.
“Não iremos poupar esforços para construir uma estrutura industrial de desenvolvimento sustentável em conformidade com a realidade de Macau e para acelerar o desenvolvimento diversificado e de alta qualidade da economia de Macau”, avisava em Novembro do ano passado o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, durante a apresentação das Linhas de Acção Governativa para 2024. Poucos dias antes, o seu Governo tinha apresentado oficialmente o “Plano de Desenvolvimento da Diversificação Adequada da Economia da RAEM (2024-2028)”, visto como o primeiro programa abrangente e sistemático de promoção de novas indústrias, estando articulado com o Décimo Quarto Plano Quinquenal Nacional e as “Linhas Gerais do Planeamento para o Desenvolvimento da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau”.
Frederico Ma sublinha que, no âmbito dos esforços de diversificação adequada da economia levados a cabo ao longo da última década, os sucessivos governos da RAEM criaram já uma série de políticas para apoiar o desenvolvimento das pequenas e médias empresas locais e o empreendedorismo jovem. “As infra-estruturas também registaram melhorias constantes, incluindo a rede de transportes”, acrescenta.
Olhando para a estratégia “1+4”, o dirigente da Associação Comercial de Macau não tem dúvidas que esta “é uma política importante de conversão da economia e promoção do desenvolvimento sustentável, ajudando a aumentar a competitividade global” da RAEM. O responsável concorda que tal aposta poderá “melhorar efectivamente” a estrutura industrial da região e “reduzir o risco de dependência excessiva do sector do jogo”, ajudando a atrair recursos humanos qualificados para o mercado laboral local.
Na mesma senda, continua Frederico Ma, o projecto da Grande Baía “é uma das importantes estratégias nacionais e o papel de Macau como um dos participantes ajudará a reforçar o forte sentido de reconhecimento e de missão de todos os sectores em relação ao País”. De acordo com o líder associativo, a promoção da integração regional e a iniciativa da Grande Baía “abriram um espaço mais amplo” de crescimento para Macau. Frederico Ma diz que a RAEM “pode aproveitar os dividendos provenientes das políticas aplicadas” na Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin para expandir as suas áreas de desenvolvimento económico e social.
*com Emanuel Graça