Inaugurado em 2023, o Centro Cultural Moçambique-China é já um dos maiores cartões de visita da capital moçambicana. Financiado pela China, o complexo é palco para espectáculos, conferências, seminários e exposições, entre muitas outras iniciativas. O balanço do primeiro ano de actividade é positivo, dizem em tom unânime artistas e administradores do espaço
Texto Jaime Álvaro
É um palco de excelência para diversas manifestações artísticas em Moçambique, desde concertos a peças de teatro, passando por exposições e seminários, além de ciclos de cinema e lançamentos de livros. Inaugurado a 28 de Setembro de 2023 pelo Presidente de Moçambique, Filipe Nyusi, o Centro Cultural Moçambique-China (CCMC) veio revolucionar o panorama cultural moçambicano, criando as condições para que vários tipos de manifestações artísticas florescessem.
O CCMC, cuja construção custou cerca de 70 milhões de dólares americanos, é considerado o segundo maior centro cultural de África, com uma área total de 20 mil metros quadrados. O espaço alberga três salas para teatro, espectáculos musicais, exposições e eventos corporativos, destacando-se o Grande Auditório com capacidade para 1500 pessoas.
O centro, uma infra-estrutura imponente, moderna e em consonância com padrões internacionais, foi erguido no campus principal da Universidade Eduardo Mondlane, na cidade de Maputo.
Financiado pelo Governo chinês e construído por empresas chinesas, o CCMC venceu o “Prémio Luban”, que reconhece a qualidade da engenharia na indústria da construção da China.
Segundo a Ministra da Cultura e Turismo de Moçambique, o CCMC veio dinamizar não só o sector cultural do país, mas também se configura como uma oportunidade para a promoção do turismo de negócios, nomeadamente da indústria das convenções e exposições.
“Este centro tem um grande papel, não só no panorama artístico-cultural moçambicano, mas também a nível regional, uma vez que não existe na região da SADC [Comunidade de Desenvolvimento da África Austral] uma casa tão grande, com tantas valências e com a qualidade que este espaço tem”, afirmou a ministra Eldevina Materula, por ocasião da cerimónia de celebração do primeiro aniversário do CCMC.
A governante sublinhou que o CCMC marcou o início de uma “nova era” para o sector cultural e empresarial moçambicano, que irá tornar Maputo num centro que pode acolher eventos internacionais, “impulsionando o turismo” nacional.
“Neste momento, vamos começar a ter a nossa própria programação. Por outro lado, Moçambique já tem um espaço de qualidade que pode acolher qualquer tipo de espectáculo musical, artístico e não só”, frisou Eldevina Materula.
Construído para artistas
A atmosfera cultural de Maputo já era vibrante, com vários talentos em diversas áreas, incluindo música, dança, teatro, literatura, artes plásticas e cinema. O entretenimento ajuda a transformar a cidade num palco vivo, com uma programação para todos os gostos. Mas o CCMC veio dar novo fulgor à cena artística na capital moçambicana, uma vez que foi projectado para artistas.
“O centro veio promover a inclusão, a educação e a diversidade cultural, para além das artes. Trouxe benefícios para a comunidade através de vários eventos culturais e sociais, festivais estudantis, feiras de gastronomia, cerimónias de encerramento de instituições de ensino e muito mais”, sublinha a directora-geral do CCMC, Isabel Macie, em entrevista à Revista Macau.
– LER MAIS | Sonho tornado realidade –
A dirigente realça que a gestão do centro continua a ser um desafio, mas faz uma avaliação positiva do primeiro ano de operação.
“Positivo porque, desde a sua inauguração, o centro nunca fechou e é um dos recintos mais procurados para eventos na nossa cidade capital. O centro é o orgulho dos moçambicanos e o legado dos 50 anos de independência”, destaca Isabel Macie.
Desde a sua abertura, o CCMC já acolheu mais de 60 eventos, sendo a maioria espectáculos e concertos, seguidos de conferências e simpósios, galas, concursos de beleza, feiras e exposições, festivais culturais, exibições de filmes, entre outros. O recinto recebeu, no primeiro ano, mais de 50 mil visitantes, entre espectadores e participantes em eventos, de acordo com dados do CCMC.
A directora-geral do CCMC reconhece que a gestão do recinto ainda tem de ser aperfeiçoada e a oferta mais diversificada, nomeadamente no que diz respeito a actividades para crianças. “Temos que melhorar esta componente com actividades interactivas e educacionais”, salienta.
Entre os artistas que falaram à Revista Macau, alguns são unânimes em reconhecer a importância do CCMC no fortalecimento da indústria criativa nacional. Humberto Luís recentemente apresentou no centro o seu concerto “Um Show Maduro”, com casa cheia. O músico não tem dúvidas de que o recinto marcou um virar de página na cena artística moçambicana.
“Considero-me abençoado por ter a oportunidade de actuar no palco do CCMC. A vontade de fazer um concerto com uma banda era um sonho antigo que se realizou com a abertura do centro”, salienta Humberto Luís, manifestando o interesse em voltar ao palco onde foi feliz.
Zé Pires, renomado músico, compositor, produtor e empresário moçambicano, é presença assídua no CCMC. Desde a inauguração do centro, o artista já realizou quatro concertos naquele espaço, com destaque para o “Des-Concertando”. Zé Pires não tem dúvidas de que não existe um melhor lugar na capital moçambicana para acolher eventos artísticos.
“Naturalmente, escolhi o CCMC por causa de toda a infra-estrutura que oferece. Tem equipamentos de qualidade, desde o sistema de som e iluminação, que facilita a organização, além do conforto que a casa oferece aos artistas e ao público”, diz o artista, que tem mais de 25 anos de experiência no sector.
Novo paradigma
O evento “Des-Concertando” assenta num conceito que nasceu da tentativa de quebrar paradigmas, unindo os universos da música popular e da música clássica. Zé Pires reuniu no palco do CCMC um número recorde de mais de 80 artistas, entre bandas e orquestras, cantores de música ligeira e música clássica, coristas, instrumentistas, coreógrafos, bailarinos, artistas plásticos, entre outros.
O artista e produtor afirma que quer fazer do CCMC um local de renascimento dos artistas moçambicanos. “Tenho bastante interesse em resgatar muitos artistas, levá-los novamente ao palco.”
Outro projecto que mostra que esta fusão da música popular com o estilo clássico é possível é o Projecto Xiquitsi, iniciativa da Associação Kulungwana, que visa promover a inserção social, bem como a capacitação profissional, através do ensino colectivo de música, dando, assim, os primeiros passos no processo de formação da primeira orquestra clássica em Moçambique.
Há dez anos que o projecto oferece a crianças e jovens desfavorecidos a oportunidade de aprender música de forma gratuita. A Temporada de Música Clássica, em Maputo, é o evento de maior relevo dinamizado pelo projecto Xiquitsi, que agora também sobe ao palco do CCMC. A iniciativa beneficia mais de 250 alunos, que formam três orquestras e um coro.
“Tivemos bons momentos no corrente ano. Já estão programados alguns eventos para os próximos meses, a destacar o ‘Ngoma Moçambique’, concertos de Elvira Viegas, Casemiro Nhussi, Mingas e o Festival Poetas D´Alma”, refere Isabel Macie.
Segundo a directora-geral do CCMC, está em desenvolvimento uma programação integrada de actividades em parceria com promotores de eventos em diversas categorias com vista a promover uma maior utilização do complexo por parte da classe artística nacional.
Para a responsável, para além das artes, o CCMC é também “um lugar de referência para os amantes de arquitectura e um marco no roteiro turístico cultural da cidade”.
Um futuro comum
Após o primeiro ano de funcionamento, há um consenso entre os artistas sobre a necessidade de assegurar a boa gestão do CCMC para continuar a apoiar o desenvolvimento das artes em Moçambique.
“A manutenção é um desafio, mas só irá acontecer se tivermos uma boa gestão do espaço. O centro só vai sobreviver se tiver uma gestão autónoma, independente e competente, que deve prestar contas ao Estado. Não será a melhor opção se o recinto for gerido directamente pelo Estado, considerando que o Governo terá outras prioridades”, salienta o músico e produtor Zé Pires.
De acordo com Isabel Macie, deve ser prestada especial atenção à gestão do novo recinto. “Através do Decreto n.º 47/2022, o CCMC já é uma entidade autónoma, pois foi criado como um instituto público. O que está em causa é o modelo de gestão. Sem dúvidas, um espaço majestoso e desta magnitude deve ser gerido de uma forma especializada para garantir a sua sustentabilidade”, destaca a directora-geral, adiantando que se está a estudar a possibilidade de a gestão do recinto ser efectuada através de uma parceria público-privada (PPP) de modo a garantir a sustentabilidade do centro, mas salvaguardando a vertente social.
O CCMC conta actualmente com dez trabalhadores a tempo inteiro e sete em regime parcial. Além disso, o recinto conta também com técnicos chineses na área da manutenção.
Hanaya Sega, uma das funcionárias do centro, diz ser um privilégio fazer parte do projecto e ver o impulso que o CCMC deu ao panorama artístico moçambicano.
“O que mais me marcou aqui no centro foi o espectáculo da cantora Assa Matusse, que tive a oportunidade de conhecer aqui. Por estar aqui, aprendo bastante sobre a área cultural e artística, o que me leva a ponderar formar-me nesta área”, afirma.