A Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin está a celebrar três anos: 2024 marca a conclusão da primeira fase de desenvolvimento do projecto. Opiniões recolhidas pela Revista Macau apontam para resultados significativos já alcançados
Texto Viviana Chan
Neste mês de Setembro, assinala-se o terceiro aniversário do estabelecimento da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin. Passo a passo, muitas das acções a concretizar durante a primeira fase do projecto – que termina este ano – foram já concluídas.
Durante a mais recente reunião da Comissão de Gestão da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin, no final de Agosto, o Chefe do Executivo, Ho Iat Seng, sublinhava já o seu optimismo quanto a serem atingidas as metas estabelecidas para a primeira fase do projecto. Na altura, o governante – que é também um dos líderes da Comissão de Gestão da Zona de Cooperação Aprofundada – mostrava-se convicto numa conclusão bem-sucedida da primeira fase e num arranque “tranquilo” da segunda fase de implementação da Zona de Cooperação Aprofundada.
Um dos sinais de sucesso do projecto é a crescente presença de empresas lusófonas em Hengqin. Tal é encarado como um reflexo do êxito das estratégias seguidas no que toca à internacionalização da iniciativa.
António Lei Chi Wai, director dos Serviços de Desenvolvimento Económico da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin, garante que têm sido aproveitados ao máximo os recursos internacionais de Macau para promover Hengqin junto de investidores do exterior. Através destas actividades de promoção, diz, “mais de dez empresas de países lusófonos já estão registadas em Hengqin, preparando-se agora para aí se estabelecerem e iniciarem operações”.
O responsável refere que os Serviços de Desenvolvimento Económico da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin têm-se esforçado por utilizar diferentes canais com vista a proporcionar um conhecimento mais profundo de Hengqin às empresas lusófonas. “Através de Macau, enquanto plataforma entre a China e os países de língua portuguesa, esperamos atrair mais empresas de países lusófonos para se desenvolverem em Hengqin”, diz.
Entre os canais utilizados, António Lei destaca o Centro de Intercâmbio e Cooperação de Ciência e Tecnologia entre a China e os Países de Língua Portuguesa. O organismo, estabelecido pelas autoridades de Macau, Hengqin e Zhuhai, opera segundo um modelo de “duplo centro”, com uma sede em Macau e outra na Zona de Cooperação Aprofundada. Um dos seus objectivos é captar para Hengqin empresas lusófonas a operar no sector da tecnologia de ponta.
As “quatro novas indústrias” de Hengqin
O “Projecto Geral de Construção da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin”, promulgado a 5 de Setembro de 2021 pelo Comité Central do Partido Comunista e pelo Conselho de Estado, lançou oficialmente a Zona de Cooperação Aprofundada, a qual ocupa toda a área da ilha de Hengqin. O documento, que surgiu no seguimento das “Linhas Gerais do Planeamento para o Desenvolvimento da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau”, divulgadas dois anos antes, define a estratégia para o futuro de Hengqin, parte do município de Zhuhai, vizinho da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM).
Entretanto, em Dezembro do ano passado, após a aprovação do Conselho de Estado, a Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma divulgou o “Plano Geral do Desenvolvimento para a Construção da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin”, também conhecido como “Plano Hengqin”. É neste documento que surgem as directrizes para o desenvolvimento da Zona de Cooperação Aprofundada no espaço temporal dos próximos dez a 15 anos. Nesse âmbito, são definidas metas em relação às três fases do projecto, nomeadamente para os anos de 2024, 2029 e 2035.
Os objectivos a cumprir este ano incluem assegurar que o novo sistema de “negociação, construção e administração conjuntas e compartilha de resultados entre Guangdong e Macau” na Zona de Cooperação Aprofundada esteja a funcionar de forma suave. Pretende-se igualmente que a estrutura do desenvolvimento da integração Hengqin-Macau esteja preliminarmente estabelecida. Outra meta – já atingida – prende-se com o posicionamento de Hengqin enquanto zona aduaneira autónoma.
Além disso, o “Plano Hengqin” estipula que, no final da primeira fase, deve estar preliminarmente formado o modelo de apoio da Zona de Cooperação Aprofundada à promoção da diversificação adequada da economia de Macau. Este modelo de apoio surge associado ao “Plano de Desenvolvimento da Diversificação Adequada da Economia da RAEM (2024–2028)”, divulgado em Novembro do ano passado pelo Governo liderado por Ho Iat Seng. Nesse plano de Macau, é advogada a estratégia para o território de diversificação adequada da economia “1+4”, que tem o sector do turismo e lazer como pedra basilar, apostando no desenvolvimento prioritário de quatro áreas: tecnologia de ponta; “big health”; indústria financeira moderna; e convenções, exposições, comércio, cultura e desporto.
Assim, o “Plano Hengqin” define que, em torno da linha principal de promoção do desenvolvimento da diversificação adequada da economia de Macau, a Zona de Cooperação Aprofundada deve apostar naquilo que é denominado como as “quatro novas indústrias” para Hengqin. Estas incluem: a investigação e desenvolvimento científico e tecnológico e produção industrial envolvendo tecnologia de ponta; a indústria de marcas de Macau, como a medicina tradicional chinesa; os sectores das indústrias cultural, turística, de convenções e exposições e comércio; e as finanças modernas.
Este Verão, foi já leiloado o primeiro terreno na Zona de Cooperação Aprofundada destinado a uso industrial. O lote tem por finalidade a construção de um parque industrial com uma área de 400.000 metros quadrados, que possa adicionar capacidade de produção industrial avançada à Zona de Cooperação Aprofundada.
António Lei explica que, no âmbito das “quatro novas indústrias” para Hengqin, o novo parque industrial deverá estar focado nas áreas da tecnologia de ponta e marcas de Macau. “Espera-se que aumente as plataformas de investigação e desenvolvimento científicos” disponíveis na Zona de Cooperação Aprofundada e “expanda o espaço de produção, para apoiar o crescimento” de Hengqin, refere o responsável. “Pretende-se atrair empresas de alto valor acrescentado”, além de “aproveitar a marca ‘Macau’ para promover produtos desenvolvidos na Zona”, fazendo uso do modelo de cooperação industrial “registo em Macau + produção em Hengqin”, nota o director dos Serviços de Desenvolvimento Económico da Zona de Cooperação Aprofundada entre Guangdong e Macau em Hengqin.
Medidas geradoras de oportunidades
Um dos marcos da primeira fase da Zona de Cooperação Aprofundada foi o seu posicionamento, a partir de Março deste ano, como zona aduaneira autónoma. Foi, assim, implementado um modelo de duas linhas de supervisão aduaneira: uma “primeira linha”, entre Hengqin e a RAEM, e uma “segunda linha”, estabelecida entre Hengqin e as restantes regiões do Interior da China.
Nesse âmbito, foram criadas políticas e regulamentação fiscal favoráveis de importação e exportação de mercadorias aplicáveis apenas à “primeira linha” – ou seja, que excluem o resto do Interior da China. No âmbito da “segunda linha”, de forma a assegurar a inspecção e controlo de mercadorias que entram no resto do Interior da China a partir de Hengqin, foram estabelecidos postos de controlo em todas as conexões entre a ilha e o restante município de Zhuhai.
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A Nam Kwong International Conference & Exhibition Co., Ltd., ligada ao grupo estatal Nam Kwong, é uma das empresas de Macau que tem vindo a procurar aproveitar as oportunidades criadas pelas políticas especiais aplicáveis à Zona de Cooperação Aprofundada. A subdirectora da empresa, Zhou Jinyang, destaca que o posicionamento de Hengqin enquanto zona aduaneira autónoma trouxe vantagens significativas, aumentando a atractividade da ilha no que toca a acolher feiras internacionais. “O mecanismo proporcionou uma grande conveniência no desalfandegamento de mercadorias” para exposição, afirma.
A responsável destaca também a nova política de vistos de grupo de múltiplas entradas entre Macau e Hengqin, que está em vigor desde Maio. A medida permite que visitantes do Interior da China possam entrar e sair da RAEM sem limitações durante um período de sete dias, recorrendo a um mesmo visto. Segundo Zhou Jinyang, a indústria das convenções e exposições é uma das que saem beneficiadas com a medida, visto que esta pode ajudar a reduzir “significativamente” os custos de participação em eventos na RAEM.
“Podemos pernoitar em Hengqin e depois ir a Macau para participar em exposições ou conferências”, explica a dirigente da Nam Kwong International Conference & Exhibition. “Esta redução de custos é um atractivo importante para a realização de eventos, oferecendo um apoio positivo.”
“Um Evento, Dois Locais”
Com o estabelecimento da Zona de Cooperação Aprofundada, nasceu também o conceito “um evento, dois locais”: tal refere-se a convenções e exposições realizadas de forma simultânea em Macau e Hengqin. De acordo com Zhou Jinyang, a nova política de vistos de grupo de múltiplas entradas entre Macau e Hengqin, ao facilitar a movimentação de pessoas entre as duas regiões, funciona como um incentivo a actividades do tipo “um evento, dois locais”.
A responsável recorda que as primeiras exposições recorrendo ao modelo “um evento, dois locais” tiveram lugar em 2022. Desde então, diz, várias outras actividades têm seguido esse conceito. A dirigente da Nam Kwong International Conference & Exhibition defende que o modelo “um evento, dois locais” expandiu efectivamente o mercado para Hengqin-Macau, promovendo eficazmente a partilha de recursos entre os dois lados.
Zhou Jinyang salienta ainda as políticas preferenciais implementadas em Hengqin quanto ao imposto sobre o rendimento de pessoas colectivas. Há uma taxa reduzida fixada em 15 por cento, aplicável a sectores considerados prioritários. Essa taxa está abaixo do valor de 25 por cento aplicável no resto do Interior da China.
A responsável nota que os benefícios fiscais cobrem, entre outras, empresas dedicadas à corretagem, agenciamento e serviços de comércio entre o Interior da China e Macau e os países de língua portuguesa. Tal medida, sublinha, “não apenas reduz os custos operacionais das empresas e aumenta a respectiva rentabilidade, mas também estimula o desenvolvimento do sector”. “É benéfico para Hengqin e Macau promoverem conjuntamente um desenvolvimento económico moderadamente diversificado e impulsionar a criação de uma plataforma de serviços financeiros entre a China e os países de língua portuguesa”, conclui Zhou Jinyang.
Produzir em Hengqin, vender em Macau
Do lado do tecido empresarial da RAEM, a Zona de Cooperação Aprofundada abriu ainda outras oportunidades. A Associação Comercial de Macau, através do escritório que criou em Hengqin, tem vindo a promover o conceito “produção em Hengqin, comercialização em Macau”.
A ideia é simples: utilizar a Zona de Cooperação Aprofundada como base de produção para diversos tipos de artigos cujo propósito final seja a venda na RAEM. O presidente da direcção da Associação Comercial de Macau, Frederico Ma Chi Ngai, afirma que o objectivo é que as empresas da RAEM expandam as operações que já têm em Macau para a Zona de Cooperação Aprofundada, fazendo uso das políticas favoráveis que têm vindo a ser introduzidas.
Os dados oficiais demonstram que o número de empresas de Macau registadas na Zona de Cooperação Aprofundada é já significativo. Cifrava-se em 6365 no final de Julho deste ano, o que representa uma taxa de crescimento anual de 10,9 por cento.
Desde a sua criação há dois anos, a representação em Hengqin da Associação Comercial de Macau tem vindo a prestar diversos serviços às empresas de Macau que operam na Zona de Cooperação Aprofundada. Tal inclui proporcionar um elo de ligação com governos e empresas do Interior da China, além da prestação de serviços de consultoria. “A Associação Comercial de Macau sempre manteve o princípio de ajudar as empresas locais a entrarem em novos mercados e expandir-se internacionalmente”, sublinha Frederico Ma.
O responsável acrescenta que a entrada em Hengqin deve ser vista pelos empresários da RAEM como um primeiro passo num processo mais alargado de crescimento. “Esperamos que essas empresas possam expandir as suas operações para outras partes do País, incluindo o resto da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, integrando-se no panorama de desenvolvimento nacional”, afirma o dirigente associativo.