Guiné Equatorial

Cimentar uma relação antiga através de Macau

Foi a última nação a garantir o estatuto de membro do Fórum de Macau, mas a Guiné Equatorial tem as prioridades bem definidas. O país procura reforçar a longa e profícua relação com a China, estabelecida em 1970, dois anos depois de se ter tornado uma nação soberana, diz a delegada Cristina Mangue Abeso

Texto Marco Carvalho

Membro de pleno direito da plataforma de cooperação multilateral sino-lusófona desde Abril de 2022, a Guiné Equatorial está ainda a conhecer os cantos à casa e a assimilar procedimentos. Mestre em Direito Internacional, com serviço diplomático prestado em países como a Rússia, o Brasil e Portugal, Cristina Mangue Abeso exerce, desde 30 de Novembro de 2022, o papel pioneiro de delegada da Guiné Equatorial junto do Secretariado Permanente do Fórum para a Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Macau) – também conhecido como Fórum de Macau.

“Foi um orgulho, da minha parte, profissionalmente, poder ser nomeada a primeira delegada da Guiné Equatorial junto do Fórum de Macau. A experiência de não ter havido, antes de mim, ninguém a representar o país para poder formar e dar os detalhes do funcionamento da vida num lugar como Macau foi, obviamente, um desafio”, admite a diplomata. 

“Ao fim de 18 meses a trabalhar como delegada, creio que as coisas estão a andar bem. Não diria que estou perfeitamente adaptada, até porque a adaptação é um processo que nunca acaba, mas estou praticamente instalada e estou a apanhar o ritmo de trabalho. É uma experiência de que estou a gostar”, complementa.

Fluente em português, espanhol e russo, Cristina Abeso é o espelho de uma nação que elegeu a proficiência linguística como instrumento de diplomacia económica. A aposta em idiomas como o francês e o português, que dividem com o espanhol o estatuto de língua oficial, serve o objectivo de reforçar mecanismos de integração regional, mas também de alcançar novos mercados e novas realidades económicas. 

“Para a Guiné Equatorial, pertencendo ao universo da língua e cultura hispânicas, a sua integração no Fórum de Macau é uma mais-valia que facilita a introdução de uma cultura nova, um pouco diferente da dos outros países membros”, assinala Cristina Abeso. “O que também facilita é a localização geográfica, porque se encontra numa zona da África Central onde o mercado é francófono. Quem estiver interessado em investir, descobrir e instalar-se na Guiné Equatorial, vai aproveitar o mercado da África Central, com uma cultura francófona”, salienta a representante.

Mas com a adesão ao Fórum de Macau, as autoridades de Malabo querem mais do que apenas aprofundar mecanismos de integração regional ou fomentar a presença em novos mercados. A entrada nesta plataforma multilateral abre uma nova frente de diálogo com a China, país que ao longo das últimas cinco décadas se tem revelado como um parceiro fulcral em domínios como o desenvolvimento de infra-estruturas, a formação de recursos humanos ou o trato comercial. 


“Com a visita do nosso presidente à República Popular da China,
a cooperação foi fortalecida com a abertura de uma nova parceria”

CRISTINA MANGUE ABESO
DELEGADA DA GUINÉ EQUATORIAL JUNTO DO FÓRUM DE MACAU

“A cooperação da Guiné Equatorial com a China, desde que foi estabelecida, em 1970, está focalizada em três áreas importantes: a área da educação, principalmente na formação de recursos humanos; a área sanitária e da saúde, através da dotação de equipamentos médicos em Malabo e em outros hospitais de várias províncias do país; e a área da implementação de infra-estruturas, porque a maior parte das obras que o país tem conduzido – e que ainda vai continuar a conduzir – foram implementadas por empresas chinesas”, ilustra Cristina Abeso. 

“Com a visita do nosso presidente à República Popular da China, no passado mês de Maio, a cooperação foi fortalecida com a abertura de uma nova parceria, que tem por objectivo a implementação da economia verde, a economia marítima e a economia azul”, avança a delegada. “O Governo chinês tem vindo a prestar algum apoio ao Governo da Guiné Equatorial no fortalecimento destes três sectores. Há ainda um outro memorando que foi assinado tendo em vista a implementação das obras sociais de que a Guiné Equatorial ainda está a necessitar”, acrescenta. 

Cooperação estratégica 

A mão da China no robustecimento da rede de infra-estruturas da pequena nação africana é evidente em domínios como o sector dos transportes, a habitação social ou o sector energético. Empresas chinesas construíram estradas e auto-estradas, edifícios administrativos, fracções de habitação social e duas barragens para abastecimento de água potável e produção de electricidade. 

“Há duas centrais hidroeléctricas construídas pela China. Temos a barragem hidroeléctrica de Sendje e a barragem do Djibloho. Estas duas províncias encontram-se na parte continental e a China investiu nestes sectores, da construção das centrais hidroeléctricas, para abastecimento de água potável e produção de electricidade”, exemplifica Cristina Abeso.

Depois de ter feito, ao longo dos últimos anos, um esforço considerável para dotar o país de condições estruturais dignas, através da construção de estradas, pontes, escolas, hospitais, portos, aeroportos e recintos desportivos, a Guiné Equatorial conta com as autoridades e as empresas chinesas – e, eventualmente, com uma mãozinha do Fórum de Macau – para implementar a segunda fase do plano Horizonte 2035, a agenda de desenvolvimento definida pelas autoridades de Malabo. 

“A segunda fase da implementação desta agenda tem por objectivo a industrialização do país, e os sectores principais a que o governo tem dado prioridade para atrair investimento estrangeiro, principalmente da China, são os sectores da agricultura, do fomento da agricultura, a promoção turística, a promoção da área das pescas e a transformação da indústria para os produtos nacionais”, assinala a delegada da Guiné Equatorial. 

Bata é uma paragem comum para os turistas que visitam o país

As áreas para as quais o Executivo de Malabo deverá procurar atrair a atenção do organismo e, indirectamente, do Fundo de Cooperação e Desenvolvimento entre a China e os Países de Língua Portuguesa não devem fugir muito às prioridades enunciadas no programa de desenvolvimento do país. Até ao momento, as autoridades da Guiné Equatorial ainda não candidataram nenhum projecto aos capitais do Fundo, mas Cristina Abeso tem plena confiança nas potencialidades do país. 

“Ainda não tenho na minha posse qualquer projecto que tenha sido elaborado pelo governo. A maior parte dos projectos que foram implementados ou que estão a ser implementados estão a passar pela via bilateral”, esclarece a responsável. “Mas, no que concerne ao Fundo, há uma mostra de interesse pela parte dos gestores do Fundo para acolher os projectos da Guiné Equatorial, porque concluíram que a Guiné Equatorial é um dos países que reúne as condições que o organismo impõe para poder implementar algum projecto. Basta o nosso governo elaborar os projectos com os parâmetros que o Fundo pede e submetê-los para análise.”

“A 6.ª Conferência Ministerial [do Fórum de Macau] realizou-se recentemente. E durante a Conferência, o Governo chinês prometeu várias medidas para fortalecer a sua cooperação com os Países de Língua Portuguesa, mas, na minha análise, depende de cada um dos países. São eles que vão eleger a área mais forte que cada um quer fortalecer com a China. Dentro destas 20 medidas que a China está a propor, cada um vai escolher a área que mais lhe interessa. Nem todos se vão centrar nos mesmos objectivos”, sublinha a representante da Guiné Equatorial.