São sete as modalidades em que Macau tem apostado nas suas Escolas de Desporto Juvenil, que contam com mais de 1600 jovens. O projecto, que arrancou em 2003, tem no wushu e no karaté os seus expoentes máximos, com resultados notórios no que toca à captação de talentos
Texto Vítor Rebelo
No desporto, o comprometimento de um atleta vai muito além de apenas participar nos treinos. Envolve uma dedicação total ao processo de aperfeiçoamento contínuo, respeito pelos planos de treino e um esforço constante para atingir os objectivos traçados, sejam eles pessoais ou colectivos.
Macau não é excepção a esta regra básica de formação e desenvolvimento de talentos e tem havido, nos últimos anos, a preocupação do Governo da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM) em criar as condições necessárias para assegurar as bases para o desenvolvimento dos atletas locais.
O Instituto do Desporto (ID) criou, em 2003, as Escolas de Desporto Juvenil de Macau, com vista à captação de talentos, começando, numa primeira fase, por seleccionar os jovens e depois permitir uma maior progressão aos talentos mais promissores nas diferentes modalidades. De acordo com os programas delineados, alguns meses após esta primeira fase, tem início o “treino mais sistemático”, com uma a três sessões semanais, consoante a modalidade.
O programa de formação de talentos começou, há 21 anos, com o futebol, seguindo-se, gradualmente, mais seis desportos: ténis (2006); ténis de mesa e wushu (2007); bowling (2011); karaté (2013); e squash (2016).
Actualmente, as escolas de formação desportiva contam com mais de 1650 atletas. No que diz respeito às diferentes modalidades, o futebol, como único desporto colectivo no programa de formação, é o que conta com um maior número de jovens, totalizando 680.
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“O futebol continua a ser um dos desportos mais populares e que atrai muitos jovens de Macau”, diz à Revista Macau Chao Kuok Wai, chefe do Departamento de Desenvolvimento Desportivo do ID.
Seguem-se, em número de alunos, o wushu, com 400 atletas; o ténis, com 181 jovens; o ténis de mesa, com 156; e o bowling, com 113 atletas. No karaté, contam-se 85 atletas, e outros 44 estão inscritos no squash.
Qualidade a crescer
O processo de captação realiza-se em Janeiro de cada ano, com candidatos de idades compreendidas entre os cinco e os 16 anos. A partir daí, um grupo de monitores selecciona os jovens com melhor aptidão para cada uma das modalidades e esses atletas seguem posteriormente para as Escolas de Desporto Juvenil. Além da participação do ID, estas escolas contam também com o apoio de cada uma das respectivas associações desportivas locais.
“Como os recintos para a prática desportiva não abundam em Macau, há a necessidade de, em alguns casos das nossas escolas, a formação, que é da nossa responsabilidade, ser feita juntamente com a actividade dessas associações, utilizando os mesmos treinadores”, explica Chao Kuok Wai.
As Escolas de Desporto Juvenil são consideradas “um sucesso”, adianta o mesmo responsável, “uma vez que têm permitido um crescimento da qualidade dos atletas das sete modalidades, alguns dos quais se têm notabilizado nas respectivas selecções em provas internacionais realizadas em Macau e além-fronteiras”.
O número de alunos actualmente inscritos nas Escolas de Desporto Juvenil manteve-se constante em relação ao ano anterior, “depois de vários anos de crescimento contínuo”, recorda Chao Kuok Wai. O crescimento observado nos últimos anos “atesta bem a aceitação que o programa tem tido junto da comunidade desportiva do território e, principalmente, junto dos jovens que pretendem iniciar-se na prática de uma das sete modalidades integradas no plano”, sublinha o dirigente.
De acordo com o mesmo responsável, o programa conta com 478 treinadores certificados pelo ID para darem aulas de formação. Como reflexo do trabalho que tem sido executado por toda a estrutura, cerca de 5 por cento dos atletas que começaram por ser seleccionados nos programas de captação de talentos acabam por integrar as equipas das diferentes modalidades, com vários a representar as cores de Macau em palcos nacionais e internacionais.
“O número pode até parecer pequeno, mas já é um sinal de que vale a pena apostar neste programa”, afirma Chao Kuok Wai, reforçando que “se alguns dos atletas que têm vindo a treinar através das nossas escolas puderem representar Macau em competições como os Jogos Asiáticos, por exemplo, isso será excelente e prova que o plano tem resultado e é para continuar”.
Wushu de olhos no futuro
De entre as modalidades abrangidas pelo programa do ID, feito em conjugação com os planos de treino das respectivas associações locais, os atletas de wushu de Macau há muito que demonstram um nível competitivo de topo – a par dos atletas do Interior da China –, tendo já alcançado bons resultados a nível internacional.
Esta arte marcial tem dado grandes alegrias ao desporto da RAEM, com medalhas conquistadas em competições de prestígio, como são os Jogos Asiáticos ou os Campeonatos do Mundo. Na última edição dos Jogos Asiáticos, em 2023, na capital da província chinesa de Zhejiang, Hangzhou, a delegação de Macau obteve, pela primeira vez na história, uma medalha de ouro no sector feminino. Em Setembro do ano passado, Li Yi venceu a prova feminina de wushu na variante changquan.
Macau já tinha conquistado o ouro no sector masculino, graças às actuações de Jia Rui, em 2010, e Huang Jun Hua, em 2018.
No Campeonato Mundial Júnior de Wushu do ano passado, que teve lugar na Indonésia, dois jovens, que estudam na Universidade Politécnica de Macau, Wong Weng Ian e Kuong Chi Hin, arrecadaram o ouro nas suas respectivas variantes. Os dois jovens – ainda com bastante margem de progressão dada as suas idades – são exemplo do trabalho que tem vindo a ser desenvolvido nas escolas de formação desportiva juvenis do território.
“A partir do momento em que foi criada a escola de formação sob a responsabilidade do ID, a modalidade conheceu um enorme crescimento”, diz o treinador principal do wushu, Iao Chon In, em entrevista à Revista Macau.
De um grupo inicial de apenas 20 jovens, a modalidade conta “actualmente com quatro centenas” de atletas, evidenciado “a importância e o desenvolvimento que o projecto tem conhecido”.
O técnico afirma que, nos últimos dez anos, têm sido treinados muitos atletas de elevado nível, “também porque o ID cedeu um recinto com excelentes condições e um generoso apoio financeiro para os atletas”.
No actual panorama, o wushu de Macau tem “todas as condições para formar atletas de excelência, desde jovens a adultos”, reforça Iao Chon In, que lembra a criação, também em 2007 e em paralelo com o programa introduzido pelo ID, da Escola de Wushu Juvenil de Macau, que se dedica à promoção e desenvolvimento da modalidade.
Metas a longo prazo
O karaté é outra modalidade que tem crescido a olhos vistos no território. Tal como no caso do wushu, também nesta arte marcial os atletas de Macau têm dado cartas em competições internacionais.
“Nos últimos anos, a Associação de Karaté-Do, Macau tem vindo a formar activamente jovens atletas com potencial, na esperança de continuar a lutar por bons resultados a nível internacional no futuro”, realçou o presidente, Che Kuong Im, em declarações à Revista Macau.
O dirigente assevera que, “a fim de recrutar mais jovens atletas, a associação, em conjunto com o ID, co-organizaram a Escola de Karaté-Do Juvenil de Macau, no sentido de elevar o nível etário dos alunos”. Tal foi feito “porque a maioria das competições internacionais para jovens começa aos 14 anos”, explica.
A Associação de Karaté-Do promoveu, nos últimos anos, várias competições abertas para jovens e torneios inter-escolas, que atraíram a participação de mais de 400 atletas. “A resposta foi tão entusiástica que a associação seleccionou alguns potenciais estagiários para integrarem a equipa de treino, integrada neste projecto a longo prazo instituído pelo ID”, atesta Che Kuong Im.
Em termos de resultados, o responsável destaca o Campeonato de Karaté da Ásia Oriental, no qual os atletas de Macau amealharam um total de 11 medalhas: uma de ouro, cinco de prata e cinco de bronze. “Estes resultados têm sido bastante satisfatórios e este sucesso encoraja mais jovens a treinar e os pais a apoiarem para que continuem a perseguir o sonho de se tornarem atletas com elevado potencial”, refere Che Kuong Im.
O talento nas raquetes
O ténis foi uma das primeiras modalidades a fazer parte do projecto das escolas de formação desportiva juvenis, tendo, desde então, conhecido um grande desenvolvimento, inclusive na sua própria academia, situada no Cotai. Fruto do trabalho de captação que tem sido desenvolvido pela estrutura ligada ao ténis, a academia recebe, anualmente, cerca de uma centena de praticantes no nível de iniciação.
Louise Ung, presidente da Associação de Ténis de Macau, refere que, após a selecção dos talentos, existe um plano específico para avançarem para as diferentes categorias, de forma a não queimar etapas na formação dos jovens atletas.
Os mais jovens começam na classe de iniciados e vão subindo gradualmente, passando pelos níveis avançado e elite, integrando depois a equipa de representantes de ténis de Macau, mediante aprovação num teste realizado anualmente, explica a dirigente.
Segundo a associação, existem sete turmas no escalão de iniciados, cada uma com cerca de 15 a 18 crianças, que treinam duas vezes por semana. No nível avançado, há seis turmas com cerca de dez a 12 atletas cada, que praticam duas vezes por semana.
A elite é a categoria de formação mais elevada da academia, dispondo de dois grupos de alunos, cada um com cerca de oito elementos, com três sessões de treino semanal. Todas as aulas da academia são financiadas pelo Governo da RAEM. Já o grupo que representa Macau em competições oficiais é composto por cerca de 25 jogadores.
A associação “está empenhada em formar jovens atletas que tenham o objectivo de se tornarem tenistas profissionais”, sublinha Louise Ung. De acordo com a dirigente, “tanto o Governo como a associação estão a proporcionar um bom ambiente e treino de qualidade aos jogadores”, com uma carga mais intensiva para os atletas que representam a selecção local.
“Temos participado em muitos torneios no Interior da China e em provas internacionais, na esperança de melhorar a nossa competitividade no ténis mundial”, avança Louise Ung.