Chama-se Legumes e Hortaliças Lei Kei Lda. e é um dos principais fornecedores de produtos hortícolas em Macau, servindo mais de 200 lojas, restaurantes e hotéis. Com a sua génese há quase 70 anos numa pequena banca de vegetais, o negócio familiar encontrou, mais recentemente, na marca de produtos pré-embalados Meng Kei uma nova área de crescimento
Texto Vitória Man Sok Wa
Fotografia Cheong Kam Ka
Mesmo entre consumidores de Macau que nunca tenham ouvido falar da empresa Legumes e Hortaliças Lei Kei Lda., é provável encontrar muitos que já tenham comprado alguns dos seus produtos, a começar pelos vegetais pré-embalados Meng Kei, disponíveis em diversos supermercados locais. No entanto, se esta é hoje uma das principais empresas distribuidoras do território no campo dos produtos hortícolas frescos, as suas raízes são humildes: remontam a uma pequena banca de comércio no Mercado de S. Domingos, estabelecida no final da década de 1950.
Lam Choi Chan explica que foi o seu pai que deu origem ao negócio. No entanto, ela própria foi rapidamente chamada para a actividade, com a morte do progenitor em 1967. A agora sexagenária tinha então apenas seis anos. “Não tive uma infância ou educação normais, mas isso transformou-me numa pessoa mais resiliente”, recorda, em declarações à Revista Macau.
Após quase três décadas de esforço, em 1995, o negócio passou de uma banca de mercado para uma loja na Rua do Almirante Sérgio. Era, assim, o início, de forma mais oficial, da empresa Lei Kei.
Em 2006, através de um concurso público, a empresa ganhou uma licença de venda por grosso de produtos hortícolas e começou a fornecer lojas, restaurantes e vários resorts de Macau. Actualmente, a Lei Kei conta com uma carteira de cerca de 200 clientes empresariais neste segmento.
Já o negócio de vegetais pré-embalados Meng Kei é mais recente, contando com quatro anos de existência, mas tem vindo a crescer de forma rápida. Hoje, no cômputo geral das receitas da Lei Kei, ombreia com o segmento das vendas por grosso para clientes empresariais.
Para o sucesso do negócio, tem sido essencial garantir a estabilidade ao nível do fornecimento de produtos e o controlo dos preços. Para além de colaborar com seis explorações agrícolas do Interior da China e várias empresas internacionais, a Lei Kei investiu também na criação, do lado de lá das Portas do Cerco, de áreas de cultivo próprias, bem como de uma unidade de produção hortícola hidropónica.
Jeff Chan, filho de Lam Choi Chan, é hoje um dos responsáveis por definir os novos caminhos da Lei Kei. O director, que é também especialista em produtos hortícolas, explica a aposta na produção hidropónica, um sistema de cultivo sem solo, em que as raízes ficam mergulhadas numa solução com os nutrientes necessários ao desenvolvimento rápido e saudável da planta: “As técnicas agrícolas na China desenvolveram-se muito; por isso, hoje em dia, muitas explorações usam esta técnica para cultivar espécies ocidentais”.
Segundo o responsável, a produção hortícola hidropónica possibilita um controlo ao detalhe de factores ambientais, como a temperatura ou a humidade, o que permite acelerar o crescimento das plantas sem comprometer a qualidade ou frescura do produto final. É por esta razão, acrescenta, que os legumes hidropónicos são particularmente adequados para saladas, sendo muito populares na cidade.
Fazer da crise uma oportunidade
Uma das decisões que marcou o rumo da Lei Kei foi a opção por um maior foco no mercado grossista a partir de 2017. No entanto, tal foi inicialmente resposta a um momento de dificuldade, já que, nesse ano, a então loja da empresa foi gravemente afectada pela passagem por Macau do Tufão Hato – a tempestade tropical mais forte a afectar o território em mais de meio século.
“Perdemos quase todos os produtos e equipamentos da loja na inundação causada pelo tufão, mas o negócio tinha de continuar”, recorda Lam Choi Chan. “Felizmente, nessa altura, já tínhamos uma banca grossista no Mercado Abastecedor Nam Yue, pelo que arranjei como solução transferir todo o negócio para esse local e expandir a actividade.”
Com o surgimento da pandemia da COVID-19, a Lei Kei enfrentou um novo desafio, muito por culpa da quebra ao nível do turismo e do consumo associado, o que levou a reduções no volume de negócios. “No entanto, temos cerca de 300 trabalhadores na empresa, todos eles com família, e, por isso, tínhamos de encontrar uma solução”, explica Jeff Chan.
“Vi que, nessa altura, a oferta de legumes em Macau era inconstante, devido às restrições ao nível da importação de produtos, e muitas pessoas evitavam ir a locais com muita gente, especialmente aos mercados. Entretanto, muitos amigos ligavam-me a pedir legumes frescos. Assim, surgiu a ideia de criar um negócio inovador, acessível aos consumidores de retalho, além do nosso negócio grossista, que se dirige a lojas e empresas”, acrescenta.
Nasceu então, em 2020, a marca Meng Kei, de vegetais pré-embalados e destinados ao consumidor final. Todos os produtos podem ser encomendados de forma digital, incluindo através das páginas electrónicas de diversas cadeias de supermercados ou de plataformas de entrega de comida. Isto além de estarem disponíveis em mais de 40 lojas físicas em Macau.
Jeff Chan explica que os produtos da Meng Kei são dirigidos em especial a consumidores mais sofisticados e de faixas etárias mais jovens, incluindo expatriados a residir em Macau. “Por exemplo, para além de legumes tradicionais chineses, como a couve-flor chinesa ou a alface chinesa, vegetais mais comuns para saladas e pratos ocidentais que normalmente só estão disponíveis nos hotéis – como misturas de verduras, o manjericão, a salsa, o alecrim e a hortelã – podem agora ser comprados nos supermercados através da Meng Kei”, diz o responsável. “Lançámos também pacotes de ingredientes para sopas chinesas, com doses para uma a duas pessoas.”
Em poucos anos, a Meng Kei tornou-se numa marca muito procurada pelas famílias locais, diz Jeff Chan. “Como a nossa empresa Lei Kei já fornecia produtos específicos a hotéis e restaurantes, temos fontes de importação e quotas suficientes para manter os custos sob controlo, pelo que podemos vender este tipo de produto aos consumidores finais a um preço competitivo.”
Em paralelo, através de Jeff Chan, foi aberto um outro segmento de negócio, na área da restauração, com a inauguração, em 2022, do primeiro franchise em Macau da cadeia internacional PizzaExpress. Sem surpresa, os produtos da Lei Kei ajudam a compor o menu.
Esforço que compensa
Quase sete décadas após a venda dos primeiros vegetais, a empresa familiar Lei Kei vai de vento em popa, muito devido à visão inovadora de Jeff Chan e da sua mãe. Mas o próprio fundador do negócio já demonstrava essa característica. “O meu avô não vendia os legumes mais procurados, mas sim os mais difíceis de preparar, como o gengibre”, aponta Jeff Chan.
A resiliência é outra marca da empresa. “A minha infância foi muito difícil. O meu pai morreu quando eu tinha seis anos, tive de ajudar a minha família a gerir as contas do negócio desde os oito anos”, recorda Lam Choi Chan. “Aos 13 anos, tive de abandonar os estudos e tomar conta de tudo, incluindo a contabilidade, a importação, a venda e a entrega. Mas esta experiência tornou-me uma pessoa muito forte, o que é crucial para este negócio e para a vida.”
A atitude da mãe acabou por marcar Jeff Chan, reconhece o próprio. “Quando era miúdo, ajudava a minha mãe na banca do mercado depois da escola, cultivando os meus conhecimentos e a minha ligação à agricultura, à vida saudável e à ecologia”, conta. “A minha mãe é o meu modelo de vida, é uma pessoa muito trabalhadora e, mesmo hoje, nunca descansa. Neste trabalho, temos de acordar muito cedo e acabar tarde todos os dias. Não podemos descansar nos feriados, porque os consumidores precisam de legumes frescos todos os dias.”
O agora director da Lei Kei sublinha as lições que recebeu da mãe: “Ela sempre me ensinou que, sem esforço, não há resultados, e que temos de trabalhar o mais que pudermos, concentrando-nos em terminar o trabalho e resolver os problemas desse dia”.
Apesar do conhecimento feito de prática, Jeff Chan apostou também nos estudos para ajudar a elevar o negócio familiar a um novo patamar. Após ter concluído um mestrado em gestão no Reino Unido, assumiu a direcção da Lei Kei em 2011.
“Desde criança, vi a minha mãe a trabalhar arduamente para, sozinha, me criar a mim e à minha irmã. Por isso, sempre quis ajudá-la”, diz o responsável.
A combinação da sua experiência no terreno com os seus conhecimentos de gestão tem provado ser uma fórmula vencedora, permitindo que a empresa tenha vindo gradualmente a adoptar modelos de operação mais sistematizados e eficientes. Ora ajudando como camionista a entregar produtos a clientes, ora como vendedor, Jeff Chan acabou por encontrar, no seu dia-a-dia, várias áreas que podiam ser alvo de melhoria.
“Anteriormente, só tínhamos camiões normais e usávamos cestos de bambu, e muito do trabalho era feito à mão”, explica o responsável. “Descobrimos alguns problemas relacionados com este método tradicional, pois os cestos de bambu magoavam facilmente as mãos dos nossos colegas e a operação podia ser mais organizada. Assim, para melhorar, passo a passo, investimos em camiões refrigerados, cestos de plástico, equipamento de embalagem e num sistema informático.”
Com operações modernas, produtos e serviços de qualidade e uma reputação que se estende por três gerações, os prémios têm vindo a suceder-se. Aqui, destacam-se as distinções como fornecedor de qualidade, atribuídas à empresa por resorts integrados locais.
Um dos focos da Lei Kei é também contribuir para o desenvolvimento da comunidade local. Tal inclui o apoio a instituições de solidariedade social, bem como a promoção da protecção ambiental, trabalhos em que Jeff Chan está bastante envolvido.
A empresa tem uma parceria com a representação local da Oxfam, uma das maiores organizações de solidariedade do mundo. Esta traduz-se na doação semanal de centenas de pacotes de legumes, destinados a pessoas desfavorecidas.
Além disso, a Lei Kei recruta também, através da Associação de Reabilitação “Fu Hong” de Macau, indivíduos com doença mental em reabilitação, para embalar legumes e proceder a entregas.
Outra área em que a empresa está envolvida é a protecção ambiental. Em 2019, a Lei Kei lançou dois produtos – sacos biodegradáveis e canetas –, ambos feitos a partir de resíduos vegetais recolhidos das operações da empresa. As receitas obtidas com as vendas revertem na totalidade para instituições de solidariedade.