Fim das restrições à circulação e reabertura das fronteiras a turistas do exterior dá novo ímpeto à economia local. Macau poderá ser um dos destinos que mais beneficia do regresso dos turistas do Interior da China
Texto Tiago Azevedo
Em Macau, o ambiente é de entusiasmo e alegria. Ruas cheias, hotéis com lotação praticamente esgotada e restaurantes a abarrotar marcaram o início do ano no território, com os comerciantes optimistas com a afluência de turistas durante as festividades do Ano Novo Lunar.
Após quase três anos de restrições ligadas à COVID-19, Macau entrou num novo ciclo e há esperança de que a normalização pós-pandemia traga novo fôlego à economia local.
A 8 de Janeiro, Macau reabriu as fronteiras a turistas de todo o mundo, colocando um fim à maior parte das restrições à circulação de pessoas, que estavam em vigor desde o início de 2020.
No início de Fevereiro deste ano, foram também aliviadas todas as medidas relacionadas com o fluxo de visitantes entre o Interior da China, Macau e Hong Kong. Após o relaxamento das medidas, o território recebeu a 6 de Fevereiro as primeiras excursões do Interior da China desde o início da pandemia.
As novas medidas de “retoma total do movimento de pessoas” entre o Interior da China, Hong Kong e Macau “irão impulsionar ainda mais a recuperação da indústria turística” da Região Administrativa Especial de Macau (RAEM), afirmaram as autoridades locais.
O relaxamento das políticas locais foi alinhado com a decisão do Governo Central em mudar a administração das medidas contra a COVID-19 de classe A para classe B, marcando o fim – a nível nacional – da política dinâmica de COVID-Zero.
“De acordo com os dados disponíveis, Macau e Hong Kong foram considerados os locais mais atractivos para os turistas do Interior da China”, realça Penny Wan Yim King, académica do Instituto de Formação Turística de Macau (IFTM). Macau, sublinha, é “particularmente atractivo” para turistas do Interior da China, especialmente tendo em conta os “grandes esforços” promocionais da Direcção dos Serviços de Turismo (DST) de Macau.
Henry Lei Chun Kwok, professor da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade de Macau (UM), concorda que Macau irá provavelmente ser a “cidade que mais beneficiará com a reabertura do turismo chinês”, sobretudo tendo em consideração que alguns países ainda impõem restrições aos turistas oriundos do Interior da China.
Apoio à recuperação económica
Em Fevereiro, o Chefe do Executivo referiu que, passados três anos desde a ocorrência da pandemia, a economia de Macau apresenta agora “uma tendência de recuperação acelerada”, com “múltiplos factores positivos a surgir” e o número de visitantes que chega a Macau a crescer. “Tudo isto pode injectar uma nova dinâmica em todos os sectores e aumentar a confiança da sociedade no desenvolvimento económico”, salientou.
Ho Iat Seng disse também que o Governo da RAEM continuará “empenhado na promoção da recuperação económica e na promoção acelerada do desenvolvimento diversificado da economia”.
As autoridades irão procurar “aproveitar melhor as novas oportunidades de desenvolvimento da indústria de turismo e lazer integrado, criando uma cidade diversificada que abrange os mais ricos e variados componentes”, nomeadamente nas áreas do “entretenimento, cultura e desporto, tratamento médico e cuidados de saúde, experiências tecnológicas e eventos de alta notoriedade”.
“Acredito que, em 2023, Macau será capaz de receber cerca de 40 a 50 por cento dos turistas que recebia antes da pandemia”
PENNY WAN YIM KING
ACADÉMICA DO INSTITUTO DE FORMAÇÃO TURÍSTICA DE MACAU
No início de Fevereiro, a DST apresentou planos de promoção e ofertas turísticas, trabalhando em conjunto com os operadores turísticos locais para explorar o mercado do Interior da China e mercados internacionais, com o objectivo de acelerar a recuperação do sector e da economia de Macau.
Graças à série de políticas favoráveis para Macau e à normalização gradual da passagem fronteiriça, o número de visitantes “tem vindo a aumentar de forma estável, a recuperação da economia local e do turismo estão a registar progressos na direcção certa”, referiu o Governo da RAEM. Naquela que foi a primeira semana dourada depois do relaxamento das medidas antiepidémicas para entrada em Macau, o número de visitantes “superou as expectativas”, de acordo com as autoridades.
Nos sete dias de feriado do Ano Novo Lunar no Interior da China, entre 21 e 27 de Janeiro, Macau recebeu um total de 451 mil visitantes, um aumento de 297,0 por cento em comparação com o período homólogo do ano de 2022. O fluxo de turistas este ano representou cerca de 38 por cento do total registado em 2019, o ano antes da pandemia.
Do total de turistas durante o Ano Novo Lunar em Janeiro, 265 mil vieram do Interior da China e 165 mil de Hong Kong. No terceiro dia da festividade, dia 24 de Janeiro, o número de visitantes ultrapassou os 90 mil, marcando um novo recorde diário desde o início da pandemia.
Durante o período festivo, a taxa média da ocupação hoteleira atingiu os 85,7 por cento, segundo dados da DST. O valor representou um aumento de 22,4 pontos percentuais em comparação com a semana dourada do Ano Novo Lunar de 2022.
De acordo com o Governo da RAEM, os “bons resultados” atingidos durante a semana dourada deste ano “mostraram a vontade dos visitantes em escolher Macau” para experienciar as ofertas ligadas à iniciativa “turismo +” da cidade, promovida pelo Governo em parceria com os operadores turísticos locais.
Localização estratégica
“O Governo e a DST têm envidado grandes esforços para promover Macau, realizando várias actividades que procuraram mostrar a cidade de forma atractiva, como por exemplo a criação da zona pedonal na San Ma Lo, algo fresco, novo e atractivo para turistas e moradores”, diz Penny Wan à Revista Macau.
Além disso, acrescenta a académica, Macau está “estrategicamente localizada” na região da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, tornando a cidade “muito acessível para cidadãos do Interior da China, especialmente para os da província de Guangdong”.
A abertura de Macau antes do período do Ano Novo Lunar foi o “momento ideal” para encorajar o regresso de turistas. “O Ano Novo Lunar demonstrou o desejo dos habitantes do Interior da China e de Hong Kong em visitar Macau, um local que a maioria deles não visitava há dois ou três anos. A cidade é um destino atractivo por ter tudo o que é necessário para satisfazer as diversas necessidades dos visitantes”, explica Penny Wan.
Para o professor Henry Lei, o sector do turismo de Macau “recuperou de forma salutar” durante o Ano Novo Lunar, o que é evidenciado também pelo aumento das receitas do sector do jogo durante o mês de Janeiro, cujo valor representou cerca de 46,43 por cento das receitas registadas em Janeiro de 2019. “Acredito que Macau seja capaz de atrair mais visitantes em excursões, bem como de outras províncias e cidades [do Interior da China], o que irá continuar a apoiar a forte recuperação do sector” do turismo de Macau, refere o académico em comentários à Revista Macau.
De acordo com o docente, a indústria do turismo é o sector “mais importante do território”, especialmente numa altura em que a RAEM está a atravessar um período de “transformação económica”. “A recuperação do sector do turismo contribui para a criação de novas oportunidades de emprego, gerando receitas para a economia. A curto prazo, esta situação deverá continuar”, afirma Henry Lei.
E acrescenta: “Se o sector do turismo continuar a recuperar, não deverá ser difícil que a receita bruta do jogo em 2023 atinja os 130 mil milhões de patacas, como previso pelo Governo”. Além disso, tendo em consideração o valor do produto interno bruto (PIB) no ano passado, “Macau poderá registar este ano uma recuperação de dois dígitos no PIB”, sendo até possível que o “PIB de 2023 seja maior do que em 2021”, diz Henry Lei.
Rejuvenescer a oferta
Investigadores da UM estimam que a economia do território cresça entre 20,5 por cento e 44,1 por cento este ano, com uma subida mais acentuada no segundo semestre. De acordo com as previsões do Centro de Estudos de Macau e do Departamento de Economia da UM, as receitas finais do Governo da RAEM deverão atingir entre 55,4 mil milhões e 66,1 mil milhões de patacas em 2023.
Segundo Penny Wan, Macau deverá conseguir atrair um “fluxo contínuo de visitantes”, se “conseguir manter a imagem de um destino seguro e oferecer pacotes de promoção inovadores e direccionados a diferentes segmentos”. No início, a atenção deverá estar focada nos visitantes de Hong Kong e do Interior da China, seguindo-se os turistas de países asiáticos e outros mercados internacionais.
“Acredito que, em 2023, Macau será capaz de receber cerca de 40 a 50 por cento dos turistas que recebia antes da pandemia”, refere a académica do IFTM.
“Macau poderá registar este ano uma recuperação de dois dígitos no PIB”
HENRY LEI CHUN KWOK
PROFESSOR DA FACULDADE DE ECONOMIA E GESTÃO DA UNIVERSIDADE DE MACAU
Nesse sentido, sugere Penny Wan, a criação de pacotes promocionais “inovadores” e direccionados a grupos-alvo específicos pode ser uma mais-valia para atrair visitantes do exterior, especialmente famílias e turistas mais jovens. “Há um número crescente de turistas nestes segmentos que visitam Macau, portanto é preciso investigar mais para determinar o que poderá ser mais atractivo para estes consumidores”, sublinha.
O retorno dos turistas a Macau poderá trazer também alguns desafios, alerta a académica, realçando a necessidade de as autoridades colaborarem com a indústria do turismo para desenvolver novas ofertas e criar mais atracções para dispersar os turistas para outras zonas da cidade.