Leong Heng Teng

Macau: uma paixão para a vida

Leong Heng Teng, antigo porta-voz do Conselho Executivo
Leong Heng Teng vive a cidade com uma paixão imensa. É uma Macau que conhece como poucos e que adora percorrer. Os bairros antigos merecem-lhe uma atenção especial, não só porque, para ele, são a alma da cidade, mas também porque é nestas zonas que se coloca ao serviço dos outros, num apoio incansável à comunidade

Texto Tony Lai
Fotografia Cheong Kam Ka

Leong Heng Teng é um rosto bem conhecido da esfera pública. Alguns associam-no aos cargos que desempenhou na Administração de Macau – como o de porta-voz do Conselho Executivo, onde durante dez anos anunciou e explicou as novas políticas do Governo. Outros reconhecem-no pelo seu papel como elo de ligação entre as autoridades e a comunidade.

Já entre os amigos de infância, Leong Heng Teng destaca-se como um bom companheiro e um habilidoso jogador de basquetebol. Mas qual é, afinal, a sua verdadeira paixão? Ajudar a comunidade e revitalizar os bairros antigos da cidade é o que salta à vista na conversa com a Revista Macau. 


Onde tudo começou

Sempre que Leong Heng Teng chega a San Kio, uma zona antiga da península de Macau, é quase impossível não encontrar alguém conhecido. Não só é presidente da Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores do Bairro de San Kio, como também foi aqui que nasceu e cresceu. San Kio, descreve, é um local “onde pessoas de diferentes estilos de vida podem encontrar o seu espaço”.

Grande parte da sua infância foi passada no campo de basquetebol do bairro, ao lado do Cinema Alegria, um terreno fértil para vários jogadores locais conhecidos, incluindo o próprio, que chegou a receber um convite para jogar no campeonato de Hong Kong. “Tecnicamente, não era um campo de basquetebol: apenas um pedaço de terra com um cesto de basquetebol”, lembra Leong Heng Teng, agora com 75 anos.

Algum tempo depois, a Associação de Mútuo Auxílio dos Moradores do Bairro de San Kio, recém-criada à época, mobilizou recursos para construir um campo de basquetebol de dimensões reais para crianças e adolescentes.

Foram essas experiências de infância que inspiraram Leong Heng Teng a envolver-se no serviço comunitário. “Beneficiei muito da ajuda das pessoas do meu bairro quando era jovem”, sublinha.


Regresso à era dourada

Após terminar a escola secundária, Leong Heng Teng trabalhou como professor, ao mesmo tempo que se dedicava a ajudar a comunidade. A partir das décadas de 1980 e 1990 tornou-se mais activo em cargos públicos, tendo tido uma carreira de 19 anos como deputado na Assembleia Legislativa, em representação da União Geral das Associações dos Moradores de Macau (UGAMM), uma das maiores associações tradicionais da cidade.

“Além de atender às necessidades dos idosos, crianças e outros, uma das principais tarefas do trabalho comunitário é trazer prosperidade aos bairros”, explica. Desde a transferência de Administração, em 1999, tem trabalhado com a UGAMM para procurar formas de injectar um novo impulso em diferentes bairros tradicionais da península de Macau – um deles é a zona entre a Rua Cinco de Outubro e a Travessa do Armazém Velho.

Perante o clima vivido nos últimos anos, foi com bastante boa-vontade e esforço que se planearam novas iniciativas para o bairro, como, por exemplo, a criação de um mercado nocturno perto do Templo Hong Kung, na Rua de Cinco de Outubro. Um trabalho que já começou a dar frutos: “A maioria das lojas da Travessa do Armazém Velho já está operacional, com excepção de 20 a 30 por cento, em comparação com os 70 por cento no passado”.


Mútuo entendimento

Uma cena cultural vibrante é agora evidente na zona da Igreja de São Lázaro, com uma grande variedade de lojas, desde espaços que comercializam roupas vintage até oficinas de artesanato. Mas o cenário era muito diferente quando Leong Heng Teng e outras pessoas com as mesmas convicções apontaram a mira ao bairro há cerca de 20 anos. “Era uma área muito pouco animada e até algo apática”, recorda.

Mas Leong Heng Teng e os seus parceiros rapidamente perceberam o potencial cultural do bairro, estabelecendo um arquivo de filmes e transformando uma antiga residência num espaço dedicado às artes. O projecto deu um salto significativo com o nascimento, em 2008, da 10 Fantasia, uma incubadora para as indústrias culturais. A mansão amarela de estilo português, que fica mesmo ao lado do Albergue da Santa Casa da Misericórdia, já expôs várias obras de artistas e criativos locais e acolheu, ao longo dos anos, todo o tipo de cursos artísticos, como a escrita de roteiros de cinema ou a fotografia.

“Aos poucos, mostrámos que este tipo de eventos pode trazer benefícios para a comunidade. É preciso tempo e compreensão mútua para se conseguir levar algo diferente”, refere Leong Heng Teng.


De volta às raízes

Ao terminar as suas funções de porta-voz do Conselho Executivo e de presidente do então Fundo das Indústrias Culturais, Leong Heng Teng não ficou muito tempo de braços cruzados e dedicou-se imediatamente a outro projecto: a Associação de Promoção da Construção Comunitária de Macau, através da qual um pequeno grupo de urbanistas, arquitectos e jovens locais percorre vários pontos da cidade para ver o que pode fazer para ajudar a desenvolver cada um.

Uma pequena povoação, entre muros, junto às Ruínas de São Paulo, captou a sua atenção. Chama-se Pátio do Espinho e costumava ser a residência de católicos japoneses em Macau há cerca de quatro séculos, antes de os moradores locais começarem a mudar-se para aquela área. A família da mulher de Leong Heng Teng foi uma das que ali se fixou. “A minha esposa nasceu no Pátio do Espinho e cheguei a frequentar a zona durante o Ano Novo Chinês e outros dias importantes”, conta. No entanto, o local foi aos poucos caindo no esquecimento do resto da comunidade.

Devido aos esforços do grupo nos trabalhos de restauração de estradas e organização de actividades, um novo fôlego e uma sensação de vitalidade começaram a renascer no Pátio do Espinho. Leong Heng Teng não tem dúvidas: “Cada bairro de Macau é tão diferente e único: cada um tem a sua própria alma”.