São mais de 80 anos de história, com altos e baixos, mas sempre com a mesma dedicação: a de criar sabores únicos com receitas tradicionais. Com origens modestas numa banca de produtos alimentares, a Mok Yi Kei cresceu e é hoje uma marca de referência na Vila da Taipa, oferecendo algumas das mais afamadas iguarias locais
Texto Tony Lai
São várias as memórias que as pessoas têm da Mok Yi Kei: há quem recorde os primeiros tempos do espaço, enquanto banca de venda de produtos alimentares; há quem se lembre de por lá passar em criança, nos passeios de fim-de-semana, para comer gelatina de ágar-ágar ou beber sumos depois de andar de bicicleta; outros recordam as multidões de turistas que se deliciavam com o gelado de durião.
Passados 80 anos nas mãos de várias gerações, o espaço é hoje uma das lojas mais afamadas da Vila da Taipa. Liang Kui Zhi, que assume a gerência, diz que a história da Mok Yi Kei é feita de muitas alegrias, mas também de imensas lágrimas. “O que eu mais quero agora é dar continuidade ao legado passado pelos meus sogros”, conta a responsável, agora com 63 anos.
Situada na Rua do Cunha, um dos pontos de referência para residentes e visitantes no que toca a iguarias locais, a espaçosa Mok Yi Kei (também conhecida como Mok Yee Kei) desempenha um papel fundamental no esforço de promoção da Vila da Taipa como um destino turístico. E são vários os produtos que fazem as delícias de quem visita a loja de letreiros brilhantes: as gelatinas de ágar-ágar (feitas a partir de algas marinhas) com vários sabores, os gelados de durião, a serradura e as sopas doces tradicionais chinesas, como o sagu de manga e pomelo.
Todas as iguarias da Mok Yi Kei são preparadas diariamente por Liang e pelos outros funcionários. A sua qualidade é reconhecida internacionalmente, tendo-lhes valido, desde 2016, uma menção anual no conceituado Guia Michelin.
“Eu ousaria dizer que não se consegue provar em nenhum outro lugar em Macau e Hong Kong uma gelatina de ágar-ágar como a nossa, que é suave, aveludada e refrescantemente doce”, defende Liang.
A loja expandiu com o passar dos anos e cresceu até mais do que os sogros de Liang alguma vez esperaram. Fundada em 1938, a Mok Yi Kei era originalmente uma banca de venda de produtos alimentares, localizada nas proximidades do cruzamento entre a actual Rua do Cunha e a Rua do Regedor, tais como muitas outras bancas de vendilhões.
A loja, baptizada com o nome do sogro de Liang, Mok Yi, conheceu outras localizações à medida que a zona se foi desenvolvendo, antes de assentar no centro da Vila da Taipa, há mais de duas décadas. “O meu sogro contou-nos que [o negócio e a vida deles] foram difíceis no início. Eles eram tão pobres que até tiveram que usar cartão como combustível para fazer as gelatinas de ágar-ágar”, realça Liang.
Constante evolução
A vida de Liang, que migrou do Interior da China para Macau, cruzou-se com a Mok Yi Kei quando trabalhou como funcionária a tempo parcial na loja. “Eu já tinha trabalhado em muitos outros locais em Macau para ganhar dinheiro suficiente para sustentar [os meus três irmãos mais novos]”, conta a agora gerente. Mas o gosto pelo trabalho na Mok Yi Kei fez com que criasse raízes e o seu empenho e a sua resiliência ganharam a aprovação dos fundadores da loja, que se tornaram seus sogros.
Depois de cinco anos a trabalhar na Mok Yi Kei, Liang casou-se com Mok Pem Kuen, um dos filhos de Mok Yi. “Aprendi os segredos do negócio, como fazer a gelatina de ágar-ágar e outras iguarias, observando e seguindo o que os meus sogros faziam”, afirma. “Eles sempre foram muito dedicados à família e ao negócio e foi com eles que aprendemos tudo sobre a operação da Mok Yi Kei.”
“Eu ousaria dizer que não se consegue provar em nenhum outro lugar em Macau e Hong Kong uma gelatina de ágar-ágar como a nossa”
LIANG KUI ZHI
GERENTE DA MOK YI KEI
Liang e o seu marido assumiram o dia-a-dia da Mok Yi Kei há mais de 20 anos. À frente da operação, Liang tem-se dedicado a aprimorar e modernizar as receitas. Por exemplo, enquanto a receita original da famosa serradura usa apenas um tipo de biscoito, Liang tem experimentado uma mistura de biscoitos para realçar o sabor e a textura da sobremesa. “As receitas dos nossos produtos eram muito simples. No passado, não existia tanta riqueza, então qualquer iguaria ou sobremesa tinha um gosto bom”, explica. Mas hoje a procura é diferente e mais exigente, obrigando a Mok Yi Kei a inovar nas suas receitas de forma a atrair mais clientes.
A loja actualiza regularmente a oferta e o menu, em resposta às mudanças no mercado. Quando o negócio foi entregue a Lian, a Mok Yi Kei ainda tinha à venda outros produtos tradicionais, como as bolas de peixe e o macarrão com salsichas, pois os principais clientes eram os moradores do bairro e os estudantes das escolas adjacentes. No entanto, com o desenvolvimento da economia, impulsionado pelo sector do turismo nas últimas duas décadas, a loja começou a atrair mais turistas, particularmente depois da abertura de novos empreendimentos no Cotai. “Com esta evolução, tivemos que dedicar o nosso tempo e recursos à criação de produtos que são procurados pelos nossos principais clientes”, explica a gerente.
Família alargada
Estimulada pela expansão do turismo, a Mok Yi Kei conseguia vender milhares de gelatinas e gelados diariamente antes da pandemia da COVID-19. “Eu só dormia três a quatro horas por dia, ou passava mesmo alguns dias sem dormir, quando o negócio estava a prosperar, quando o turismo local começou a crescer e enquanto ainda não havia muita oferta deste tipo de iguarias nesta zona”, recorda Liang. Mas a crise de saúde pública transformou completamente o cenário empresarial local, com o volume de vendas a cair devido à quebra no número de turistas na cidade.
“Perdemos vários milhões [de patacas] no início da pandemia. O negócio melhorou no ano passado, mas continua com altos e baixos devido à volatilidade da pandemia na cidade e na região”, diz Liang. Mas não há obstáculo que não possa ser ultrapassado, refere, acrescentando que a Mok Yi Kei planeia criar novos produtos e diversificar a oferta, na esperança de atrair mais clientes.
Desde que assumiu a responsabilidade pelo negócio, Liang reconhece que existe uma grande pressão, especialmente no sentido de não decepcionar os sogros. “O meu marido tem outros irmãos e não é o mais velho, mas os meus sogros passaram esta loja para nós”, sublinha.
No entanto, Liang não se arrepende de ter ficado com as rédeas da Mok Yi Kei. “Não sei porquê, mas tenho sido assim a vida toda: quando algo me é entregue ou me pedem para fazer algo, tento sempre dar o melhor que posso”, sublinha. “Nós não temos filhos, portanto, até uma certa medida, considero os clientes como parte da nossa família – mantive contacto e tornei-me amiga de muitos deles. Fico feliz quando eles estão satisfeitos com os produtos que oferecemos.”