“Li Bai – A Via do Imortal” combina a biografia e obra deste poeta chinês, numa publicação que visa aproximar o mundo sino-lusófono
Texto Tiago Azevedo
Fotografia Cheong Kam Ka
A publicação de obras chinesas traduzidas para português pode assumir um papel importante para fomentar o interesse pela poesia chinesa. Quem o defende é António da Amada Izidro, autor de Macau, que publicou recentemente “Li Bai – A Via do Imortal”, uma obra que desvenda a vida do poeta chinês e disponibiliza em língua portuguesa alguns dos seus poemas.
O livro foi lançado em Março no âmbito da segunda edição da Semana da Cultura Chinesa, promovida pelo jornal Hoje Macau. A obra sobre o famoso poeta da dinastia Tang inclui também notas que contextualizam os poemas e oferecem referências históricas e mitológicas.
Em entrevista à Revista Macau, António Izidro diz acreditar que o acesso à poesia chinesa traduzida em língua portuguesa é ainda limitado, ao contrário do que acontece em sentido oposto.
“A China está muito bem apetrechada de quadros bilingues de quase todos os idiomas mais falados no mundo”, começa por explicar. Se os leitores chineses têm facilidade na leitura de obras não chinesas, incluindo de autores portugueses, já os leitores portugueses têm pouca oferta de literatura chinesa, segundo o autor e tradutor.
“Não conheço a formação profissional e não profissional neste campo em Portugal e nos países de língua portuguesa, pelo que a questão se coloca não apenas no interesse, mas também no conhecimento que leitores portugueses possam ter da língua chinesa que lhes permita aceder directamente à leitura da poesia chinesa. Não sendo este o caso, julgo que a oferta editorial de obras traduzidas em língua portuguesa pode assumir um papel relevante no fomento do gosto e do interesse pela poesia chinesa”, afirma.
A obra que faltava
Fascinado pela poesia chinesa, António Izidro embarcou neste projecto precisamente porque sentiu uma falta de oferta deste tipo de literatura no mercado. A missão deste intérprete-tradutor com vasta experiência no domínio das línguas chinesa e portuguesa foi “apresentar um trabalho que permitisse beirar o mais possível a candura dos versos de Li Bai e desenterrar os aspectos mais relevantes da vida do poeta”.
A preparação do livro incluiu, numa primeira fase, uma pesquisa histórica e cultural no terreno e recolha de informação, e, posteriormente, uma “tradução literal palavra a palavra, expressão a expressão”.
“Em terceiro lugar, reescrevo tudo de modo a fazer sentido em português, sem que perca com isso o seu sentido original. Finalmente, procuro sentir o que terá sentido o poeta e volto a reescrever”, explica.
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António Izidro salienta que a tradução do chinês clássico apresenta diversos desafios. “O livro procura estabelecer a paridade das ideias, sentimentos, emoções e de tantos outros estados de espírito do poeta com o fazer sentido na língua portuguesa, e apresentar uma tradução onde o realismo pudesse perfilar ao lado da estética, sem defraudar o autor”, refere.
Tratamento virtual
Só o processo de tradução do material seleccionado demorou cerca de um ano. O autor acredita que a contextualização que acompanha os poemas é essencial ao leitor para que este compreenda os cenários vividos pelo poeta – “um tratamento virtual que se dá à leitura poética”, como afirma.
“É preciso contextualizar, não só em termos históricos, geográficos, mas também as circunstâncias, os sentimentos, as ideias que os poemas versam. Afinal, o que levava o autor a escrever? Eram o sonho pessoal, as peregrinações nas montanhas, as amizades, os infortúnios, os lugares históricos, as guerras fratricidas, a saudade, a melancolia, a beleza da natureza… e a lista não pára. O livro tenta ‘ressuscitar’ aquilo que foram episódios distintos e ambientados, inseridos na vida do poeta Li Bai”, explica.
António Izidro justifica a escolha do poeta com o facto de ele ser, no seu entender, o mais facetado dos compositores chineses da sua geração.
“Deixou composições de temas tão abrangentes que não se encontram noutros poetas: misticismo, erotismo, espiritualidade, poemas melíferos, ácidos, sentimentais, românticos, idílicos, tudo pincelado com a mesma originalidade e riqueza de estilo. O filme pessoal que Li Bai tinha pensado apresentar à história, contracenando figuras heróicas do passado, ruiu na estratégia, no idealismo que lhe parecia verosímil e no não aderir aos esquemas corruptos que grassavam na corte Tang, no curto tempo em que lá permaneceu”, conclui.