Moçambicanos em Macau

Macau e Moçambique há 30 anos na mesma página

O ano em que sopra 30 velas é, para a Associação dos Amigos de Moçambique, fundamental em termos de renovação. A associação quer, no entanto, continuar a ser um interlocutor de excelência em termos culturais e não descarta mesmo novas responsabilidades pela mão do IPIM e do Fórum de Macau

Texto Marco Carvalho

A Associação dos Amigos de Moçambique comemora 30 anos em Novembro e quer assinalar a efeméride com um novo ciclo de cinema e uma palestra sobre a literatura moçambicana, mas a amplitude do programa festivo deverá estar, em última instância, dependente da evolução da pandemia da COVID-19. 

Ao longo das três últimas décadas, a associação distinguiu-se pela divulgação em Macau da cultura e das artes de Moçambique, com a organização de debates, exposições e quatro ciclos de cinema. Para além de dar a conhecer os maiores sucessos da Sétima Arte moçambicana ao público do território, a aposta no cinema trouxe até Macau os mais conceituados realizadores do país e deve voltar a pontificar entre as apostas da colectividade no ano em que sopra 30 velas.

“Vamos ver se conseguimos organizar um ciclo de cinema e um convívio entre os associados, em que possamos apresentar dança e música. Não sei se vamos conseguir organizar um ou outro workshop sobre a nossa literatura. Ainda estamos a pensar. Já não temos muito tempo para isso, mas vamos ver se conseguimos organizar alguma coisa até Setembro”, adianta a presidente da Associação dos Amigos de Moçambique, Helena Brandão, à Revista Macau.


“Nós tentamos sempre mostrar aquilo que Moçambique tem para oferecer, tanto na vertente económica, como cultural”

HELENA BRANDÃO
PRESIDENTE DA ASSOCIAÇÃO DOS AMIGOS DE MOÇAMBIQUE

Para a organização – a mais antiga das agremiações de matriz africana do território –, o ano é inegavelmente de celebração, mas também de uma indispensável renovação. A Associação dos Amigos de Moçambique perdeu, ao longo dos últimos anos, um número substancial de associados e no final do ano a actual presidente da Direcção também se vai despedir de Macau. “De 2006 até há uns três ou quatro anos, tínhamos à volta de 115 sócios e actualmente, presentes no território, só temos 39. Isto significa que muita gente se foi embora e depois há aqueles sócios flutuantes, que estão cá três ou quatro anos e deixam depois o território”, ilustra Helena Brandão. 

“Restam-me poucos meses como presidente da associação. Provavelmente em Outubro deixarei Macau (…) Até Setembro gostaríamos que a situação estivesse resolvida”, admite a dirigente.

Nova dinâmica

A associação foi criada a 16 de Novembro de 1992 por um grupo de naturais de Moçambique que se radicou em Macau por motivos profissionais. A pequena comunidade moçambicana que vive e trabalha no território recebia até há dois anos transfusões esporádicas de sangue novo, graças à vinda de estudantes para as instituições locais de ensino superior. O intercâmbio estudantil dotou a associação de um grupo de dança e de uma nova energia, reconhece Helena Brandão: “Os estudantes trouxeram alguma dinâmica porque são gente jovem, gente que vive em Moçambique. A maior parte dos sócios da associação já está fora de Moçambique há muito tempo (…) Na Festa da Lusofonia, a dar a sua graça e a sua cor, ajudam-nos nisso”, atesta a presidente da Associação dos Amigos de Moçambique.

Actualmente, as universidades locais acolhem cerca de uma dezena de alunos moçambicanos, que estudam no território com o apoio da Fundação Macau ou ao abrigo de um protocolo entre a Universidade Eduardo Mondlane e a Universidade de Macau. A maioria cursa Direito, mas as instituições de ensino do território também já formaram engenheiros mecânicos, contabilistas e até mesmo jornalistas. “Acho que é uma mais-valia para eles. É importante conviverem, estarem durante cinco ou seis anos a viver outras culturas, outros ensinamentos e aplicar isso lá, se possível”, defende Helena Brandão. 

Apesar de bem-vinda, a dinâmica que os estudantes moçambicanos trouxeram às actividades da Associação dos Amigos de Moçambique não resolve o dilema da continuidade e da renovação com que a agremiação se depara. A principal prioridade do organismo, defende Helena Brandão, deve continuar a passar pela promoção da cultura de Moçambique em Macau, mas a dirigente não exclui a possibilidade de um reforço de competências, mercê de uma maior coordenação com o Fórum de Cooperação Económica e Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa (Macau) e com o Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau (IPIM).

Os estudantes trouxeram uma nova dinâmica à comunidade moçambicana em Macau

“Vai ser criado um espaço no novo edifício da Plataforma onde se vai dar destaque a aspectos da cultura e da economia dos países africanos de expressão portuguesa, como é o caso de produtos e livros”, adianta a dirigente. “Nós fomos chamados a participar, na altura apresentámos um projecto. Há uns meses tivemos reuniões com os representantes do Instituto de Promoção do Comércio e do Investimento de Macau e a nossa contribuição vai ser nesse aspecto”, assume Helena Brandão.

Aprofundar a cooperação

A perspectiva de contemplar as associações lusófonas de Macau com uma representação permanente no Complexo da Plataforma de Serviços para a Cooperação Comercial entre a China e os Países de Língua Portuguesa investe agremiações como a Associação dos Amigos de Moçambique do estatuto de interlocutoras privilegiadas, não apenas do ponto de vista cultural, mas também económico. 

A missão não é inteiramente nova, como prova o trabalho desenvolvido pelo organismo ao longo das duas últimas décadas no popularíssimo Festival da Lusofonia. “Nós tentamos sempre mostrar aquilo que Moçambique tem para oferecer, tanto na vertente económica, como cultural. Nós não mostramos só os aspectos turísticos ou culturais de Moçambique. Nós partimos também para outras vertentes. Por exemplo, na última edição falámos do chá, da importância do chá, da exportação”, esclarece Helena Brandão. A República Popular da China tem sido, ao longo das últimas décadas, um dos principais parceiros de desenvolvimento de Moçambique e teve um papel essencial na reabilitação e modernização das redes rodoviária e ferroviária. 

O investimento é bem aceite, sustenta Helena Brandão, principalmente quando se traduz por uma melhoria da qualidade de vida dos cidadãos. “A ajuda é sempre bem-vinda, sobretudo quando são projectos que originam infra-estruturas que depois vão beneficiar a população. É disso que Moçambique precisa: de redes de estradas, de habitação social, construção de escolas, construção de infra-estruturas que beneficiem, de facto, as pessoas”, considera a responsável.