CHEF HANS RASMUSSEN

Sustentabilidade e arrojo com Macau no coração

O chef Hans Rasmussen defende que a educação é chave para criar uma indústria mais consciente
Passo a passo, a cozinha do futuro está a nascer no restaurante do Instituto de Formação Turística de Macau, na colina de Mong Há. Ancorada em inovação e sustentabilidade, a cozinha do futuro é tecnológica e ecológica, mas também equilibrada e assertiva, defende Hans Rasmussen, chef executivo do Restaurante-Escola do IFTM

Texto  Marco Carvalho

“UM bom prato para mim é simples, mas equilibrado”. O veredicto é de Hans Rasmussen. Nascido em Macau, onde regressou em Abril de 2014, o chef tem sido um dos principais artífices da pequena revolução pela qual a cozinha do restaurante do Instituto de Formação Turística de Macau (IFTM) enveredou nos últimos anos. 

A instituição, com uma natureza eminentemente pedagógica, foi pioneira em Macau na aplicação de práticas mais sustentáveis à indústria da restauração: “Acredito que aquilo que estou a fazer é o mais certo e espero que possa servir de exemplo para outros. Neste momento, estamos a cultivar vegetais no nosso terraço. Plantámos recentemente 16 canteiros de vegetais e queremos tentar a nossa sorte também com tubérculos, como a batata ou a cúrcuma. Quero tentar produzir a minha própria cúrcuma em pó, uma vez que é um ingrediente que é usado com bastante regularidade na cozinha macaense”, explica Rasmussen, de 43 anos.

Um pouco por todo o mundo, há uma revolução a brotar nas cidades e Macau não é excepção. Há explorações hidropónicas a nascer em armazéns, tomates e ervas aromáticas a crescer em varandas e terraços, e consumidores mais conscientes sobre a pegada de carbono associada à produção alimentar, mas o IFTM quer ir ainda mais além.

“Instalámos sistemas de hidroponia e de aquaponia. É um processo em andamento, dado que é ainda uma novidade para nós. Temos também uma horta, temos uma central de compostagem de comida e vamos avançar para a instalação de um programa de inteligência artificial aplicado ao desperdício alimentar, tendo em vista tanto a comida que fica no prato, como os excedentes gerados no processo de produção”, elenca o chef.

O combate ao desperdício alimentar e a optimização do uso dos ingredientes são aspectos centrais da forma como Hans Rasmussen se relaciona com tachos e panelas. Filho de mãe natural de Macau e de pai dinamarquês, o responsável pelo cardápio do restaurante do IFTM cresceu entre o mar e a floresta na ilha de Fiónia, a terceira maior da Dinamarca, mas o respeito pela natureza integral dos ingredientes que usa foi-lhe legado por Bo Jacobsen, influente chef dinamarquês que Rasmussen considera o seu principal mentor.

“É importante aprender a respeitar o animal. Eu aprendi isso com o meu mestre, foi ele que me ensinou que a sustentabilidade e este tipo de abordagem caminham de mãos dadas. Quando mais uso dermos a um ingrediente, mais produtos podemos obter de uma mesma fonte. E quantos mais produtos obtivermos, maior é o lucro que obtemos”, sustenta.

Gastronomia macaense

O trabalho desenvolvido nos últimos anos por Hans Rasmussen fez com que o Restaurante-Escola do IFTM se tornasse, em Janeiro deste ano, o primeiro restaurante de Macau a receber uma Estrela Verde do Guia Michelin pelo compromisso assumido com práticas gastronómicas sustentáveis. Mas mais do que uma cozinha responsável, o chef ambiciona uma indústria e um futuro bem mais conscientes.

“Temos a obrigação de mudar as coisas através da educação. O Instituto de Formação Turística de Macau tem um programa na área da gastronomia em que tenta fazer isso mesmo, explicar o caminho que um alimento faz do produtor até à mesa”, refere o chef Rasmussen.

Com a designação, em Novembro de 2017, de Macau como membro da Rede de Cidades Criativas da UNESCO na área da Gastronomia, conceitos como sustentabilidade e criatividade ganharam uma nova relevância, em particular para a mais genuína das expressões culinárias de Macau, a gastronomia macaense. Entretanto, o IFTM foi nomeado pelo Conselho de Estado, em Setembro deste ano, como um dos organismos responsáveis pela protecção do Património Cultural Intangível da China, nomeadamente no que diz respeito à preservação da gastronomia macaense.

Apesar de deixar claro que a gastronomia macaense não é a sua área de especialização, Hans Rasmussen reconhece que o restaurante que lidera tem uma responsabilidade particular no que toca à promoção dos saberes e dos sabores macaenses, num processo que não se faz sem desafios.

“Desde 2017 que nos promovemos como uma cidade criativa e o que se espera de uma cidade é que faça algo criativo. Mas temos de ter alguma cautela como aplicamos a ideia de criatividade à nossa cozinha, porque a sustentabilidade também entra na equação. É necessário manter o que temos, mas ser criativos ao mesmo tempo. São dois pólos que temos de ter em conta”, conclui Rasmussen.