Mangais, uma riqueza escondida de Macau

Considerados essenciais para combater as alterações climáticas, os mangais protegem as áreas costeiras e atenuam os efeitos da poluição. O ecossistema existe em Macau e tem sido investigado por uma equipa da Universidade de São José. O projecto tem uma componente pedagógica e foi escolhido para figurar num documentário produzido pelo canal britânico BBC 

Texto Paulo Barbosa | Fotos USJ

Os mangais são uma riqueza escondida de Macau. Muitos locais desconhecem que esse ecossistema existe no território e que tem vindo a ser reforçado com mais plantações nas margens do Rio das Pérolas ao longo dos últimos anos.  

“Quando cheguei a Macau, nas minhas primeiras interacções com os meus estudantes e membros da comunidade, constatei que a maioria não tinha noção sequer que isso existe em Macau”, conta Karen Tagulao, investigadora do Instituto de Ciência e Ambiente da Universidade de São José (USJ). 

A USJ tem vindo a fazer um estudo de longo termo sobre a recuperação dos mangais em Macau. O projecto foi escolhido para fazer parte de uma iniciativa da Associação Internacional de Universidades que visa reconhecer práticas ambientalistas que estejam a ser desenvolvidos em instituições de ensino superior espalhadas por todo o mundo. 

A iniciativa resultou numa série de 35 documentários com cerca de quatro minutos de duração cada. Os filmes foram produzidos pela BBC StoryWorks, uma divisão comercial da estação pública britânica. 

Karen Tagulao conta à MACAU que a pesquisa relacionada com os mangais de Macau começou em 2010. “Há dois aspectos neste projecto. Inicialmente comecei pela componente científica, que é muito importante. Fizemos um levantamento dos mangais e de outra flora marinha, onde analisámos que espécies de mangais existem aqui, a sua localização, densidade e estado de conservação. Outro dos aspectos investigados foi saber como os mangais ajudam a atenuar a poluição das águas costeiras.” Mas o estudo da USJ ainda não está terminado. A equipa liderada pela bióloga marinha quer agora focar-se no estudo genético dos mangais.  

O projecto da USJ tem também uma importante componente comunitária. Depois de feito o trabalho científico de base, Karen Tagulao tentou encontrar formas de “transformar a ciência em acção” e fazer algo em prol da sociedade. Foi por volta de 2012 que começou o envolvimento com várias escolas locais.  

“Tentámos traduzir o conhecimento científico que temos dos mangais em actividades com estudantes. Organizámos actividades de educação ambiental com enfoque nos mangais para estudantes que vão desde o ensino primário ao secundário e ao universitário. Ensinamos-lhes o valor dos mangais, porque são importantes e porque há a necessidade de os preservar. Damos palestras nas escolas e organizamos viagens de estudo aos locais, trazendo os estudantes aos mangais e desenvolvendo algumas actividades lá.” A investigadora calcula que cerca de três mil estudantes tenham estado envolvidos nas actividades ligadas à componente educacional deste projecto. 

Resiliência 

Mesmo com muita construção à volta, os mangais são muito resilientes e ainda recebem aves migratórias, tais como o colhereiro-de-cara-preta, que visitam Macau durante o Inverno. “É por isso que os mangais ainda estão aqui e são muito importantes numa era em que nos deparamos com as alterações climáticas, dado que protegem as áreas costeiras e atenuam a poluição”, aponta Karen Tagulao. 

As florestas de mangal são um ecossistema costeiro que existe em regiões tropicais e subtropicais. Consideradas vitais para as zonas de transição entre o ambiente terrestre e marinho, proporcionam um habitat perfeito para certas aves migratórias. No estuário do Rio das Pérolas, este ecossistema está ameaçado pela contaminação causada por químicos tóxicos que resultam do desenvolvimento industrial e de outras fontes poluentes.  

“O nosso objectivo é consciencializar as pessoas quanto aos mangais. Se a comunidade ganha mais conhecimento sobre o assunto, esperamos que isso se traduza em acções e alteração no padrão comportamental, para que as nossas acções em Macau não prejudiquem os mangais”, descreve a académica.  

Karen Tagulao

Questionada sobre se o documentário produzido pela BBC ajudou a publicitar e importância dos mangais na região, Karen Tagulao diz esperar que sim, embora seja ainda muito cedo para avaliar, dado que vídeo foi disponibilizado online recentemente.  

Os documentários sobre o projecto da USJ e os restantes escolhidos pela Associação Internacional de Universidades estão disponíveis no seguinte endereço electrónico: www.iau-aiminghigher.org/ 

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Duas áreas ecológicas  
Há actualmente duas zonas de mangais em Macau, a maior delas na reserva ecológica do Cotai, que faz fronteira com a Ilha da Montanha e é gerida pela Direcção dos Serviços de Protecção Ambiental (DSPA). O outro mangal surge junto ao complexo residencial Jardins do Oceano e está a ser replantado pelo Instituto para os Assuntos Municipais (IAM). Anteriormente o mangal estendia-se pela costa da Taipa, na zona onde estão as Casas-Museu, mas o desenvolvimento do Cotai levou à deslocação dessa zona, dado que os mangais necessitam de água fresca. Karen Tagulao considera que os dois departamentos públicos que gerem as zonas de mangais têm vindo a fazer um bom trabalho de conservação, permitindo também que investigadores e estudantes acedam a zonas vedadas no âmbito de actividades pedagógicas e científicas. 

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O que há nos mangais de Macau 

Fauna 

Boleophthalmus pectinirostris 

Espécie que navega em planos de lama na maré baixa e esconde-se na maré alta e é bastante utilizada na medicina tradicional chinesa. 

Periophthalmus modestus 

Género de peixe que tem a característica de ser anfíbio. Tem capacidade de armazenamento de água nas câmaras branquiais por várias horas e modificações nas nadadeiras que viabilizam a sua locomoção terrestre.  

Uca chlorophthalmus crassipes 

Género de pequenos caranguejos, sendo os machos possuidores de uma das pinças bem maior que a outra. Costumam viver em mangais e na zona entre marés, de praias arenosas protegidas, de baías e de estuários.  

Vespa bicolor 

Espécie de vespão que foi considerado o polinizador de uma orquídea Dendrobium sinense, encontrada apenas na ilha chinesa de Hainão. Caça abelhas, que alimentam as suas larvas. 

Libelinha 

Insectos fáceis de reconhecer devido aos seus dois pares de asas transparentes, olhos compostos e abdómen alongado. Quando em repouso, as suas asas mantêm-se perpendiculares ao corpo. São dos insectos mais rápidos que existem, atingindo 85 km/h. 

Ellobium chinensis 

Espécie de pequeno caracol de respiração aérea, um molusco gastrópode pulmonar terrestre da família Ellobiidae. 

Cassidula plecotrematoides 

Espécie de pequeno caracol de pântano salgado, um molusco gastrópode pulmonar da família Ellobiidae. 

Clithon faba 

Espécie de caracol de água salobra com um opérculo, um nerito. É um molusco gastrópode aquático da família Neritidae. 

Flora 

Avicennia marina 

Espécie comum em Macau geralmente encontrada nas margens dos mangais. Geralmente cresce mais alto que a maioria das outras espécies e distingue-se pela sua casca cinzenta. 

Acrostichum aureum 

Uma planta típica dos mangais, tem esporos em vez de flores e frutos quando fértil. Esparsamente distribuído em Macau, é encontrado principalmente em terra. 

Sonneratia apetala 

Está escassamente distribuída, mas é a mais alta entre as espécies de mangais em Macau. Pode atingir altura de cerca de 15 a 20 metros. Também pode ser distinguido por sua casca escura ou preta e frutos arredondados. 

Kandelia obovate 

Espécie que se distingue principalmente por saliências em forma de gotas de cera nos galhos das árvores. É amplamente distribuída em Macau e pode ser encontrada desde o fundo até a beira do mar das florestas de mangais. 

Aegiceras corniculatum 

É também uma espécie de mangais dominante e amplamente distribuída em Macau, encontrada principalmente entre as margens do meio e a beira-mar das florestas de mangais. É um arbusto ou árvore pequena com pecíolos geralmente avermelhados. 

Acanthus ilicifolius 

Uma das espécies mais dominantes em Macau, geralmente encontrada tanto nas margens quanto nas costas. É um arbusto facilmente distinguível por suas hastes e folhas espinhosas. As folhas maduras têm bordas serrilhadas afiadas.