Texto António Mesquita
É certo que a era digital, com a Internet em destaque, roubou-lhe parte do protagonismo, mas ao contrário do triste destino que lhe auguravam continua a ter grande importância. Dos embrulhos aos livros, das mais variadas embalagens aos jornais, dos cadernos da escola aos documentos oficiais, dos desenhos das crianças às notas de banco, do papel higiénico aos cartazes, ele está sempre presente.
Estamos a falar do papel. Exatamente. O papel, uma das invenções chinesas que progressivamente foi mudando o quotidiano do homem e que é usado em larga escala em todo o mundo.
De acordo com o historiador Fan Hua (398-445 E.C.), a invenção do papel ocorreu no ano 105 depois de Cristo e é atribuída a T’sai Lun, embora amostras de papel encontradas em achados arqueológicos na região Oeste da China e do Tibete possam apontar para que o seu fabrico se tenha iniciado alguns séculos antes, por volta de 200 antes de Cristo.
Para todos os efeitos a invenção do papel é atribuída a T’sai Lun, um oficial da corte do imperador chinês Hedi, da Dinastia Han (206 a.C. a 202 d.C.), que produziu papel a partir de uma mistura de fibras vegetais (casca de amoreira, cânhamo, tecidos, entre outros). Estas fibras foram depois cozidas em água quente, batidas, esmagadas e peneiradas, dando origem a uma pasta que, depois de vertida numa armação de madeira e comprimida, resultava numa folha plana. Ao ser seca ao sol, transformava-se num suporte onde se podia desenhar ou escrever caracteres.
Estava assim encontrado um material mais leve e que, tornando-se mais prático para receber a escrita, substituiu rapidamente os anteriores suportes usado desde a invenção da escrita, como a madeira, o papiro, o pergaminho ou a seda. Foi com recurso a este novo suporte que os monges budistas puderam escrever as suas orações e difundi-las em grande escala pelo território chinês durante o século VII d.C.
A técnica de fabrico do papel manteve-se secreta entre os chineses ao longo de cerca de seis séculos, embora o seu uso tivesse sido difundido por quase todo o império chinês, levado pelos mercadores que percorriam as diversas rotas comerciais. Só já em meados do século VIII é que a técnica ultrapassou as fronteiras do império chinês começando a sua difusão pelo mundo.
Terão sido os árabes a levarem esta inovação pelo mundo fora, acompanhados por dois artesãos chineses em Samarcanda, hoje no Uzbequistão, então um importante entreposto das caravanas comerciais que seguiam a Rota da Seda entre a China e a Europa. Estes cidadãos chineses seriam conhecedores das técnicas de fabrico do papel e tê-las-ão partilhado com os árabes, terminando assim a exclusividade chinesa do seu fabrico. A partir de Samarcanda, a técnica de fabrico de papel foi-se difundido para outras paragens e cidades como Damasco e Cairo, que viriam a tornar-se também importantes centros de produção.
Sabe-se que a partir da China a técnica do papel foi sendo propagada a toda a Ásia, havendo registos que artesãos produziram papel na Coreia do Sul usando a mesma técnica e os mesmos materiais que os chineses, e que terá sido um monge coreano a introduzir o seu fabrico na corte imperial japonesa cerca de 100 anos depois.
Com a expansão árabe no século VIII, o fabrico de papel foi levado até à Península Ibérica e depois difundido, séculos mais tarde, pela Europa e pelo resto do mundo.
Desde o seu aparecimento que a versatilidade do papel esteve sempre patente, já que, além de suporte para escrita, desenho e pintura, era utlizado para outros fins como vasos e potes quando combinado com verniz, para cobrir e decorar paredes ou fabricar guarda-chuvas.
O papel é, sem dúvida, uma das mais importantes invenções da humanidade, sobretudo se pensarmos no que representou como meio de difusão do conhecimento ao longo da história. E apesar do frenesim tecnológico da actualidade, que nos permite comunicar e mergulharmos na vastidão do conhecimento de uma maneira mais alargada e rápida, continua presente junto de nós e com uma grande importância. Com efeito, é difícil imaginar, para já, a vida sem o papel.