Texto Lucas Calixto | Fotos Lucas Calixto e DR
Um encontro em Macau com o embaixador angolano em Pequim, João Garcia Bires, definiu o papel de Carlos Lobo, que aceitou o desafio de presidir a Câmara de Comércio de Angola em Macau (CCAMO), com o principal objetivo de promover Angola. “Era o momento exacto para a criação desta câmara de comércio”, aponta Carlos Lobo.
A CCAMO foi oficialmente fundada a 25 de Agosto de 2017 por um grupo que, para além de Carlos Lobo, incluía outros três angolanos residentes na RAEM: Pedro Lobo, Rui Brás e Carlos Figueiredo.
O organismo visa promover as relações entre Angola e Macau, tendo em vista a expansão das relações comercias na Área da Grande Baía, composta por nove cidades, da província de Guangdong – Cantão, Shenzhen, Zhuhai, Foshan, Zhongshan, Dongguan, Huizhou, Jiangmen e Zhaoqing – e as duas regiões administrativas especiais de Macau e Hong Kong.
Para Carlos Lobo, Macau é estrategicamente um ponto crucial para essa expansão, por ser uma jurisdição que possui relações com os países de língua portuguesa. O presidente sublinha ser esse o ponto inicial para o primeiro objetivo da CCAMO: promover Macau como o centro da Área da Grande Baía nas relações com Angola e os restantes países de língua portuguesa. “Não podemos olhar para Macau de uma forma fechada. Temos de olhar para Macau de uma forma integrada na Grande Baía das nove cidades mais duas regiões. A nossa ambição é reunir na RAEM uma plataforma de prestação de serviços para essas cidades.”
Um segundo objectivo, mas a longo prazo, prende-se com a iniciativa “Uma Faixa, Uma Rota” e como utilizar essa iniciativa nas áreas que são cruciais para a própria câmara de comércio, como coordenação de investimentos e infra-estruturas e relações multiculturais. “O que a nossa câmara de comércio se propõe a fazer é estudar e apoiar a promoção dessa iniciativa, que se concretize com os objectivos traçados, que são projectos de investimento e interesses múltiplos.”
Macau passa a ser a plataforma principal para o avanço das relações entre Angola e a República Popular da China, abrindo portas para muitos investidores que visam iniciar ou acentuar as relações com o grande continente. “Macau deve promover a iniciativa ‘Uma Faixa, Uma Rota’ para os países de língua portuguesa, utilizando a Área da Grande Baía como motor para esse apoio”, sustenta Carlos Lobo.
Arranque é o mais difícil
A completar um ano de funcionamento, a Câmara de Comércio de Angola em Macau ainda não promoveu muitas acções públicas, já que se tem focado num trabalho a nível empresarial. Há já algumas empresas de Hong Kong, Macau, Angola e da província de Guangdong que se tornaram associadas do organismo e muitas outras têm contactado a CCAMO para obter informações sobre as vantagens de tornar-se membro. “Estamos de braços abertos para toda a gente. Esta é uma associação inclusiva. Queremos trabalhar com todos aqueles que partilhem das nossas ideias.
Um dos projectos que a CCAMO criou e que já está em curso é o processo de identificação de potenciais parceiros. Ou seja, o organismo tenta conciliar projectos angolanos que possam ser do interesse de empresas e entidades chinesas. Um exemplo é o auxílio à Fundação Sagrada Esperança, criada pelo ex-presidente angolano Agostinho Neto, que presta assistência a projectos comerciais na sociedade angolana.
Além disso, a CCAMO também está a tentar inserir-se na área da medicina tradicional chinesa, nomeadamente agindo ao nível da cooperação entre as instituições de ensino, sejam de carácter público ou privado.
Carlos Lobo assinala ainda a importância da participação da CCAMO em eventos de revelo, tais como o Fórum Médico Internacional Sino-Luso, que reuniu recentemente em Pequim diversos médicos dos comités olímpicos de países de língua oficial portuguesa.
Numa parceria com com a Universidade de Pequim, a CCAMO está a tentar promover a cooperação entre a China e Angola na área da medicina, visando o alívio das necessidades dessa área no país africano.
Também o projecto Libolo, dirigido por Carlos Figueiredo, professor da Universidade de Macau e um dos fundadores da CCAMO, está a receber apoio do organismo. O projecto visa eternizar para o mundo a cultura, as ciências humanas e o desporto angolanos.
Em termos sociais, a CCAMO tem a oferecer mais conhecimento entre as jurisdições, com o intuito de evitar obstáculos entre os empresários. “As pessoas envolvidas no mundo dos negócios precisam melhor conhecer a realidade de Angola para poder saber o que buscar. Sem isso ninguém andará a comprar nada”, sublinha Carlos Lobo. “As pessoas conhecem Macau, mais pela presença da língua portuguesa do que pelas coisas que Macau tem. E na área da medicina tradicional, na área do ensino e na área do turismo há muito a oferecer a Angola.”
A nova câmara de comércio também pretende promover o maior conhecimento de Angola através de uma conferência que está prevista para Outubro deste ano. Os investimentos em Macau como plataforma de serviços e o investimento em Angola por empresas chinesas em geral são os temas a serem abordados por especialistas e empresários. Além disso, uma exposição fotográfica está planeada para assinalar o dia 11 de Novembro, Dia de Angola.
Mais Angola na China
A inexistência de empresas angolanas na República Popular da China não deixa de ser um grande obstáculo para a CCAMO e esse é um dos cenários que a nova entidade pretende ajudar a alterar.
Carlos Lobo explica que Angola sofreu muito com a guerra civil e, por esse motivo, as empresas do país não se desenvolveram o suficiente para se tornarem globais. Nos dias de hoje, é visível essa grande diferença quando comparamos Angola com outros países de língua portuguesa, como Portugal ou o Brasil. Ademais, a barreira da língua também é um factor importante a ser considerado.
O presidente da CCAMO acredita ser possível a internacionalização das empresas angolanas, nomeadamente, no mercado chinês. “Será a longo prazo. É necessário um longo período de tempo para que as empresas angolanas atinjam a capacidade e o know-how para integrarem o comércio chinês”, defende. “O que falta a Angola é tempo para crescer e se desenvolver, e eu acredito que Angola vai conseguir chegar lá.”
Carlos Lobo falou ainda do esforço que tem sido desenvolvido pelo Governo Central de forma a estreitar a cooperação entre a China e os países africanos de língua portuguesa. “Acredito que o presidente Xi Jinping tem interesse na aproximação entre os dois povos”, refere Carlos Lobo, dando ênfase à posição de Angola, que “tem sido o país da África subsaariana que mais apoio financeiro recebe da China”.
O presidente mostra-se ainda confiante nas relações diplomáticas ao mais alto nível entre os dois países. “Não me surpreenderia se houvesse nos próximos meses uma reunião entre o presidente angolano e o presidente chinês”, concluiu.
Quanto à influência do governo angolano, com a transição da presidência de José Eduardo dos Santos para João Lourenço no ano passado, Carlos Lobo antevê um novo momento para o país – um momento de grande desenvolvimento – e acredita que o novo presidente angolano conseguirá mudar a actual crise financeira e social do país. “Vai ser preciso tempo e vão ser precisas políticas apropriadas para que isso se desenvolva. E com o novo presidente eu estou a ver trabalho no sentido de abrir Angola para uma nova fase de desenvolvimento.”
Segundo previsões do Fundo Monetário Internacional, a economia de Angola deverá registar este ano um crescimento entre 2,2 e 2,5 por cento, devido ao aumento tanto do preço do barril de petróleo como da produção de gás natural. Desde 2006 a China tornou-se no maior importador individual de petróleo angolano, chegando a representar, em 2017, um peso de 61,6 por cento das exportações de petróleo por Angola, no valor de 19.200 milhões de dólares norte-americanos.
O embaixador da China em Angola, Cui Aimin, anunciou em Janeiro passado ter o seu país concedido a Angola empréstimos no valor de mais de 60 mil milhões de dólares desde que os dois países estabeleceram relações diplomáticas, a 12 de Janeiro de 1983.
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O presidente
Carlos Lobo foi estudante de Direito da Universidade de Macau e reside na RAEM há mais de 20 anos. O advogado já trabalhou para o Governo de Macau e para operadoras de jogo locais, tendo aberto mais tarde o seu escritório de advocacia. Depois de começar a retomar as ligações com a Angola através do seu escritório, o advogado conta que foi muito procurado por empresários angolanos que estavam dispostos a criar um elo com a RAEM e com a China. “Comecei a ser procurado por empresas cujos sócios são angolanos e que têm interesse em criar uma ponte para a China e, assim, ter Macau como porta.” A partir daí surgiu a intenção de se avançar para um organismo que prestasse apoio e dinamizasse tais relações.