O que se pretende é que os visitantes – em vez de um choque cultural – encontrem uma plêiade de culturas; que as performances – os resultados, recordes e medalhas – sejam mais influenciados pelas excelentes e modernas instalações desportivas onde vão decorrer as provas (elogiadas pelos campeões olímpicos chineses, que já as utilizaram) do que pelos condicionalismos da diferença horária e do jet lag.
Que encontrem uma moamba, uma cachupa, uma feijoada, se já estiverem satisfeitos com o chau min (a massa frita) ou o van tan (as massas em vapor) e com saudades da comida caseira. E o prazer de descobrir e ser descoberto por gente de um sítio tão longínquo, exótico e diferente, que a esmagadora maioria nunca visitou. Por isso os Jogos serão também uma experiência de vida.
A RAEM será durante dez dias a capital desportiva do mundo de língua portuguesa. A Associação dos Comités Olímpicos de Língua Oficial Portuguesa (ACOLOP) – entidade organizadora dos Jogos – foi fundada a 8 de Junho de 2004, em Lisboa, com o objectivo de integrar os países e regiões de língua portuguesa a partir do desporto, sendo já reconhecida pelo Comité Olímpico Internacional. São fundadores da ACOLOP: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Macau (China), Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe, Timor-Leste e a Guiné Equatorial, na qualidade de membro associado. Mais recentemente a assembleia-geral da ACOLOP integrou os comités olímpicos nacionais da Índia e do Sri Lanka como membros associados. A criação desta entidade deu corpo a um sonho antigo da comunidade de língua portuguesa e é considerado um passo em frente na consolidação de uma importante comunidade mundial.
Sendo a prática desportiva “uma das formas mais expeditas de promover a comunhão entre povos e de estreitar laços de amizade e fraternidade”, como se pode ler nos estatutos da associação, um passo seguinte e natural seria a promoção e organização de uns jogos entre os países e regiões membros que viessem dar corpo e substância à ACOLOP. Assim, “ao conceber e lançar os Jogos da Lusofonia, a ACOLOP pretendeu não só contribuir para o reforço e desenvolvimento da prática desportiva nos países e regiões que a integram mas também promover a multiplicidade cultural que é produzida, expressa e vivida em português”, ainda segundo o mesmo documento.
A comunidade local de língua portuguesa está a preparar uma série de iniciativas para receber os seus conterrâneos. Membro destacado dessa comunidade, o médico cabo-verdiano Humberto Évora considera que os estudantes lusófonos a residir na RAEM “constituem os verdadeiros embaixadores locais dos seus países”. Na sua opinião, “pode quase dizer-se que há – chamemos-lhe não uma federação, mas uma associação de associações lusófonas – que apesar de diferentes têm também afinidades e pontos em comum”. Aliás, “há eventos – desportivos e culturais – que organizamos em conjunto.”
Para Humberto Évora, a realização dos Jogos da Lusofonia vem ao encontro da política global e é consentânea com a ponte que o Governo Central quer que Macau seja para o relacionamento com os países de expressão lusófona, e como tal é positivo e tem razão de ser.
O advogado Alexandre Correia da Silva, presidente da Associação Angola-Macau, é da opinião de que a realização dos Jogos surge em complementaridade com outras iniciativas já em curso, nomeadamente no campo das relações económicas e no das iniciativas culturais. Além disso, diz Correia da Silva, a comunidade dos angolanos e amigos de Angola em Macau aguarda com grande expectativa a realização dos Jogos e a participação da delegação angolana. Acredita que Angola conseguirá alcançará bons resultados e que irá não só ganhar medalhas mas também “vai ganhar nas bancadas”, apelando assim à participação activa do público na assistência às provas desportivas.
Ainda segundo Correia da Silva, estão previstas diversas iniciativas por ocasião dos Jogos, mas de momento ainda é cedo para as anunciar.
O jornalista Miguel Brandão, da Associação dos Amigos de Moçambique, grupo criado na segunda metade dos anos 80, e reactivado muito recentemente, coincidindo com o anúncio dos Jogos da Lusofonia, diz que a iniciativa é importante: “Até agora temos investido mais nos aspectos culturais, trazendo este ou aquele pintor ou escritor. Mas neste caso estamos a falar de um evento a uma outra escala, de grande dimensão, e cá estaremos para contribuir para que a nossa delegação se sinta em casa.”
O guineense Carlos Wilson, funcionário consular, acabado de regressar de umas férias à terra natal, notou que os Jogos da Lusofonia já fazem parte das conversas nos círculos desportivos. A Associação dos Naturais da Guiné está a preparar a recepção à sua delegação, e diz que a iniciativa é “de grande valor” e que ultrapassa em muito o campo desportivo: “Nos dois últimos anos não se fala de outra coisa que não seja da cooperação entre os paises lusófonos e a RPC, tendo Macau como ponte. Mas não são apenas as questões económicas que comandam a vida, neste momento podem ter mais ênfase, mas há também a língua e a cultura. E agora o desporto como veículo de ligação entre povos. Acho que é uma grande iniciativa.”
Festa desportiva e cultural
Quando os mais de mil atletas e membros das delegações dos países participantes nos 1os Jogos da Lusofonia chegarem a Macau em Outubro próximo terão à sua espera muito mais do que uma competição desportiva